Outubro 2006


Normalmente não me ocupo destes assuntos por estas paragens. Mas há sempre uma primeira vez para tudo.

Então vamos lá a isso. 

Miguel Sousa Tavares escreveu um best seller massivo chamado Equador. Vendeu que nem pães quentes em manhã de Inverno. Invejo-o pelo euros que a coisa deve ter rendido. Não o nego. Já ofereci várias cópias do cartapácio e, de caminho, já o li. É um bom exemplo de ficção histórica escorreita (logo que foi expurgado dos erros das edições iniciais), de que há dezenas de exemplos disponíveis em mercados literários do chamado Primeiro Mundo. Na Améria, em França ou em Inglaterra, engrossaria o lote da oferta muito vasta que existe nesta área.

Entre nós fez figura de lança em África, mais especificamente em São Tomé e o autor e quase todos nós engalanámos em arco. Eu, como disse, li mas não me entusiasmei por aí além. A trama é muito previsível, em termos de personagens ficamos muito limitados e embora a escrita escorra sem tropeços, por vezes escorre em demasiado profusão. Fazia-se a coisa com menos 100 páginas sem perda para ninguém. Só que em Portugal não há editores na tradição americana, daqueles que gostam de asinalar as adiposidades. O Stephen King escreve muito bem sobre isso na introdução à versão integral do seu livro The Stand que o editor fez com que passasse das mais de 1000 páginas para menos de 800. E Stephen King não se zangou e até agradeceu. Depois de vender milhões da versão “curta”, acabou por vender mais uns milhões da versão longa, longuíssima…

Mas voltando a Miguel Sousa Tavares. Entretanto o tempo passa e rumorejam boatos de plágio de certas passagens. Durante algum tempo não liguei à coisa até que decidi ligar. Sinceramente não acho razão para tanto alarido. Pois, existem umas coisas que podiam estar menos parecidas, mas tudo está longe de configurar um panorama de escândalo literário nacional.

Só que o próprio Miguel Sousa Tavares, naquela sua atitude normal de justiceiro intocável decidiu encrespar-se e subir a parada, disparando sobre tudo e todos, incluindo toda a blogosfera numa apreciação em que mistura anonimato, irresponsabilidade, inveja, impunidade, cobardia, etc, etc.

Por momentos, até se esquece dos seus próprios e pretéritos arroubos justicialistas e destrata os blogs como da peste se tratasse. O que, por tabela infinitamente improvável, eu decidi que me atingia. Porque escrevo um blog, porque não acho o Equador a 8ª maravilha deste mundo e porque considero que o Miguel Sousa Tavares faz parte daquele lote de criaturas que se sentem acima do comum mortal e intocáveis numa torre de marfim reservada apenas aos eleitos, homens de carácter, sucesso e não invejosos.

Ora eu tenho uma ideia ligeiramente diferente de todo o problema e encaro de modo muito crítico o estardalhaço que o próprio MST decidiu fazer em torno de uma questão menor e, em especial, a forma como decidiu investir contra o mundo dos blogs na sua coluna do passado sábado no Expresso.

E só escrevo isto aqui porque sei, de experiência própria, que é inútil mandar escritos para o Expresso ou para onde quer que MST escreva, contrariando as suas boutades mais excessivas com factos e argumentos, porque nada é publicado. Eu exemplifico: sobre as já sucessivas investidas tavarianas sobre os docentes, no Expresso mas antes no Público, eu já escrevi com civilidade aceitável, qualidade literária sofrível e identificação bem à vista, mas nunca tive sorte. Poderia ser que não tivesse sorte porque outros tivessem merecido melhor; mas não. Se formos ver, nunca aparecem textos de “cidadãos anónimos” (uma expressão triste destinada a apoucar quem não tem nome feito na praça) a zurzir de volta determinados opinadores residentes da nossa comunicação social. Uma vez aconteceu e, por exemplo, o Pacheco Pereira aproveitou para sair do DN de armas, bagagens e honra aparentemente ofendida.

No caso de Miguel Sousa Tavares é recorrente o facto de só aparecerem a dele discordar em letra de imprensa vultos conhecidos da praça. E poucos. A palavra da arraia-miúda é sempre varrida, certamente por “critérios editoriais”. Recentemente tentei que uma resposta minha a uma opinião sobre os professores de MST pudesse ter espaço no Expresso, tendo mesmo feito algo estranhíssimo em mim que foi apelar a uma amizade para obter algo. Nada. Impossível. Impensável furar a barreira em torno dos “intocáveis”. Só mesmo quem esteja ao “mesmo nível”.

Censura? Ohhh… não! Alguma vez. Somos é uns mais iguais que outros.

