Depoimento com o tema “A Língua: Património ou Negócio?” enviado para a Assembleia da República, enquanto uma das entidades ou pessoas a ser ouvidas pela Comissão de Educação sobre a petição 259/XII/2.
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À Assembleia da República
A/c
Exmº Sr Deputado José Ribeiro e Castro,
Presidente da Comissão de Educação, Ciência e Cultura
28 de Junho de 2013
Assunto: Informação sobre a Petição nº 259/XII/2
Na sequência do pedido expresso no vosso ofício nº 263/8ª – CECC/2012, através do qual me é solicitado que me pronuncie sobre a petição acima mencionada, Pela desvinculação de Portugal ao “Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa” de 1990, cumpre-me prestar o curto depoimento que se segue subordinado ao tema A Língua como Património ou como Negócio?
- Considero como de interesse nacional patriótico a iniciativa dos autores da petição em causa por pretenderem defender, por todos os meios legítimos ao seu alcance, um dos elementos mais fundamentais do património cultural português, que é a sua língua tal como ela é falada, ouvida e escrita entre nós, após um processo de evolução histórica que a modelou, enriqueceu e tornou plural.
- Considero que o AO90 é um atentado ao património linguístico português por se constituir como um instrumento de formatação imposta do exterior, no sentido do empobrecimento desse património, amputando-o e apresentando soluções uniformizadoras artificiais a algo que está em permanente evolução, dentro e fora do espaço português.
- Considero muito grave que parte dos argumentos que sustentam o interesse político na implementação obrigatória do AO90 sejam de natureza comercial, apresentando a língua como uma mercadoria similar a qualquer outra transaccionável, em que a lógica da massificação e da reprodução quantitativa aos mais baixos custos substitui o respeito pela especificidade de um bem cultural que é intangível na sua essência e especificidade. Ler Gil Vicente, Camões, Vieira, Sá de Miranda, Garcia de Orta, Eça ou Garrett em versões assépticas para consumo generalista é um atentado à cultura nacional e um péssimo serviço prestado às novas e futuras gerações de portugueses.
- É evidente que a língua, falada ou escrita, evolui, transforma-se e precisa de referenciais que funcionem como um padrão. Mas esse padrão não deve, nem pode, ser imposto de forma autoritária, com base em posições de facção, atentatórias da liberdade cultural, nem pode confundir-se com fórmulas únicas que reduzem a diversidade linguística e cultural de um modo anti-democrático.
- O processo de definição, difusão e imposição do AO90 é a antítese de uma defesa consistente da língua como um elemento específico e diferenciador da cultura portuguesa num mundo globalizado, em que cada vez mais as diferenças são esmagadas por uma lógica de homogeneização, apresentada como facilitadora da comunicação, mas que na verdade se limita a obedecer aos critérios comerciais do menor custo.
- A língua deve ser tratada como um património a valorizar no que tem de particular, sendo o seu valor tanto mais alto quanto seja capacidade para atrair pela sua singularidade. O Português não pode ser tratado como uma mercadoria para consumo fácil, imediato e de baixo valor, mas como um bem cultural que se destaque pelo que tem de específico em cada um dos espaços em que é falado e escrito. Em nenhum momento se espera que, à moda do Estado Novo, se derrubem e refaçam obras do património arquitectónico português para que correspondam a uma matriz única e adequada a um imaginário considerado ideal e mais facilmente identificável e consumível pelas massas. O que o AO90 pretende acaba por ser algo assim: transformar o Português numa língua refeita, sem arestas, própria para um mundo sem espaço para o que é único. O valor global do Português depende da sua capacidade de se afirmar como único na sua riqueza plural transcontinental e não de uma opção pela sua redução a um produto indiferenciado de marca branca.
- Por tudo isto, que alinhavei sem recurso a citações ou fundamentações documentais que acrescentariam em erudição exibida o que poderiam fazer perder em concisão e clareza, considero que a aceitação das propostas feitas na petição nº 259/XII/2 é um imperativo patriótico na defesa do património cultural e linguístico nacional e um acto inadiável de defesa do que nos vai restando em matéria de soberania e identidade nacional.
