Uma reforma ou uma etapa?
O que se esperava ser uma reforma curricular foi apresentada pelo MEC como uma “revisão” e apenas uma etapa que “abre caminho a reformas curriculares mais profundas” a desenvolver no futuro.
O que significa, desde logo que se fica sem saber para que serve ao certo o debate público que agora é aberto, pois o que nos é proposto é algo a caminho de um objectivo que permanece desconhecido, para além da formulação vaga repetida por todos os governos e todos os ministros que será a caminho de amanhãs que nos sorrirão de tanto sucesso que imaginar é difícil.
Mas, apesar da indefinição quanto ao horizonte temporal das medidas a aplicar, a proposta que temos para discussão levanta diversas questões que se poderão sistematizar, de forma simplista, da seguinte forma:
No plano da estruturação curricular, o anunciado combate à dispersão curricular não acontece no 2º ciclo e é feito no 12º ano sob a forma do corte de uma disciplina sem compensação no reforço das restantes. Apenas no 3º ciclo se procede a uma concentração do currículo, com a recuperação (e não reforço) de horas lectivas para as disciplinas sacrificadas na reforma curricular de há uma década.
No plano pedagógico, as alterações são num sentido conservador, em especial no 3º ciclo, de reforço de um núcleo duro do currículo em detrimento das áreas curriculares não disciplinares, cuja utilidade foi bastante contestada.
No plano da gestão dos recursos humanos, a presente proposta terá consequências dramáticas nas escolas, em especial no caso do 2º ciclo do Ensino Básico em que estarão em risco cerca de 15% dos professores em exercício, a esmagadora maioria deles dos quadros. O que poderá significar uma situação de mobilidade para perto de 5000, metade ou mais do grupo de EVT. No caso do 3º ciclo e Secundário, o impacto é menor, com o alargamento da escolaridade para 12 anos a ser feito com base em rearrumações de que ainda não é possível prever a extensão. E neste particular irão fazer-se sentir de forma decisiva os poderes quase discricionários que as actuais direcções têm na distribuição dos horários disponíveis.
Isto significa que se aproxima um período de recrudescimento da instabilidade nas escolas que dificilmente se poderá traduzir numa melhoria do trabalho desenvolvido com os alunos.
Dezembro 13, 2011 at 11:57 am
“No plano da gestão dos recursos humanos, a presente proposta terá consequências dramáticas nas escolas, em especial no caso do 2º ciclo do Ensino Básico em que estarão em risco cerca de 15% dos professores em exercício, a esmagadora maioria deles dos quadros. O que poderá significar uma situação de mobilidade para perto de 5000, metade ou mais do grupo de EVT. No caso do 3º ciclo e Secundário, o impacto é menor, com o alargamento da escolaridade para 12 anos a ser feito com base em rearrumações de que ainda não é possível prever a extensão”
Esta é a razão pela qual vamos continuar a ter uma aberração chamada 2º ciclo, se fosse fundido …
Dezembro 13, 2011 at 12:09 pm
Concordo com a análise do Paulo.
Dezembro 13, 2011 at 12:15 pm
#0
Estou em sintonia contigo quanto aos número de EVT.
http://www.arlindovsky.net/2011/12/reducao-de-evt-entre-50-a-625/
Dezembro 13, 2011 at 12:20 pm
Se aumentam carga horária de certas disciplinas podem talvez reconverter professores do quadro de áreas afins.
Acho mal que se misture a definição de um currículo com questões laborais.
Tenho pena que não seja dada às escolas maior latitude na definição do currículo. Que se definam metas a nível nacional parece-me adequado. Mas o currículo é apenas um instrumento e deveria ser dada maior liberdade na sua formulação a nível local.
Dezembro 13, 2011 at 12:25 pm
Navegação à vista, o que o MECratino continua a fazer.
Uma mini-reforma curricular por ano, nem que seja ridícula como a deste ano, que inventou a Formação Cívica no 10º, para agora desaparecer em todo o o currículo. Mas atenção que é “mantendo a relevância dos seus conteúdos de modo transversal”. Não há dinheiro para os ovos, mas a omeleta continua a fazer parte do menu…
Dezembro 13, 2011 at 12:29 pm
#4
Liberdade para definirem o currículo significa o quê, na maioria das escolas? Permitir que os lobbys mais organizados ou mais bem representados nos órgãos de gestão reforce os tempos lectivos da sua área disciplinar…
Dezembro 13, 2011 at 12:34 pm
Registe-se ainda que o modelo curricular de base continua a ser o das aulas de 90 minutos, uma originalidade eduquesa, benaventesa e portuguesa, concerteza. O partido das reformas (mais das deles dos que das outras) aí não mexe…
Dezembro 13, 2011 at 12:34 pm
Aqui, como noutros noutros locais, encontro com frequência reflexos milenares dos 3 paradigmas que o Império Romano legou:
a) uma sociedade clientelar;
b) uma mentalidade centralista;
c) a preferência pela sujeição em vez da negociação; de preferência recorrendo a todas as manhas e traições para vencer os adversários.
Dezembro 13, 2011 at 12:45 pm
#8
Reflexão interessante, mas não sei se aqui é preciso ir tão longe.
Só gostava de perceber o que é que se ganharia em colocar centenas de escolas pelo país a discutir se hão-de dar mais horas a isto ou àquilo. Aliás essa experiência já existia em parte no modelo actual e mantém-se em relação às áreas disciplinares. Na maior parte dos casos que conheço as decisões foram tomadas por um de três critérios:
– O professor A consegue convencer os órgãos de gestão da importância da sua disciplina, que sai reforçada;
– Divide-se igualmente o tempo, para evitar chatices e discussões;
– Dá-se mais horas a disciplina X, porque o professor é da casa e tem falta de horas…
Dezembro 13, 2011 at 1:03 pm
Quando era miúdo fui mordido por um cão. Continuo a adorar animais e geral e cães em articular. Quando há casos de saúde pública, segurança ou maus tratos que envolvam cães, como vítimas ou agressores, chamo as autoridades. Se as autoridades não actuam, apelo para quem as devia fazer actuar.