Na blogosfera, por sua vez, já todos temos direito à nossa palavra. É certo que nem sempre usada com propriedade, mas a credibilidade de quem atoarda sem razão e não fundamenta opinião é escassa. MST parece ter esquecido isso. Quem escreve puros disparates, rapidamente é lido e esquecido. A menos que façam disso um grande caso.

MST deveria ter desmentido a “ofensa” com argumentos. E pronto, ponto final. Aproveitar a oportunidade para, do alto, lançar juízos valorativos sobre tudo e todos é de quem se julga quase participar do divino. O que é claramente exagerado. Penso eu… claro, que assino com o meu nome (de um “cidadão anónimo” pelos padrões dos “jornais de referência”) e com clareza a minha discordância e o meu juízo sobre o Equador. Que é um bom livro médio com um excesso de 100 páginas.

Apenas e só isso.

Parece que não e que tudo isto se tornou uma guerra de trincheiras e de (im)paciência. As negociações estão, neste momento, a ser encaradas pelo Ministério da Educação como mera formalidade a deixar decorrer até chegar o momento de impor a solução desejada, sem qualquer tipo de concessão.

Neste jogo de xadrez, realmente não parece haver espaço para movimentos decisivos, sendo necessário tecer com afinco a rede onde enlear o adversário.

Mas, no entanto, algo se moveu hoje. Uma posição mudou, ou melhor uma não-posição tornou-se uma “quase posição”. No jogo partidário, onde os docentes não têm colhido mais apoio do que o simple interesse à esquerda do PS no avolumar da conflitualidade social, o PSD moveu um peão e de uma posição anterior de discretíssima ausência deste debate, passou para uma “quase posição”, na qual não critica a essência das propostas governamentais, preferindo apenas criticar a “hostilização”, a “crispação” e  o “clima criado”.

Em boa verdade, isto é muito, muito pouco e apenas ecoa, com algum atraso, o apelo à serenidade de Cavaco Silva. À direita do PS não parecem existir discordâncias fundamentais em relação às medidas propostas; o CDS inexiste nesta matéria e o PSD aparenta concordar, apenas lhe incomodando a agitação. Um pouco como ao PC e ao Bloco essa agitação agrada. Com um PS praticamente domesticado, infelizmente os docentes estão entregues a si mesmos, pois ninguém parece ter uma posição definida sobre esta matéria que, para além da crítica ao “ambiente de crispação”, se erga como alternativa a estas soluções.

Por isso, todos nós devemos estar conscientes que tudo depende apenas de nós contra a máquina. Do nosso lado, firme, apenas a razão. E com alguma probabilidade, também o Direito.

Que sendo final em termos formais, poderá não o ser se os sindicatos solicitarem, como parece estar para acontecer, um período negocial suplementar, que o ME é obrigado a conceder, eu gostaria que os representantes dos professores para além de manterem a firmeza, conseguissem resistir à tentação de responder ao mesmo nível às provocações feitas pela equipa ministerial dentro e fora do espaço das negociações, na tentativa de exaltar os ânimos e fazer os docentes e seus representantes perderem o equilíbrio, a justa medida na resposta e, por consequência, a razão perante a opinião pública.

Por mim, chegava-me que algum dos esclarecidos negociadores da parte do Ministério apresentasse publicamente um exemplo demonstrativo da forma como a introdução de um modelo similar ao agora proposta pelo ME levou à melhoria dos indicadores educativos num qualquer país da Europa ou mesmo de outros continentes que devamos invejar nessa matéria.

Eu sei que este modelo existe, em especial em países anglo-saxónicos, mas a experiência nem sempre foi a melhor, antes pelo contrário. Na Grã-Bretanha a situação de declínio da Educação pública desde meados da década de 70 atingiu na década de 90 níveis preocupantes e até levou a um retrocesso nas políticas e a uma espécie de “regresso ao passado”, inclusivamente nos modelos de gestão escolares, muito descentralizados e “localizados”, um pouco como nasceu todo o sistema.