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Quinta do Anjo, 28 de Junho de 2013
Paulo Jorge Alves Guinote
Professor do Ensino Básico
Licenciado em História e Doutorado em História da Educação
Criador do blogue A Educação do meu Umbigo
Junho 30, 2013 at 9:19 pm
Os meus aplausos!
Junho 30, 2013 at 9:27 pm
Muito bom!
Junho 30, 2013 at 9:29 pm
#2,
A sério?
😳
Junho 30, 2013 at 9:35 pm
#3
😆
Junho 30, 2013 at 9:39 pm
Muito Bom!
Junho 30, 2013 at 9:42 pm
Muito bom, Paulo!
Parabéns!
Junho 30, 2013 at 9:47 pm
Sobre este assunto, que tanto preocupa alguns professores, em especial os de Português, por esta nova grafia vir a ser exigida já nos exames do próximo ano, tenho a levantar apenas uma questão:
Só é possível travar este hediondo A.O. nas escolas, se os professores do 1º ciclo o não aplicarem quando ensinam as crianças a escrever. Caso contrário, se os alunos chegarem ao 2º ciclo, a escrever segundo a nova grafia, os profs dos restantes ciclos já pouco podem fazer…
Junho 30, 2013 at 9:50 pm
‘curto depoimento’?!
Junho 30, 2013 at 9:51 pm
Muito bem! Levo para o meu muro 😉
Junho 30, 2013 at 9:52 pm
Ponto 3: Toma!
Junho 30, 2013 at 9:53 pm
Ponto 6: Embrulha!
Junho 30, 2013 at 9:54 pm
Ponto 7: Não podias ter terminado de forma melhor.
Junho 30, 2013 at 9:54 pm
13
Junho 30, 2013 at 9:55 pm
Desculpem, é mesmo superior às minhas forças.
Junho 30, 2013 at 9:58 pm
15 bem melhor do que treze…sendo que o 15 é cabalístico e o treze azarento…
Junho 30, 2013 at 10:01 pm
Como é que vocês, caros comentadores do Umbigo, chegam a um domingo à noite, ouvem o Marcelo e não ficam a disparatar, conseguem, mesmo assim, falar a sério?!
É extraordinário!
Junho 30, 2013 at 10:01 pm
muito bom!
vou espalhar. 🙂
Junho 30, 2013 at 10:03 pm
A mim, o calor tolhe-me as ideias, fico com as sinapses encavalitadas, por via da dilatação e …não digo uma p’á caixa.
Junho 30, 2013 at 10:04 pm
Bem, na verdade acontece-me o mesmo no inverno… (Ai, desculpem: Inverno…lol!)
Junho 30, 2013 at 10:04 pm
Subscrevo inteiramente!
Junho 30, 2013 at 10:05 pm
E na Primavera, outro tanto.
Olha, dei-me agora conta que o 13 já passou…
Junho 30, 2013 at 10:06 pm
19, caneta
espera pelo próximo domingo 40º
Junho 30, 2013 at 10:29 pm
Muito Bom.
Junho 30, 2013 at 10:34 pm
Brilhante!
Junho 30, 2013 at 10:39 pm
Bem haja, Paulo.
Junho 30, 2013 at 10:46 pm
Muito, muito bem!
Subscrevo.
Junho 30, 2013 at 11:02 pm
Reblogged this on ergo res sunt and commented:
Pelo seu elevado interesse republico aqui este texto de A educação do meu Umbigo.
Junho 30, 2013 at 11:19 pm
Muito bem!
CLAP! CLAP! CLAP!
A ver se somos ouvidos…
Foi das maiores cretinices dos últimos anos, este AO…
Junho 30, 2013 at 11:20 pm
Junho 30, 2013 at 11:21 pm
Caro Paulo Guinote,
Sem querer entrar em polémicas ou discussões, e tendo em conta o rigor que imprime nas suas opiniões e pontos de vista, parece-me que entrou num campo onde acaba por exprimir todo o seu lado romântico de ligação afetiva com o seu código linguístico e acaba por confundir língua com ortografia, fazendo valer a sua opinião em bases nada científicas ou, pelo menos, com algum conhecimento daquilo que se fala. Não confundamos os campos, tal como muitos confundem as estatísticas. Creio pertencermos a outro campeonato.
