PR: Problemas da Educação só se podem resolver com exigência – Cavaco Silva
O Presidente da República disse hoje que a ideia de que os problemas da educação se podem resolver sem exigência “é errada” e que o “ciclo depressivo” na aprendizagem da matemática não pode ser quebrado com “a desculpabilização do insucesso”.
“Temos que quebrar este ciclo depressivo que existe no nosso país em relação à Matemática. Mas a resposta a esse problema não pode ser a desculpabilização do insucesso nem tão pouco dizer que a matemática é fácil e divertida”, disse o Presidente.
(…)
“Aprender exige disciplina, trabalho, exige esforço da parte de professores, pais, da comunidade, mas também muita disciplina dos alunos”, disse.
Mesmo para muito maus entendedores eu acho que estes recados já começam a ser demasiado frequentes e claros, para serem ignorados.
Eu sei que Cavaco Silva promulgou toda a legislação que sabemos, lesiva para os interesses dos professores, em algum caso para diminuir direitos que tinham sido concedidos em Governos seus. E sei que só começou a mostrar o sinal amarelo quando chegou ao Estatuto do Aluno.
No entanto, parece-me que o PR terá pensado durante algum tempo – erradamente, como muitos outros e nem sempre mal-intencionados – que estava a dar os necessários instrumentos ao Governo para instituir uma cultura de rigor e mérito na Escola Pública e que isso deveria ser exemplificado pelos docentes, os primeiros modelos a ser seguidos pelos alunos.
Claro que quem anda por dentro disto sabia que essa era só uma fase inicial destinada a cortar gastos. Mérito e rigor não são conceitos muito familiares a alguns dos actores políticos que intervieram neste processo. Resultados e estatísticas, números e gráficos, talvez.
Mas até acredito que alguns ingénuos pensassem isso e não percebessem que a fase seguinte passaria por fazer pressão, por via legislativa, sobre os professores para distorcerem a avaliação dos alunos em nome do “sucesso”. Aqui no Umbigo discutiu-se isso, bastando consultar os arquivos.
Até pode ser que Cavaco Silva pensasse que, depois de sanado (?) o diferendo em torno do ECD tudo ficasse mais calmo e o ambiente nas escolas voltasse ao normal.
Errou na sua avaliação. O ambiente nas escolas é de desânimo entre a maioria dos docentes, aposentando-se muitos dos mais antigos e dedicados, enquanto outros, com hipóteses de saída para outros ambientes (sector privado, outras actividades profissionais) começam a ponderar essa hipótese, depois de terem optado pela docência há uma ou duas décadas.
Mas é notório que Cavaco Silva percebeu parte do seu erro e parece que a mensagem de desalento terá chegado a Belém o que se tem traduzido recentemente em intervenções onde:
- Se exigem resultados ao Governo em troca da colaboração na promulgação do pacotão legislativo.
- Se aconselha o Governo a ouvir os protestos dos docentes e a dialogar com eles.
- Se avisa o Governo para não enveredar por soluções facilitistas em termos da obtenção dos resultados antes pedidos.
- Se exige trabalho e disciplina a alunos e famílias, não apenas aos docentes.
Quem até agora achasse que a mensagem do PR era ambígua, que era para todos, que no fundo apoiava o Governo, etc, já se pode desenganar. O alvo das recentes declarações é muito claro e o seu conteúdo corresponde, mesmo se não de forma explícita, ao que muitos docentes exigem: respeito para si e rigor para todos.
Penso que apresentar resultados apenas com base em truques estatísticos, manipulação das regras por via legislativa, tratamento selectivo dos dados e pressão sobre os docentes, chantangeando-os com a ameaça da sua avaliação ser penalizada se não colaborarem na mistificação em curso, não vai ser suficiente para satisfazer Belém.
Porque, por muito que Cavaco veja «ímpeto reformista» em Sócrates e especificamente no ME, é impossível que não veja outras coisas, outras incoerências de trajecto e discurso, outras personagens cinzentas por trás do palco e, muito em especial, uma mera COSMÉTICA DO SUCESSO, através de UMA REPRESENTAÇÃO ESTATÍSTICA DA REALIDADE.
Dezembro 16, 2007 at 1:35 pm
Disciplina é um conceito totalmente arredado deste primeiro-ministro, simplesmente autoritário.
Veja-se apenas o péssimo exemplo que dá chegando habitualmente atrasado às mais diversas cerimónias, incluindo algumas com a presença do Presidente da República nas quais Sócrates chega, despudoradamente, depois do Presidente.
Imagine-se o esforço que terá feito para chegar a horas à assinatura do Tratado, espectáculo que culminou um processo apressado em que até a Polónia ganhou um Advogado-Geral permanente, a par dos da Alemanha, França, Itália e Espanha e onde Portugal andou de gatas só para fazer a festa em Lisboa.
Sócrates, que tanta “disciplina” exige dos Professores, teria sempre falta ao primeiro tempo.
Dezembro 16, 2007 at 1:39 pm
Parece-me que “estamos a ficar menos subliminares”. Apesar de ser a atitude zen a mais importante para o nosso equilíbrio profissional e familiar, apetece-me dizer: “deixem-me trabalhar!” o que em Português (não técnico) significa dar as aulas da minha disciplina, acabar(em-me) com reuniões medíocres e infindáveis (ficarei alegremente as horas necessárias se for para a dignificação do ensino, não mais do que as previstas no estatuto e no código de trabalho) e continuar a fazer passar aos alunos a mensagem de sempre: “não há almoços de graça para ninguém” ou como resposta ao: “veja lá se não tenho negativa” que é sempre a : “tu é que devias ter visto isso durante estes três meses quando pensavas que isto era a Divertilândia” .