Mas para uma experiência, relativamente recente, de reeestruturação da carreira docente com laivos parecidos com a que agora se quer implantar entre nós, eu proporia a leitura do acordo feito na Escócia e que, para além da rama, fossem lidos com atenção aspectos como, por exemplo:

  • 1) Uma metodologia transparente de aplicação das regras definidoras da dimensão da carreira, conjugando directrizes nacionais com necessidades locais, sempre através de consulta e acordo, sendo que as equipas negociais têm uma constituição que inclui os professores como parceiros no processo (p. 4 do documento).
  • 2) Usando o horário teórico das 35 horas (que inclui todo o tipo de reuniões, contactos com encarregados de educação, formação, etc, como se pode ver no anexo D), recomenda-se a redução do contacto dos docentes com classes de alunos para um máximo de 22,5 horas.
  • 3) Clara afirmação de que as tarefas docentes que não impliquem presença na Escola podem ser feitas no local de escolha dos professores. Assim como o tempo para uso pessoal, num período de transição para as 22.5 máximas de trabalho com as classes será sempre igual ou superior a um terço do trabalho com as turmas/classes.
  • 4) As hipóteses, não penalizadoras, de reforma antecipada (p. 15).
  • 5) A definição detalhada do que não são tarefas dos docentes (anexo E).

Em lado nenhum se fala de quotas rígidas para a progressão, sendo que esta é definida de forma negocial, a nível nacional local, por comissões formadas pelo Estado, professores e patrões/entidades privadas (lá a iniciativa privada é a sério).

Até vou deixar de parte o facto de esta revisão do “ECD” escocês prever um claro faseamento da implementação das suas medidas (e não uma data abrupta para a mudança) e um gradual aumento salarial das remunerações do docentes, sendo o primeiro de 10%.

Isso por cá já seria pedir de mais.

Novo cartoon do Antero, cuja banda desenhada já está quase toda online na página respectiva, ali por cima do título do blogue.

Um dos últimos exemplos da visão republicana da instrução pública, que encontrava na Escola a solução para iluminar os espíritos visando o seu aperfeiçoamento para o exercício de uma cidadania esclarecida. Esta 3ª edição, originalmente não datada, pode ser indirectamente localizada em 1924 ou 1925.

Já há uns bons dias atrás eu tinha escrito que o meu segundo pomo de discórdia em relação à proposta de ECD passa pelos instrumentos usados para colocar em prática a pretensa avaliação do mérito que se apregoa, assim como a progressão na carreira, nomeadamente algumas das regras de ingresso, o famigerado sistema de quotas e o próprio funcionamento da avaliação, com destaque para a questão do “quem avalia quem com base em quê?”.

  • Comecemos pelas regras de ingresso.

Antes de mais, afinal o que andam a fazer as instituições do Ensino Superior que formam docentes profissionalizados? Por acaso, vão lá neste momento quase 20 anos que estive contra a formação de aviário então proposta para as Faculdades de Letras e Ciências Sociais e Humanas, que acabaria largada a muitas outras instituições do Ensino Superior, como reacção epidérmica ao que então se passava nas ESE’s e em Universidades com Ramos de Formação Educacional (à data, e salvo erro, Aveiro e Braga). Só que o sistema foi implantado e são deixa de ser curioso como, muito a posteriori, parece ser o próprio Estado que criou a coisa a duvidar da qualidade da criatura. Mas então, se existem ramos destinados à formação profissionalizantes, sublinhe-se, de docentes, que lógica tem o mesmo Estado que os criou e mantém em funcionamento, depois duvidar dos seus resultados e querer impor regras de acesso à docência, a jusante da dita formação?

Se a ideia é recrutar apenas os “melhores”, então isso é detectável num exame ou numas provas públicas e não durante os anos da licenciatura especializada em ensino? Não deixa de ser estranho, na minha modestíssima opinião.

Porque, das duas, uma: ou os ramos de formação educacional, profissionalizantes, são dispensáveis pois não servem para fazer a distinção necessária entre os melhores e os menos aptos, ou então servem e as restrições ao ingresso, para além das resultantes da classificação académica, são uma redundância.

E não me venham com o exemplo dos advogados, pois o curso de Direito não é um curso profissionalizante de advocacia. É algo com um leque de saídas mais vasto do que o exercício da dita profissão. Já um curso especializado em Ensino é algo perfeitamente centrado numa finalidade. Não funcionam muito bem? O que lá se ensina não é coisa muito adequada à vida prática dos docentes? As classificação são inflaccionadas? Cada instituição usa critérios diversos?

Mas então fiscalizem o seu funcionamento! Não usem o truque habitual de deixarem a funcionar algo mal e depois queixarem-se e quererem impor medidas restritivas a posteriori de todo o processo que, aparentemente, consideram errado.

Ou então, como eu sempre defendi, deixem cada um tirar o seu curso numa dada área científica e depois optarem por ingressar ou não na docência e, em caso afirmativo, então fazerem uma profissionalização prática e efectiva. Só que, claro, nesse caso, pagando aos estagiários e não utilizando mão de obra barata que depois é despejada directamente no desemprego.

  • Quanto ao sistema de quotas já muito foi dito e escrito sobre a sua inadequação à função docente. Eu dou isso por adquirido e prefiro sublinhar as perversidades práticas da sua sua implementação.