Junho 30, 2013 at 11:22 pm
Excelente!
Junho 30, 2013 at 11:28 pm
#7 Mas as diretrizes do MEC são para ensinar de acordo com o A.O. Como podemos contrariar isso no 1ºciclo? É uma dor de alma ver as palavras escritas daquela forma e por mim!
Junho 30, 2013 at 11:29 pm
Há muita gente que garante que não há nenhum normativo que possa impor a adopção do AO 90. O certo é que ninguém se chega à frente e o “bicho” vai fazendo o seu natural caminho. Nos outros países envolvidos acho que se estão nas tintas para o assunto, mas por cá fomos todos a correr. Daqui por 5/10 anos a situação torna-se irreversível e, como sempre, os comerciantes da língua ganharam.
Junho 30, 2013 at 11:33 pm
#30,
Não sei a que campeonato pertence; no meu caso não passo dos regionais e confesso que devo confundir tudo quando me recuso a considerar científico grafar “Egito” e “egípcio”.
É verdade, não sou linguista.
Não serei do seu campeonato, certamente da Liga dos campeões…
MAs sim… sou romântico na relação com a minha língua e repugnam-me os modernistas muito modernaços.
E podem-me dizer que já houve outyos acordos. Não será por acaso que o anterior foi no período áureo da ditadura salazarista.
Junho 30, 2013 at 11:42 pm
O grande revés para os defensores nativos do AO vai chegar quando tiverem conhecimento de que os nossos irmão brasileiros trataram da sua vidinha sozinhos.
Junho 30, 2013 at 11:50 pm
Ainda resta a esperança de que isto não vá avante! Na escola, lá tenho que escrever com o novo AO em actas e outros documentos…mas nos sumários não o faço. Até os meus alunos riem…só os colegas professores ficam abismados com … o meu não cumprimento de regras 🙂
Julho 1, 2013 at 12:00 am
#33
foi isso mesmo, 25sempre25…
Mas mesmo a maioria dos que chama comerciantes da língua, como os lvreiros, se bateram muito tempo contra o Ao. Tiveram de deita fora muita da sua produção.
A imposição do AO90, já esquecido nos últimos anos, foi essencialmente política! Com os tiques de Sócrates de querer agradar aos amigos do exterior. A decisão aibda foi apenas do Parlamento, que está longe de estar recheado de especialistas… tantas outras recomendações do parlamento que foram ignoradas, sem esta imposição… Mas há os medos, a regra do obediente portuga… mas só para este tipo de tretas… enfim… 😦
E estes actuais desgovernantes, mais uma vez, não desfizeram mais esta trapalhada que os socretinos ressuscitaram!
Provam que são feito da mesma massa podre,,,
Julho 1, 2013 at 12:03 am
#36
idem! eheh… EWu respondo aos alunos que, às tantas, já sou muito “antiga”,nascida no outro século… mereço o desconto! 😛
Mas mesmo nas ACtas… há alguns truques! 😉
Julho 1, 2013 at 12:04 am
digo, “Eu”
(que se passa? Eu tinha escrito bem, mas o Wpress está lento…)
Julho 1, 2013 at 12:11 am
Há 3 grandes bandidos, repito BANDIDOS, responsáveis pela imposição do Aborto Ortográfico: Malaca Casteleiro, Cavaco Silva e José Sócrates.
Para o caso de algum dos 3 querer proceder judicialmente contra mim, o que seria uma enormíssima honra, aqui fica o meu nome que é do conhecimento do proprietário do blogue.
