Caro Paulo,
Tomei a liberdade de lhe enviar a Moção da Escola Secundária João de Araújo Correia, do Peso da Régua, assinada por 100 professores, num universo de 120. Os subscritores decidiram suspender a participação em qualquer actividade relacionada com este modelo de avaliação

Cumprimentos

A.Marcos Tavares
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Reunião Geral de Professores 24-11-2008

AVALIAÇÃO DO DESEMPENHO DOCENTE

Moção

As medidas simplificadoras introduzidas ao modelo de avaliação definido pelo Decreto Regulamentar nº 2/2008, de 10 de Janeiro, revelam que, de facto, o modelo nem é útil para o País nem traz consigo a excelência, como sempre foi pretendido. Este modelo não serve nem o País, nem os professores nem os alunos, porque tem na sua base um princípio desde há muito criticado por grandes vultos das ciências da educação: o princípio behaviorista de que tudo é mensurável. Talvez tenha sido desta ânsia de tudo querer medir que surgiu a complexidade de grelhas e a multiplicação de itens.

Não se ultrapassa o problema da quantificação e da mensurabilidade com as propostas agora apresentadas pelo Governo, nomeadamente quando se fala de objectivos processuais. O único caminho para se chegar a um modelo avaliativo consensual e dignificante é a total revogação do presente e a construção de um novo, fundamentado no diálogo entre a tutela e os professores.

Neste enquadramento, os professores da Escola Secundária Dr. João de Araújo Correia, Peso da Régua, reunidos em 24 de Novembro de 2008, consideraram o seguinte:

  1. O exercício da profissão docente é demasiado plural e complexo para poder ser aferido na base de indicadores uniformizados, assentes em critérios subjectivos que decorrem de ideologias pedagógicas contestadas e de modelos que estão longe de suscitar consenso junto da comunidade científica. Os bens que as escolas produzem não são mensuráveis nem quantificáveis e, por isso, a avaliação de desempenho não deve seguir matrizes de tipo mercantilista nem servir estratégias de mercadorização da educação;
  2. O presente modelo de avaliação do desempenho docente continua a privilegiar a modalidade sumativa da avaliação e não a formativa, como seria desejável por ser esta a modalidade que interfere positivamente no alcançar do seu objectivo último: o desenvolvimento da qualidade das aprendizagens e da prática docente;
  3. O sistema de avaliação de desempenho docente não respeita o princípio da diferenciação científica e didáctica do avaliador. Uma vez que o concurso para professor titular não se baseou na avaliação da qualidade científica e didáctica de todas as funções relevantes da actividade docente, a divisão entre professores titulares e professores não tem justificação sólida. Por consequência, a referida divisão não estabelece qualquer diferença de mérito. É, por isso, arbitrária e artificial;
  4. O sistema de avaliação de desempenho docente não respeita o princípio sensato e óbvio de que o mérito não se define a priori, antes se determina a posteriori, recorrendo à análise dos dados relevantes da actividade docente. Estabelecendo à partida quotas para as classificações mais elevadas, o sistema de avaliação do desempenho subverte o princípio referido;
  5. Naquilo que é essencial, o modelo que agora o Ministério pretende rever continua a carecer de profundas alterações, relativamente às preocupações manifestadas na anterior moção;
  6. Verifica-se, assim, que o modelo de avaliação que se pretende impor:

● não assegura a devida correcção de instrumentos de registo que se tinham revelado mal concebidos, ou seja, elaborados à revelia das metodologias técnicas e científicas consensualmente aceites; estes instrumentos não se encontram devidamente testados, nada se sabendo, portanto, sobre a sua fiabilidade, validade, objectividade e exequibilidade, requisitos elementares na garantia do controlo e consistência dos dados que se irão registar;

● não é exequível em tempo útil e cria obstáculos ao normal funcionamento das actividades lectivas, porque implica, pelo menos, a redistribuição de avaliadores e avaliados, a revisão de fichas e a alteração de horários dos professores;

● centra o trabalho do professor na sua própria avaliação e não na formação do aluno;

● continua a separar os professores, gerando clivagens preocupantes, até pelas tremendas injustiças e arbitrariedades verificadas nos critérios adoptados para o concurso de professor titular;

● em suma, fomenta um clima de mal estar nas escolas, traduzido na desconfiança, na desmotivação, na frustração e na tristeza entre os professores.

Nesta base, os professores subscritores deste documento decidem suspender a sua participação em qualquer actividade relacionada com esta avaliação de desempenho, inclusive na mais recente informação do Ministério da Educação (entrega dos Objectivos Individuais via aplicação electrónica), até que este modelo de avaliação seja substituído por um outro que seja credível, coerente e justo e que contribua, de um modo efectivo, para a consecução do objectivo primeiro da Escola Pública: a qualidade do Ensino.

Peso da Régua, Escola Dr. João de Araújo Correia,

24 de Novembro de 2008