Sobre a filosofia do garrote a meio da carreira só posso concordar que é uma noção muito sui generis de conceber a carreira docente e muito em especial de definir o que pode e não pode ser o “mérito”. Por excelente que seja, um docente com 10 anos de carreira não pode ver essa excelência reconhecida mas, em contrapartida e como o sistema está agora pensado, quem tenha 30 anos de carreira meramente regular já pode ser considerado titular. Para além disso o sistema de quotas proposto tem muito mais efeitos perversos pois, ao serem definidas as quotas por agrupamento de escolas ou escolas não agrupadas, isso vai desiquilibrar bastante a situação entre estabelecimentos de ensino. Em alguns, mais envelhecidos, onde a proporção de “tituláveis” poderá andar bem acima dos 50%, muita gente ficará de fora, enquanto em escolas “jovens”, a quota poderá acabar por não ser preenchida e esse número não é recuperável, pelo que, na prática,isso significa que os 30% propalados pelo Ministérios serão efectivamente muito menos, em especial atendendo às condições draconianas impostas para o acesso à casta dos que passarão a ser os “intocáveis das Escolas, detentores de todo o poder. Outro efeito possível é a debandada de muitos docentes de Escolas com a quota preenchida por muito e bons anos que irão em busca de vagas, assim tapando a progressão de outros colegas em outras escolas.

Na prática isto só agravará a instabilidade dos corpos docentes das escolas e destruirá bastante qualquer tipo de espírito de equipa e trabalho em comum, antes estimulando o bajulamento e o clientelismo.

Mas há outro efeito perverso da definição de quotas por agrupamento ou escola que é o da distribuição de titulares por departamentos ou grupos disciplinares. Em muitos agrupamentos, os titulares serão quase exclusivamente docentes do 1º ciclo e de grupos onde o ingresso na profissão em meados dos anos 70 se fazia com uma habilitação e idade mínimas. Ou seja, e não querendo estar a discriminar nmegativamente ninguém, a verdade é que serão mais facilmente titulares aqueles docentes que só recentemente tiveram uma habilitação equivalente à licenciatura e ingressaram na carreira por vezes apenas com o Propedêutico ou mesmo o 9º ano, do que um docente com uma dúzia de anos, ramos de formação educacional e alguma habilitação complementar, tipo pós-graduação ou mestrado. Isto é, no mínimo, ridículo. Para além de que grupos e departamentos com um perfil mais “jovem” (lembro-me do caso de Educação Musical, mas não só) dificilmente conseguirão preencher números significativos de titulares que fiquem em situação de desempenhar cargos de coordenação ou avaliação da progressão dos colegas. E então serão obrigados a juntar-se em departamentos com áreas muito diversas e, eventualmente, a verem a sua progressão avaliada por docentes de Educação Visual ou Educação Física, por exemplo. O que é quase tão ridículo como o mecanismo de muitas substituições em vigor.

E aqui já se aflora o mecanismo de avaliação dos docentes que merece tratamento separado, tanto pela extensão deste texto, como pelo facto de, a cada nova versão da proposta ministerial, os parâmetros flutuarem. De qualquer modo são válidas algumas das considerações já alinhadas e que passam pelo facto de, neste momento, existirem situações concretas dificilmente compatíveis com o articulado proposto. Em algumas escolas, são candidatáveis a titulares docentes que não exercem cargos de coordenação departamental, enquanto estes estão a ser ocupados – e eventualmente em início ou a meio do mandato – por docentes abaixo do 8º escalão.

Por outro lado, o esquema burocrático da avaliação não é radicalmente diferente da já existente, apenas complicando o processo e tornando-o menos transparente (e não o contrário) porque, como o fundamental é o sistema de quotas, o processo de avaliação é apenas uma mera operação cosmética de validação desse sistema. Na carreira de professor, o poder dos titulares vai fazer-se sentir sobre os restantes docentes de forma asfixiante, incentivando o desenvolvimento de práticas que, longe de tenderem para a excelência, mais estimularão a subserviência e a bajulação acrítica.

Mas como quem propõe estas medidas só tem um conhecimento teórico das questões e não parece entender as implicações negativas no quotidiano do trabalho dos docentes nas Escolas e na própria qualidade do ensino, percebe-se que defenda com firmeza soluções perfeitamente abstrusas para quem, ao nível do terreno, consegue aperceber-se das irregularidades que irão dificultar o bom desenvolvimento do “jogo”. Só que este conhecimento do “terreno” parece ser cada vez mais uma desvantagem e, pior, parece ser encarado como uma condição menor perante quem, no respaldo do gabinete, só vê números, gráficos e teorias em segunda mão, mas sente estar dotado de um saber superior, incomensuravelmente mais qualificado do que o docente comum, esse ser menor, encarado como peça indiferenciada de uma engrenagem que se quer “endireitar”.