Mário Rui Simões Rodrigues
Licenciado em História (FLUC)
Licenciado em Direito (FDUC)
Julho 1, 2013 at 12:31 am
Mais minúscula, menos hífen é irrelevante. O Principal erro – aliás, O erro – do AO 90 é subordinar a grafia à fonia. Por duas razões: 1) a grafia é o suporte consistente da língua, o elemento que mantém a sua génese e identidade, tudo o resto e fugaz; 2) tome-se a fonia como referência e aceitem-se obrigatoriamente dezenas de grafias válidas – passe a escrever-se “Pakstão” em vez de “Paquistão”, “amô” ou “amori” em vez de “amor”, “Brasiu” em vez de “Brasil”, “dzer” em vez de “dizer”, “tesôra” em vez de “tesoura”, “riu” em vez de “rio”, etc, etc.
Julho 1, 2013 at 12:32 am
Excelentemente bem refutado!!
Julho 1, 2013 at 12:37 am
Resumir a língua a sons é uma estreiteza de espírito que impôs a valorização da oralidade sobre a escrita. A imposição do AO, sem debate sério e científico é uma demonstração de extrema falta de respeito pela vontade dos portugueses. Jornal a Bola “Ronaldo para Portugal” (Vem para Portugal ou Portugal parou para o ver jogar????) Outra parangona num jornal “Controlamos o défice” (Está no presente ou no passado?????) E outra pérolas
Julho 1, 2013 at 12:42 am
De resto, as principais diferenças entre o português e o brasileiro (!) são sintácticas, não gráficas. Querem uniformizar? Comecem por aí (de preferência, mandando uma gramáticas para o Atlântico Sul)
Julho 1, 2013 at 12:44 am
Excelente.
Julho 1, 2013 at 12:56 am
Os brasileiros têm uma oralidade muito vocálica. E isso, se é uma vantagem (o português, por exemplo no cinema, parece russo), é também um handicap horrível: um brasileiro não consegue pronunciar duas consoantes seguidas. Neste caso, tem duas alternativas: ou coloca vogais onde elas não existem (“obistáculo”, “pissicologia”, “pissiquiatria”; uma “acta” seria sempre uma “áquita”) ou então suprime a consoante que o estorva. A opção tem sido a segunda – para desgraça da língua. Quanto mais o português se afasta do latim (graficamente, no caso), mais ambíguo e pobre fica (bendito castelhano!)
Julho 1, 2013 at 12:56 am
Subscrevo na íntegra!
Um grande agradecimento ao Paulo que mais uma vez dá voz a muitas outras vozes!
A Língua é a identidade de um povo, é o património de uma nação, é o referencial de um território, é um garante de coesão nacional… falamos, escrevemos, sentimos e pensamos com ela.
Julho 1, 2013 at 1:03 am
😀 Muito muito bom!
Julho 1, 2013 at 1:07 am
Totalmente de acordo, ou melhor, também em desacordo, com esta desgraça que é o AO90!!!!!
Parabéns pelo brilhante texto. Como sempre.
Julho 1, 2013 at 1:08 am
É bom saber que tantos continuam a resistir. Mas resistir não é só não concordar, É NÃO APLICAR. Cada vez somos mais:
http://www.facebook.com/groups/178207905663865/
Julho 1, 2013 at 1:09 am
E aqui só se publica o que é escrito em Português:
http://portuguesdefacto.wordpress.com/
Julho 1, 2013 at 1:11 am
Julho 1, 2013 at 1:15 am
Tanto quanto sei o AO90, para estar em vigor, teria que ser subscrito por um nº mínimo de países, e acho que isso ainda não aconteceu. Alguém sabe pormenores?
Julho 1, 2013 at 1:18 am
“Deixem a Língua Portuguesa em paz!”
Julho 1, 2013 at 1:34 am
Convenhamos que argumentou bem, mas penso que um bom conserto no AO já seria suficiente…
Julho 1, 2013 at 1:43 am
O meu apaluso, caro Guinote. É isso mesmo… e mais ainda.
E, como se não bastasse, uma belíssima “ripa na rapaqueca” ao Francisquinho #30 que confunde língua com Língua e ortografia com porcaria.
Nota: Já foi direitinho para o facebook, que espalha as novas mais depressa. 😉
Julho 1, 2013 at 1:51 am
#55
Género sindicatos?
Julho 1, 2013 at 2:18 am
Há atrasado, escreveríamos Phaphe.
