Não somos uma democracia jovem, somos uma democracia já bem madura, que incorporou todos os mecanismos da luta política avançada pelos moldes do mundo avançado.
A corrupção inscreveu-se no funcionamento normal das instituições, por via de carreiras políticas fabricadas sobre os compromissos e os negócios.
Os poderes político-partidário e económico-empresarial entrelaçam-se com carinho, numa dependência mútua que fabrica uma realidade vendida aos cidadãos comuns como inevitável.
Seja no seu verso como no seu reverso.
A situação incorpora a oposição e a norma contém as alternativas. As alternativas anseiam à norma e as oposições, mesmo as alternativas, anseiam ser, antes de mudar seja o que for, ser situação.
Nada como ver a forma como uma oposição indignada e apresentada como radical se entretém semanas a discutir onde pode contestar em segurança, merecendo elogios de responsabilidade pela sua postura, e como uma oposição tida por alternativa e ainda mais indignada se junta ao sábado perante um parlamento deserto, após combinar coma polícia quantos degraus pode subir na escadaria para demonstrar o seu desespero. A preocupação está na filmagem, se passou na televisão, porque se acredita que a realidade só muda se for televisionada, pois já nem de revolução se fala. Mas ao ser marcada com antecedência e conhecido o guião, esta é uma contestação tão ou menos virulenta do que um debate encenado ao pormenor nos estúdios.
Temos uma democracia madura, realista, nada ingénua ou idealista. Hegel acima de Marx, mesmo quando se grita por Marx nas ruas. A síntese é quase perfeita, os sobressaltos cada vez mais esporádicos, a singularidade aspira a rotina.
Nada que não tenha já sido observado e teorizado, mesmo para paragens onde a contestação se mostrou mais agressiva, insistente e vocal.


Em boa verdade, no fim do dia de ontem, todos os envolvidos estavam satisfeitos. Uns cumpriram a sua obrigação de contestar e mostrar que a “indignação está viva” e os outros continuaram na sua vidinha, em nada alterada pelo cronograma do evento.
Se há alternativas? Pelo que se percebe, nem uma boa contestação com pedrada, tiros e apoios externos, serve para mudar a má vida dos que mais sofrem e os mecanismos de dominação política em democracia formal ou mal amanhada. As Primaveras passam quase imediato a Invernos, mesmo que com braseiros à mistura.
Estamos com o sistema político e representativo bloqueado?
Talvez… é bem possível que sim. E tanto mais bloqueado quanto as regras se cristalizam. As da acção-reacção ou ainda mais as da acção-inacção e vice-versa.
Estamos condenados a isto?
Não necessariamente, mas certamente que sim enquanto tudo for tão previsível, enquanto os actores estiverem dependentes uns dos outros para terem significado.
E sabemos pelo passado mais ou menos recente que o confronto é apenas por posições.

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