O que é pena.

Principalmente por não terem razão e andarem tristemenete a esconder que apenas andam a arranjar uma forma muito mal disfarçada para poupar uns cobres.

A Banda Desenhada do Superveniente será completada ainda hoje, agora que a PT já resolveu o meu problema, que afinal nem era meu…

No final da semana passada e durante o fim de semana multiplicaram-se os sinais alarmantes sobre a evolução das negociações entre o Ministério e os Sindicatos. Aparentemente, o que devia ser um processo negocial parece ter-se transformado num mero exercício de vingança sobre a classe docentes. É a única hipótese lógica, a menos que a outra seja a pura incompetência dos negociadores ministeriais.

A eliminação do articulado do ECD da possibilidade de pausas de actividade docente – e não apenas lectiva – no Natal, Carnaval e Páscoa, a par da tentativa de alargar o horário de trabalho docente para oito horas diárias só pode resultar de uma tentativa verdadeiramente vergonhosa de entrar no puro achincalhamento de toda uma classe, tentando reduzi-la através de um controle burocrático-administrativo das suas funções completamente insuportável (sobre esse tipo de processo cf. o que é escrito por Mª Lurdes Rodrigues na sua obra Sociologia das Profissões, pp. 77-80, que descreve exactamente o que está ser feito).

No Público de domingo António Barreto considerava que tais propostas só poderiam ter sido feitas por alguém que queira prejudicar a imagem do Ministério. Ora se essas propostas, desmentidas de forma muito inábil, partem do próprio Ministério temos aqui um caso interessante de esquizofrenia institucional.

Razão terá Mário Nogueira que, falando hoje na Antena Um, afirmava que a equipa negociadora do Ministério é formada por gente completamente estranha ao quotidiano escolar, pois não passam de académicos e inspectores. Só assim, digo eu, se explicam ideias que não passam de teses completamente descabidas em termos de aplicabilidade. A menos que tudo já não passe de uma pura e simples tentativa de ferir cada vez mais o orgulho profissional dos docentes (hoje há mais notícias plantadas em vésperas de nova rodada de negociações) e de empurrar os sindicatos para o corte das negociações, o que legitimaria todos os desmandos unilaterais a partir de agora.

60 horas sem telefone e internet graças a uma avaria inexplicável  que em todo o meu quarteirão só me afectou a mim. Desde 6ª feira à noite a linha morreu. Sábado de manhã comunica-se a avaria e promete-se comunicação rápida à equipa técnica.

Como o dinheiro está caro, durante o fim de semana ninguém fez nada, mas hoje às 9.01 comunicaram-me a resolução do problema. Acredito que o problema fosse gravíssimo.

E depois as OPA’s e todo o resto. Enfim, não vale a pena estender-me. Há assuntos bem mais prementes.

Devido a diversos problemas no acesso ao Umbigo, as últimas quatro páginas da banda desenhada do nosso colega Antero só ficarão disponíveis na página respectiva quando conseguir regularizar alguns problemas técnicos. Como aperitivo fica aqui apenas a última delas.
Também por isso, novos posts só serão possíveis quando tudo estiver resolvido.

Eu pensei que a referência aos crominhos ingénuos da colecção O Amor é… de final dos anos 70 pudesse dar o toque sobre o tom, também assim para o ingénuo, do post mas houve quem o tomasse pelo valor facial e entendesse que eu estou num mar de dúvidas sobre o que é um bom professor.

Olhem que não, olhem que não… Eu até tenho uma ideia razoavelmente clara sobre o que deve ser um bom professor, em especial se estiver integrado num sistema educativo coerente e em que nas Escolas as funções estejam distribuídas de forma lógica pelos diversos intervenientes. Em boa verdade só a dúvida sobre a percepção que tenho de mim próprio como “bom professor” é que permanece por esses critérios que imagino é que corresponde à realidade.

No fundo, o que se pretendia com aquela digressão era criticar a nova concepção – depois de uma década e picos em que se privilegiou a auto-avaliação e uma noção mais fluida do mérito dos docentes – essencialmente quantitativa do desempenho dos professores, como se eles fossem operários numa linha de montagem de automóveis, mas com baixo grau de especialização, em que cada peça humana tem tanto valor específico como um parafuso e, não estando um, coloca-se outro e dá tudo no mesmo, desde que se fabriquem x carros ao fim do dia.