Julho 1, 2013 at 2:59 am
“A Língua é a identidade de um povo, é o património de uma nação, é o referencial de um território, é um garante de coesão nacional… falamos, escrevemos, sentimos e pensamos com ela.”
Admitindo que sim, para quando traduções para tantos estrangeirismos resultantes dos avanços tecnológicos, da informática e da globalização? – feedback, software, hardware, bookcrossing, outsourcing, empowerment, shopping, outdoor, bildboard, self service, take away, catering, stress, lobby, iceberg, meeting, jet lag, like, dislike, post, blog, BRIEFING (a partir de hoje, com Maduro e Pedro Lomba, em OFF), off, on, marketing, etc, etc, desde que não traduzam o “it’s a piece of cake!” por “é 1 fatia de bolo!”
E se a Língua for mais do que uma identidade, um património, um referencial e um garante de coesão nacional?
(não consigo escrever segundo o AO. faz-me uma confusão desgraçada e penso que não tem muita razão para existir)
Julho 1, 2013 at 3:14 am
Nunca gostei muito da máxima “A minha Pátria é a Língua Portuguesa”. Quando muito entendo-a inserida no tempo em que foi proferida por Fernando Pessoa.
Gosto bastante mais do que diz Mia Couto:
“As línguas ou a língua têm/tem valor dependendo da forma como nos tornamos disponíveis, enquanto pessoas ou enquanto colectividades a viajar pela cultura dos outros”.
Julho 1, 2013 at 3:15 am
“Venho brincar aqui no Português, a língua. Não aquela que outros embandeiram. Mas a língua nossa, essa que dá gosto a gente namorar e que nos faz a nós, moçambicanos, ficarmos mais Moçambique. Que outros pretendam cavalgar o assunto para fins de cadeira e poleiro pouco me acarreta.”
Julho 1, 2013 at 3:55 am
Por fim, e para algum contraditório…
Creio que a ideia referida em #30, sobre “língua” e “ortografia” tem o seu interesse. Porquê descartá-la à partida?
A questão não é entre o ser-se “modernaço” ou não, “modernista”, ou não. Posto o tema nos termos assim tão adjectivados,foge-se a um debate mais substantivo.
Julho 1, 2013 at 7:07 am
Julho 1, 2013 at 7:13 am
Scandale au Parlement Européen : Argent facile, champagne…
Julho 1, 2013 at 8:48 am
Parabéns. Concordo consigo.
Ensino a língua inglesa e os diferentes tipos de Inglês (British/ American/ Australian /African / Canadian English “sempre se entenderam”! Estes países não têm qualquer AO.
Julho 1, 2013 at 8:50 am
# 65 Correção: Ensino a língua inglesa. Os diferentes
Julho 1, 2013 at 9:48 am
Há alguns dias, numa das muitas hipóteses que temos de ouvir o Português do Brasil nas nossas televisões, apercebi-me que eles dizem “recepção” e nós, segundo este AO90 passaremos a escrever “receção” porque não lemos o p.
Julho 1, 2013 at 9:59 am
#67
Pois, é duplamente deprimente (até porque já temos “recessão” – da outra – que chegue). Deve ser horrível ir de férias, chegar ao hotel e ser recebido pela dita cuja…
Julho 1, 2013 at 10:20 am
#62,
Fiz o pedido educado para deixares em paz os meus comentários.
Não o repetirei.
Por isso, deixarei passar diversos outros que indirectamente visam o que disse, incluindo a que tem uma citação do Mia Couto, aparentemente usada sem perceber o seu conteúdo.
Repito uma regra muito simples: deixa-me em paz, ou voltas para de onde não devias ter saído.
Se é injusto?
Injusto é eu ter de aturar cada camone que aqui me entra armada ao pingarelho.
Julho 1, 2013 at 11:27 am
Apoio inteiramente, e agora que o único argumento que resta aos defensores do AO é o argumento da autoridade, estaria na altura de revogar este documento espatafúrdio ou, pelo menos, suspender a sua aplicação e suscitar um debate aberto sobre a matéria, sem estar condicionado à partida por um acordo nada consensual.