Dezembro 13, 2011 at 1:04 pm
em geral
particular
Dezembro 13, 2011 at 1:09 pm
Duas frases tiradas do comentário do Colon
“Se aumentam carga horária de certas disciplinas podem talvez reconverter professores do quadro de áreas afins.
a) uma sociedade clientelar;”
É só procurar a relação nas entrelinhas.
Aliás, eu volto aqui a re-dizer o que digo desde o 1º dia que coloquei os pés no ensino(e foi numa escolinha de manfios na margem sud all those 584 moons ago):
desde que o horário de trabalho de um professor e o seu respectivo vencimento esteja consignado apenas ao número de horas lectivas, haverá sempre inveja, clientelas, lobbis, teias de poder para dar a uns e tirar a outros e vice-versa(o milagre da divisão inteira) e, o mais importante, a tentação para diminuir custos por essa via.
Mas, apesar da estranheza desta “reengenharia” no 2º Ciclo(onde ainda havia alguns aneis para remover) e da insuportável depilação no secundário, o 3º Ciclo é onde a lógica imperou. E falo da lógica de futuro para este país. Mas sobre isso…reservo a dissertação para quanto tiver mais tempo.
Salut.
Dezembro 13, 2011 at 2:18 pm
Propostas para debate…
– aulas de 60 mim?
– os dt terão redução da componente letiva, mesmo sem FC?
– EMRC ou outra ser opção paga pelas respetivas igrejas?
Dezembro 13, 2011 at 2:29 pm
A sensação que fica, depois deste anúncio de “reforma por vir”, é a de que aquilo que é o fundamental, que define a qualidade do ensino e das aprendizagens como vector essencial de um Projecto Educativo Nacional, e que deve ser entendido como um investimento vital para o país, ficou adiado, indefinidamente adiado; e que também, no fundo, isso nunca esteve verdadeiramente no centro das preocupações do ME, que foi obrigado a agir apenas pela pressão do necessitarismo económico, seja pelo lado dos cortes orçamentais assumidos, seja pelos objectivos utilitaristas do ensino que se propôs.
A questão primeira, fulcral, será sempre esta: a Educação deve, ou não, ser uma aposta estratégica prioritária para o desenvolvimento sustentado do país?
A resposta a ela prende-se com dois aspectos absolutamente incontornáveis e estruturalmente conexos, a saber: quais os modelos de cidadão e de desenvolvimento que queremos para o país?
Dezembro 13, 2011 at 2:49 pm
Na “mouche”, Farpas..
Dezembro 13, 2011 at 2:56 pm
Aberração é a sua tia, diria o outro.
Mas agora a sério… e fundia-se com o 1º e tínhamos seis aninhos de coiso e tal?
Dezembro 13, 2011 at 3:16 pm
Só sou eu a ficar perplexa com a continuidade de 2 blocos de Educação Física no 12º ano e o acabar com a 2ª opção nas específicas?
Dezembro 13, 2011 at 3:29 pm
Eu também fico admirada. Com a austeridade aí em força, as criancinhas já não vão ficar obesas. Aliás se calhar nem vão é ter força para a Ed. Física. O melhor era ficarem quietinhas para não gastar energia. Lol.
Será o lobby da ed. fis a funcionar?
Dezembro 13, 2011 at 4:33 pm
Ainda bem que não há paixão nesta “diz que é uma espécie” de reforma. As outras, muito apaixonadas, deu no que deu e foi como se viu. E se vê. (Há aqui uma sintaxe esquisita, mas fica assim).
Dezembro 13, 2011 at 4:46 pm
Tudo calminho, tudo a ir ao sítio, tudo bem comportadinho, como os meninos perante um stôr.
É bonito, é bonito ver uma aula assim.
Quem a imaginaria há um meses atrás…
Fiquem bem, adoro stôres bem comportados.
Dezembro 13, 2011 at 5:04 pm
[…] blogosférico, sendo de destacar, mais uma vez, vários textos do Paulo Guinote, com realce para este, e outro do […]
Dezembro 13, 2011 at 5:12 pm
Ontem, a secretária de estado deu a cara num dos canais. Perante a insistência da jornalista relativamente à autonomia das escolas para gerir parte do desenho curricular, ela retorquiu com o PE.
Eu gostava de saber se ela ingenuamente acredita nisso ou se visam a conflitualidade nas escolas decorrente do que sempre acontece, seja qual for a opção resultante dos critérios enunciados pelo António Duarte:
– O professor A consegue convencer os órgãos de gestão da importância da sua disciplina, que sai reforçada;
– Divide-se igualmente o tempo, para evitar chatices e discussões;
– Dá-se mais horas a disciplina X, porque o professor é da casa e tem falta de horas…
(No caso da História e da Geografia, no 7.º ano, vai ser lindo observar a luta pelos 45m…)
Dezembro 13, 2011 at 6:15 pm
#16
Aberração sim, e fundia-se com o 3º ciclo passando a haver continuidade entre eles e sem duplicação de conteudos.
O PG defende a manutenção do 2º ciclo ? Principalmente nos moldes em que está/estará estruturado?
Pela leitura dos seus post pareceu-me que era contra a existência do 2º ciclo e que este devia ser fundido com o 3º ciclo dando origem a um ciclo de 5 anos.
Dezembro 13, 2011 at 6:27 pm
#23,
Estamos, então, de acordo.
😀