Entretanto, a aparição daquela que se apresenta como a versão final do Ministério para o ECD, apenas deu mais actualidade a essa crítica, pois a avaliação dos docentes tornou-se agora um emaranhado burocrático a fazer lembrar a primeira versão do estatuto disciplinar dos alunos que foi aprovada nos anos 90. A concepção básica está errada e a sua exequibilidade prática é, no concreto de muitas situações, bem demonstrativa do que uma imaginação de gabinete pode fazer numa loja de cristais.

Por agora, e por falta de tempo, só vou destacar duas incongruências no meio de muitas:

  • a) A avaliação do docente continua a integrar o nível de abandono escolar dos alunos o que é de uma notável miopia como se um determinado professor pudesse ser responsabilizado por um fenómeno que se pode ficar a dever tanto ao meio envolvente e familiar do aluno (deixar para depois para diploma regulamentar os “travões” ou  parâmetros de tipo socio-económico não chega), como a circunstâncias particulares da vida escolar do aluno, exteriores à área de acção daquele docente específico. Exemplificando, o porque é que o docente de Matemática ou de Inglês ou de História deve(m) ser penalizado(s) se um determinado aluno abandonou a escola por conflitos com outros alunos ou porque se sentiu objecto de discriminação ou injustiça pelo docente de uma qualquer outra disciplina? Mesmo considerando que o Conselho de Turma é uma equipa que trabalha como tal e monitoriza o trabalho de cada um dos seus elementos, como é possível alargar a todos o que pode nem ser responsabilidade sua, ou de uma situação específica e localizada?
  • b) A avaliação dos docentes contempla como avaliadores dos departamentos curriculares. Ora, em muitas escolas, não existem em diversos departamentos docentes com condições para serem considerados sequer candidatos a titulares, assim como em outros quem ocupa o cargo pode ser alguém mais jovem e num escalão mais baixo da carreira. Não sendo isso para mim nenhum problema, gostaria de saber como, de acordo com a lógica (?) interna do documento ministerial, se resolve esta situação. Destitem-se os coordenadores nessa situação, substituindo-os à força por outros? E quando não existem docentes com a capacidade de serem titulares? Avaliam-se os docentes de Educação Musical ou TIC, só para dar dois exemplos de grupos disciplinares “jovens”, como? Integram-se também à força esses docentes em departamentos onde já tenham coordenadores “titulares”, mesmo que sejam de áreas completamente diversas e sem qualquer conhecimento específico da área dos docentes em causa?

Mas tão mau como isso é deixar para regulamentar em dipomas posteriores diversos aspectos da aplicação deste documento o que, para além de dar uma margem de manobra excessiva a agentes políticos claramente indispostos com os professores e com a missão de os fazer “pagar a crise”, nada garante em termos de cumprimento de prazos.

O que se percebe é que o ECD tinha de estar pronto antes de acabar o “congelamento” das progressões que, entretanto, cerceou de forma eticamente muito reprovável o perfcurso profissional de mais de uma centena de milhar de pessoas.

Tudo muito mau, mas nada como um ex-qualquer coisa para saber como tramar os seus antigos colegas de condição, com a agravante de este ex-qualquer coisa ainda parecer sentir que é um ex-qualquer coisa de condição superior e mais esclarecida e douta do que aqueles com quem negociou.

… na minha verborreia, para que se possa apreciar a arte do leitor/colega/colaborador Antero.

Eu tinha aqui uma apostilha ao post Um Bom Professor é… e mais uns números, para além da parte 3.3 da Análise de Conteúdo em preparação e de uma primeira leitura da versão que o Ministério da Educação apresenta como final do Estatuto da Carreira Docente, fechando aparentemente desta forma abrupta o processo negocial, mas como indefectível amante de Banda Desenhada hoje vou apenas apreciar o trabalho alheio.

Porque o merece.

Adenda: Depois de a ler na transversal, a versão outubrista e “final” do ECD é má, porque faz remendos incoerentes, porque é injusta para com as expectativas profissionais de dezenas de milhar de docentes e discriminatória em diversas passagens, na tentativa de aliciar alguns contra o que será a maioria. Então a exequibilidade da avaliação dos docentes nos termos em que está formulada, parece-me claramente impossível em muitos departamentos de muitas escolas. Mas como disse, isso vai ficar para depois.

A notável e hilariante Banda Desenhada do Antero Valério com o seu super-herói fabuloso O Superveniente, neste caso combatendo o Dr. Insucesso.

 

De rir e chorar por mais. As primeiras 4 páginas já estão numa secção própria deste blog. É só procurarem bem no canto superior direito do ecrã, mesmo por cima do títalo e clicarem. As páginas restantes entrarão brevemente.