É esperar demais dos nossos deputados, eu sei.
Há muito tempo que digo que somos pouco exigentes com os nossos representantes parlamentares e isso vê-se principalmente nestes momentos em que é preciso discernimento e capacidade de ver ao longe…
Julho 1, 2013 at 12:47 pm
Subscrevo. Bom texto do Paulo Guinote. Nas minhas aulas continuo a escrever como sempre escrevi. Vou continuar a resistir.
Julho 1, 2013 at 1:09 pm
Concordo e continuo a escrever como sempre escrevi, apesar de algumas observações e críticas.
A minha dúvida é se posso continuar a fazê-lo, em testes, por exemplo.
Julho 1, 2013 at 2:06 pm
Desta vez não concordo consigo. Não defendo o A.O. e desprezo a sua génese, que também considero política e económica. Costumo dizer que o A.O. é uma “desnessidade” com muitas fragilidades. Porém, embirro com quase todos os argumentos anti-A.O.Nomeadamente, a facilidade com que essa argumentação deixa transparecer um certo paternalismo, para não dizer uma certa amargura de país colonizador. Mas disto não acuso o seu texto.
Mas o seu argumento de que “Ler Gil Vicente, Camões, Vieira, Sá de Miranda, Garcia de Orta, Eça ou Garrett em versões assépticas para consumo generalista é um atentado à cultura nacional e um péssimo serviço prestado às novas e futuras gerações de portugueses.” também não colhe. Defende que os devemos ler, e dar a ler, nas suas grafias originais?
Entendemos menos Fernando Pessoa, a(s) sua(s) filosofias e os abismos da sua alma, porque se perdeu o y e o ph?
Julho 1, 2013 at 2:52 pm
#73,
Fernando Pessoa não perdeu o y. teixeira de Pascoaes é que se lametou da perda de tal profundidade.
Há uma diferença entre a grafia original, a sua transição para uma versão que a respeita e a sua modernização total em edicções escolares como agora se encontram por aí.
No limite, se temos edições bilingues de certas obras, porque não a edição que respeita a grafia original o mais possível e um anexo com modernização?
É verdade que quando transcrevo um documento antigo, medieval ou moderno, opto por manter a grafia o mais próxima do original, ao contrário dos modernizadores, que optam por torná-la mais facilmente digerível.
Mas… o estudo escolar dos autores de então tem muito a ganhar com o conhecimento directo do que escreveram e não da tradução do que escreveram.
Julho 1, 2013 at 3:28 pm
Decididamente, o AO está longe de ser uma questão pacífica.
Tenho constatado que entre as razões apontadas por muitos dos seus detratores, algumas são de natureza puramente emocional ou afetiva (veja-se os sentidos que se evolam da expressão «língua materna»…) e outras, até, parecem radicar numa espécie de valorização da dimensão plástica (gráfica) das palavras, a ponto de «troçarem» das novas grafias como ata, direto, etc., em vez de acta, directo (ouço: «é estranha» ou «fica feio!»)…
Concordo, por isso, com o comentário tecido em #30: uma língua, há que reconhecê-lo, é muito mais que a sua ortografia (antes da reforma Gonçalves Viana, de 1911: «orthographia»!).
Pretendo com isto dizer o seguinte: pese embora haja alguns aspetos da nova norma ortográfica (porque é disto que se trata, uma nova norma ortográfica, com um reduzido nº de alterações gráficas; não se «mexeu» na língua! O conceito de língua é muito mais complexo e rico do que aqui cabe dizer-se) sobre os quais eu também tenho algumas reservas (designadamente na questão da hifenização e da acentuação nas formas verbais do pretérito perfeito em que, para mim, o acento tem um valor distintivo importantíssimo), na generalidade não me choca, não o considero aberrante e entendo, até, que mais não faz que seguir a dinâmica das línguas que são «organismos vivos», feitas pelos seus falantes.
