Da proposta de metas para um tema do qual gosto bastante. A castanho vão as partes que, de forma mais óbvia, não cabem dentro de um programa que é vago mas que, apesar disso, não pode ser um alçapão para onde tudo se atira.
As crises do século XIV
1. Conhecer e compreender a conflitualidade militar que caracterizou a Europa no século XIV
1. Identificar a guerra dos cem anos como o principal conflito europeu do século XIV.
2. Identificar os principais protagonistas da Guerra dos Cem Anos e os principais reinos aliados.
3. Apontar características das guerras medievais, salientando a ausência de exércitos nacionais, número reduzidos de baixas diretas.
4. Relacionar o clima da guerra com as dificuldades económicas deste período.
5. Reconhecer a Guerra dos Cem Anos como um conflito resultante da disputa pela hegemonia na europa ocidental.
2. Conhecer e compreender as dificuldades económicas vividas no século XIV
1. Apontar o aumento demográfico, a escassez de áreas cultiváveis, as mudanças climáticas e a destruição causada pelas guerras como causas (interligadas) das fomes que grassaram no século XIV.
2. Relacionar a expansão das doenças epidémicas com a fome, sobretudo no mundo camponês e com o clima de guerra.
3. Sublinhar a importância da peste negra neste contexto, o seu processo de difusão e a elevada mortalidade que originou.
4. Apontar as consequências demográficas e económicas da conjuntura de fome, peste e guerra.
5. Relacionar a limitada capacidade de intervenção dos poderes públicos com o grande impacto dos factores da crise, especialmente juntos dos estratos não privilegiados da sociedade.
3. Conhecer e compreender “levantamentos populares” rurais, conflitos sociais urbanos e “movimentos milenaristas”.
1. Contextualizar o surgimento de movimentos populares rurais na europa ocidental.
2. Caracterizar os movimentos populares rurais (jacqueries, em França).
3. Caracterizar os conflitos sociais urbanos e contexto em que se desenrolam.
4. Contextualizar o aparecimento de movimentos milenaristas (ideia de fim de mundo; moralização dos comportamentos).
5. Reconhecer que a generalidade dos movimentos populares apenas pretendia evitar alterações à ordem senhorial estabelecida..
4. Conhecer e compreender a expressão da crise em Portugal e relacioná-la com a formação de uma nova dinastia.
1. Caracterizar os problemas sentidos em Portugal durante o reinado de D. Fernando, relacionando-os com a situação europeia.
2. Identificar o problema da sucessão ao trono no contexto das relações entre as coroas portuguesa e castelhana.
3. Explicar o descontentamento popular e suas expressões.
4. Descrever os momentos decisivos da afirmação da independência do reino.
5. Relacionar a chegada ao poder de uma nova dinastia com as alterações operadas no seio da sociedade portuguesa, sobretudo ao nível da renovação da nobreza e da afirmação de certos estratos da burguesia.
5. Conhecer e compreender as situações de “disfunção social” verificadas no século XIV com as ocorridas nos nossos dias
1. Caracterizar algumas das situações de “disfunção social” mais frequentes na Europa durante o século XIV.
2. Descrever problemas sociais atuais.
3. Apresentar algumas das diferenças e das semelhanças entre as dificuldades causadas pela “Crise do século XIV” e por crises recentes.
O que diz o programa em vigor (e não alterado):
E o que diz um documento, mais extenso, designado por Plano de Organização do Ensino-Aprendizagem?
O seguinte:
Ali em baixo fala-se em 5 aulas previstas num tempo em que a disciplina de História não tinha ainda sido secundarizada pelos comentadores camelos e outros dromedários.
Ora bem… o ministro pode achar que estes documentos nada valem, que estão desactualizados… mas então assuma um novo programa para a disciplina e dê condições aos professores para o implementarem.
Não se coloca a inventar metas em cima de um programa com mais de 20 anos, como se nele coubesse tudo.
Não nomeie um grupinho de amigos de amigos, que são indiscutivelmente sabedores de História (eu reconheço nestas metas todas as marcas de uma boa formação típica de um período que acompanhei bem de perto e muito superior às bolonhices actuais), mas que parecem estar na estratosfera acerca do ciclo de escolaridade que temos pela frente, da idade dos alunos e do tempo curricular disponível.
E não me venham com conversas eduquesas ou anti-eduquesas porque isto nada tem a ver com isso. Isto deveria ter a ver com planificação e desenho ou desenvolvimento curricular, com didáctica específica e com mais coisas e não com a exibição de um menu riquíssimo de metas para demonstrar que se sabe.
Eu adoraria ver quem definiu estas metas a planificá-las com algum sentido dentro do espartilho de tempos lectivos com que lidam os professores que vivem no mundo real.
Em termos de conhecimentos e do seu desenvolvimento para além desta enunciação, lecciono estas metas com uma perna às costas, um olho tapado e sem recurso a tecnologias. Gosto imenso desta parte da matéria. Podemos levar duas semanas com aulas dia sim, dia não só a tratar da difusão da Peste Negra pelo mundo mediterrânico, analisando as consequências sociais, as atitudes culturais, as respostas profilácticas ou de combate à epidemia, a desertificação dos campos (as lost villages, por exemplo) e o afluxo descontrolado às cidades, onde as ruas das taipas nascem para encerrar os pestíferos de forma cruel e inútil. Abordar o imaginário medieval da doença, a relação com o corpo, os hábitos de higiene, assim como a relação entre os efeitos desta doença e a desagregação dos laços de solidariedade que caracterizam a crise do século XIV.
Mas não é isso que está em causa.
O que está em causa é o DELÍRIO de quem quer replicar a Capela Sistina no tecto da minha arrecadação.