Dezembro 16, 2007 at 2:06 pm
Já viram esta afirmação de Monsieur Valter La Palisse Lemos ?
“É um facto real que os países que não têm repetência, ou que têm taxas baixas, apresentam também melhores resultados escolares medidos em termos de aprendizagem. Em todos os estudos internacionais se verifica esta correlação alta entre o peso da repetência na amostra e os desempenhos”, comenta o secretário de Estado da Educação, Valter Lemos.
Aqui http://ultimahora.publico.clix.pt/noticia.aspx?id=1313961&idCanal=58
Ainda na mesma “notícia” e pelo mesmo senhor(as aspas são porque não é mais do que um passo numa campanha destinada a diminuir o número de professores do ensino público)
“Estamos a pagar os efeitos de uma série de opções feitas ao longo de muitos anos, em que o sistema foi organizado em função dos professores”
Preparem-se professores, eu não o sou e no entanto já estou com pena de vós
Dezembro 16, 2007 at 2:17 pm
Reparem na sequência, primeiro Margarida Moreira, escassos dias depois Jorge Pedreira e agora Valter Lemos acentuam que o abandono é causado pela “reprovação”. Conjuguem tudo isso com o folclore dos computadores e das “Novas Oportunidades” apresentadas como a solução milagrosa e já verão que o objectivo é a criação de um sistema de ensino paralelo destinado às classes economicamente mais desfavorecidas (é nelas que temos as maiores dificuldades de aproveitamento, pago com dinheiro público e em breve entregue a mãos privadas. Claro que sobrarão professores e o dinheiro que a eles se destinaria será “proveitosamente” entregue a escolas profissionais nas quais participarão as “actividades locais” (são sempre os mesmos do clube de futebol local e das assessorias da câmara municipal da terra)que contratarão os excedentes pelo preço de uma côdea de broa.
Todos lucrarão, menos eu que continuarei a pagar os mesmos impostos e os professores.
Dezembro 16, 2007 at 2:21 pm
Os princípios da segurança jurídica e da protecção da confiança dos cidadãos assumem-se como princípios classificadores do Estado de Direito – expressamente consagrado no art. 2.º da CRP – e implicam um mínimo de certeza e segurança nos direitos das pessoas e nas expectativas juridicamente criadas a que está imanente uma ideia de protecção da confiança dos cidadãos e da comunidade na ordem jurídica e na actuação do Estado.
Segundo o que está plasmado no art. 12.º do Código Civil, a lei só dispõe para o futuro; ainda que lhe seja atribuída eficácia retroactiva, presume-se que ficam ressalvados os efeitos já produzidos pelos factos que a lei se destina a regular.
O princípio geral é, assim, o da não retroactividade da lei. Esta não se aplica aos factos ou seus efeitos já produzidos, justamente, como garante daqueles princípios.
A actuação deste governo, em relação à Educação, feriu brutalmente estes princípios basilares e o PR chancelou-a. A confiança dos professores foi traída e, como é óbvio, a insegurança e a desconfiança instalaram-se.
Penso que é um erro crasso pensarmos que alguém pudesse ajuizar que as medidas tomadas contra a “classe” docente pretendessem elevar a qualidade da Educação, porquanto isso denotaria uma profunda ignorância sobre a importância da motivação enquanto factor mobilizador do comportamento.
Ai, ai, estamos entregues à…
Dezembro 16, 2007 at 2:56 pm
Na minha assídua frequência deste blogue, poucas vezes terei encontrado textos tão certeiros como este. Vou citar parte dele no meu blogue, com link para o todo, e enviá-lo a todas as pessoas na minha lista de contactos.
Dezembro 16, 2007 at 3:01 pm
Obrigado, ao contrário dos escribas amargurados que escrevem “para si mesmos” e para exorcizar demónios, eu aprecio ser lido por mais gente.
😀
Dezembro 17, 2007 at 1:40 am
Eu acho muito tarde…
O pior já está feito….
e lembrei-me de mais uma… o professor generalista, promulgado claro está.
Daqui a umas semanas temos os decretos da avaliação promulgados.
Dezembro 17, 2007 at 2:06 am
Esqueci-me… é bem provável que o PR esteja a preparar terreno para o veto ao Estatuto do Aluno.
Espero que seja isso. Aquilo não pode entrar em vigor!
Dezembro 17, 2007 at 2:17 am
Aguardemos pelos resultados das falinhas mansas. A atitude do PR, relativamente aos professores, não deixa de causar uma certa estranheza. Certo é que, passo a passo, vai promulgando a nossa desdita e a sentença de morte para o ensino público!
Dezembro 17, 2007 at 11:11 am
É importante vigiar aos sinais de fissura do bloco que tem confontado os professores com uma barragem legislativa, cujo aspecto predominante é tornar o trabalho pedagógico mais difícil, logo os resultados mais contingentes. É possível que, prosseguindo nessa linha, alguma boa notícia surja finalmente. Mas muito mais terá que ser feito pelo Presidente para se demarcar do papel que objectivamente tem desempenhado até à data nesta matéria. Há que estar alerta, mas é cedo para embandeirar em arco.