O artista, neste caso, é mesmo um verdadeiro artista.

Volto a declarar que considero que em Portugal foi feito um esforço substancial para equipar as Escolas durante boa parte dos anos 90 e já no presente século. As Escolas, nomeadamente as Básicas e Secundárias, estão melhor equipadas do que estavam há 15 anos. Isso é inegável.

Mas também é verdade que alguns investimentos ainda são muito escassos para os resultados que se pretendem obter. Há muito poucos dias passou o Dia Internacional das Bibliotecas Escolares e, quase em simultâneo, chegaram a muitas delas as comunicações sobre as verbas concedidas para dinamizar o Plano Nacional de Leitura. Eu sei que há muitas escolas no país e os recursos são finitos, mas 2500 euros como recebeu a Biblioteca da minha, sendo claramente melhor do que nada, estão muito longe de chegar para transformar o pão em rosas.

Aliás os números sobre a evolução da despesa com a Educação entre 1995 e 2003,  no contexto da despesa pública do Estado português, apontam para uma ligeira quebra de um valor que rondava a média dos países da OCDE para um valor que se afasta desa média, sendo o 14º em 26 nações.

Por isso, quando se elabora um discurso que sublinha de forma bastante acentuada o custo da Educação em Portugal, nunca nos esqueçamos que ainda estamos a recuperar de um grande atraso e, depois uma aproximação às médias internacionais, até começamos de novo a divergir.

De novo, um ano depois, pouco mudou…

Será que alguém vai levar isto a sério e de forma literal?

Antigamente existiam uns cromos muito ingénuos com um menino e uma menina com o título “O Amor é…” e depois existiam múltiplas soluções.

Já quanto a saber o que é um “bom professor” confesso que agora, mais do que nunca, ando cheio de dúvidas. É que fui apanhado de surpresa por um colega meu, 10º escalão, larga experiência de docência e cargos vários, que de sorriso afivelado me inquiriu quando eu espreitei para o espaço dos fumadores, “E tu o que achas que é um bom professor?”. Pois ele próprio andava às voltas com a questão e não lhe encontrava solução.

Não sou de ficar sem resposta facilmente, mas desta vez fiquei meio parado sem saber o que dizer, ou como juntar de forma coerente um par de pensamentos que ultrapassassem o óbvio. É que em perto de 20 anos muita coisa mudou e o conceito de “bom professor” foi naturalmente evoluindo e sofrendo múltiplas transformações, normalmente no sentido do seu alargamento para novos domínios.

Nos meus primeiros tempos, achava eu que ser um bom professor passava por ensinar o melhor possível os meus alunos, tornando-os capazes (agora é seria melhor escrever “competentes” ou ainda melhor “dotados das competências”) de obter bons resultados nos momentos de avaliação e, ambição maior, que esse saber pudesse ser útil no seu futuro; assim como também passava por cumprir as minhas obrigações formais na Escola e não atrapalhar os outros colegas. Este último detalhe não era, de todo, de desprezar.

Com o passar do tempo as coisas foram-se modificando em meu redor e eu próprio passei de caloiro a jovem professor e, a certa altura, comecei a ver-me a meio da carreira, tão perto ou longe do seu início como do seu fim, a meio caminho entre a completa inexperiência e o conforto de um saber profissional capaz de dar resposta às diversas solicitações da função. Que é por onde ainda estou.

Só que, entretanto, a função do professor desdobrou-se em múltiplas dimensões e, para além de educador, tornou-se um elemento activo de uma ou mais equipas (os Conselhos de Turma), de uma organização (a Escola), um profissional que se pretende reflexivo e crítico (foi a moda na segunda metade dos anos 90 do século passado), alguém que deve estar atento a todo e qualquer perfil de aluno nas suas aulas, uma miríade de exigências de que, sinceramente, nem sempre me sinto à altura.

Talvez não saiba definir o que é um “bom professor”, porque tenha o receio de encarar a dura verdade de eu próprio não me considerar um bom professor, um entusiasmado e dedicado elo na grande engrenagem do sistema educativo. Porque não sou capaz de sacrificar todo o meu tempo em prol da Escola, roubando-o à família. Porque não sou capaz apenas de pensar no “trabalho pedagógico” e na sua preparação e perco muito do meu tempo a ler ou mesmo, sacrilégio, a ver televisão. Porque nos fins de semana me recuso a estar horas agarrado a dezenas de testes, procurando o equilíbrio supremo da avaliação justa, ou a conceber “novos materiais” de apoio, e preferindo ir dar um passeio até aos jardins da Gulbenkian, onde a minha filha possa dar umas côdeas aos patos sem precisar de se desviar constantemente de fezes caninas ou ciclistas entusiasmados.

Enfim, muita coisa me faz acreditar que não estou em condições de ser um “bom professor”.

O que nunca me tinha ocorrido é que essa condição poderia estar dependente de leccionar uma dada e muito específica percentagem – digamos, assim por acaso, 95% – de aulas. Nunca considerei esse critério quantitativo como elemento indispensável e exclusivo (no sentido de excluir quem o não cumpre) para a minha definição como bom, muito bom, menos bom ou francamente mau professor. Nunca pensei que em 709 aulas previstas para este ano lectivo poderei ser um bom professor, ou mesmo muito bom, se der 676, mas já só poderei ser considerado suficiente se apenas der 672.

Sinceramente, durante muito tempo quis acreditar que a qualidade do meu trabalho não seria mensurável nestes termos. Mas pelos vistos vivi o suficiente para assistir a esta forma de classificar o trabalho de um professor. Porque, não o esqueçamos, este critério quantitativo é aquele sem o qual todos os outros são irrelevantes. Não interessa se eu tiver formado óptimos alunos e futuros cidadãos; que nas provas de aferição eles tenham performances estonteantes e acima da média nacional, que tenha desempenhado as minhas missões administrativas a contento na Escola (podendo hipoteticamente ser de Director de Turma, ou Coordenador de Departamento ou isto ou aquilo); que os encarregados de educação me adorem sem excepção.

Se não der as 675 aulas determinadas pela fórmula mágica e me descuidar, tudo vai por água abaixo e “bom professor” terei logo a certeza de não ser. Pelo menos as minhas dúvidas terão fim.

… nomeadamente a quem trabalhar com alunos para quem o Português não é a Língua Materna ou mesmo em casos em que sendo-o oficialmente depois o nível de proeficiência linguística deixa muito a desejar, aqui fica a sugestão de uma publicação que ajuda, tanto no plano teórico como no prático, a encarar o ensino do Português como Língua Não-Materna de forma menos problemática.

Tem um pózinhos de eduquês, mas nada de mais.

Pedindo ao Alto Comissariado para a Imigração e Minorias Étnicas, o envio é gratuito.

Afirma hoje José Manuel Fernandes no seu editorial no Público sobre a fundamentação de distribuir portagens por algumas SCUT:

O gato ficou escondido com o rabo de fora, e nos estudos há muito mais alçapões. Só é pena que o Governo julgue que todos são tolos. Não são. (…) Seria mais honesto e coerente, pois nem sempre gerir a informação consegue evitar o inevitável: que se perceba quando se está perante argumentos falacciosos e mentirosos.

Perante este tipo de análise ocorrem-me alguns pensamentos estranhos que passo a expor para apreciação colectiva:

  • a) Não me move neste blog qualquer interesse mais geral do que discutir assuntos relacionados com a Educação, pelo que este não é um fórum anti-governo ou de análise sistemtática de outros temas.
  • b) Apesar disso, é de saudar com todo o vigor o interesse colocado por órgãos de comunicação social (o Público, mas também o Jornal de Notícias) em desmontar a fundamentação “técnica” que o governo apresenta para legitimar certas opções políticas e assim encobrir a verdadeira razão porque decide como decide.
  • c) Continuo à espera de equivalente esforço na desmontagem do discurso emanado do Ministério da Educação e seus organismos ou criaturas-satélite sobre a origem dos males educativos nacionais, assim como sobre a bondade de muitas das actuais propostas.
  • d) Arrisco, sem grande probabilidade de me queimar, que se os senhores jornalistas – e os jornais para onde escrevem – com competência para isso tivessem a coragem de fazer tal exercício em torno dos “mitos” a Educação, provavelmente chegariam a conclusões similares às de José Manuel Fernandes sobre as SCUT.
  • e) Se o mundo da comunicação social fosse um verdadeiro quarto poder, onde imperasse a liberdade de investigar e opinar, não era necessário que tantos jornalistas e opinadores precisassem de criar e escrever em blogues o que, aparentemente, lhes é vedado no seu trabalho quotidiano.

A descolagem consciente da realidade pelos políticos, com intuitos mistificadores, assim como a retória da “justiça social” com base em dados técnicos “objectivos”, deveriam ser sempre objecto do escrutínio dos cidadãos e daquelas instituições que, querendo ser um poder anti-poder, têm meios para investigar e divulgar a informação de forma crítica e não meramente como instrumento fotocopiador de dossiers cordatamente aceites nas redacções (se alguém pensou naquele suplemento da Visão de há umas semanas, pensou bem… mas há muito mais por aí…)

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