Se é verdade que a maior parte das línguas se realiza numa dupla dimensão – a falada e a escrita -, recordo que todas começaram por ser orais, havendo, ainda, povos que não dispõem de um sistema gráfico (ou de uma «escrita») na sua comunicação. Ora, não podemos esquecer que, historicamente, a língua portuguesa (ao contrário da francesa que é predominantemente etimológica) sempre privilegiou a vertente fonética (donde a oscilação da grafia na Idade Média e os problemas que tal acarretava em matéria de fixação de texto) em detrimento da etimologia.
A verdade também é esta: no fundo, estamos todos muito apegados ao modo como aprendemos a escrever (somos seres de hábitos, de rotinas) e expressamos relutância em mudar esses hábitos, essa grafia. Todavia, se pensarmos numa criança que vá pela primeira vez para a escola (nós já estamos muito distanciados disso…), que sempre ouviu e aprendeu a pronunciar «ótimo», por exemplo, e que, de repente, é ensinada a escrever «óptimo», grafando uma oclusiva que não é pronunciada e desconhecendo (nem sendo esse o caso, obviamente) que tal se devia ao étimo latino «optimum», perguntamos: qual é a lógica? E poderíamos desmultiplicar os exemplos.
Quero só chamar a atenção para o seguinte: temos tendência para sermos muito conservadores em relação ao AO e parece que ignoramos os riscos que decorrem destes «novos códigos» que os nossos jovens (e eu incluída, que também já aprendi a usar 🙂 ) começam a usar e a abusar nos textos produzidos na escola…
Só uma curiosidade: o próprio Eça de Queirós reconheceu algumas vezes. em textos seus, a dificuldade que tinha em escrever a palavra retórica; nunca sabia onde colocar o «h»: ora escrevia «rethorica», ora escrevia «rhetorica» e não seria, certamente, por aí, que os seus contemporâneos não saberiam «ler» a palavra.
Quero ainda corrigir a colega que citou a frase de Fernando Pesoa/Bernardo Soares: «Minha pátria é a língua portuguesa.» (sem o determinante!), mas isso levava-nos para outras matérias… Quinto Império! Império espiritual, de união e fraternidade entre os povos, alicerçado na língua portuguesa…
Outro pormenor de somenos importância: custa-me ver/ouvir colegas falar em «brasileiro», quando, curiosamente, sempre ouvi os brasileiros a referir-se à língua que falam, dizendo «o português».
Já agora, partilho convosco a belíssima definição de língua de Vergílio Ferreira, proferida num discurso em Bruxelas, aquando da entrega do prémio Europália.
«Uma língua é o lugar donde se vê o mundo e onde se traçam os limites do nosso pensar e sentir. Da minha língua vê-se o mar.»
PS: peço desculpa se me alonguei.
Julho 1, 2013 at 4:25 pm
É notório que a atuação dos sindicatos o desconcertam, mas de momento,
that’s not my problem.
Julho 1, 2013 at 5:22 pm
#75
1) Por certo que uma língua é mais do que a sua grafia. No caso do português, porém, é, sobretudo, a sua grafia! No português, a fonia, de tão variável e fugaz, não pode suportar qualquer norma. De resto, com a nova grafia – particularmente, com a supressão das consoantes “mudas” – teremos daqui a uma geração uma oralidade completamente diferente (problema que não se coloca no “brasileiro”, porquanto o mesmo não é “vogalofágico”): em Portugal, “director”, por exemplo, passará a dizer-se “d’rtor”, tal como já se diz (mesmo que por outra razão), “pressor” em vez de “professor”).
2) Não se percebe por que razão se invoca como argumento pró AO90 a supressão das consoantes dobradas em 1911 (a mãe das maiores confusões e divergências). Que se ganhou com a “farmácia” em vez da “pharmacia”, com a “ciência” em vez da “sciencia”, com a filosofia em vez da “philosophia”, com a ortografia em vez da “ortographia”? Talvez apenas os “tipographos” tenham lucrado com a poupança de tinta, já que o “analphabetismo” não era tido nem achado na coisa, ao contrário do que pensava o republicanismo romântico, desatento dos contra-exemplos do inglês e do francês.
3) Uma língua não é só a sua grafia. Certo. Mas quanto mais o português se afasta do latim (também na grafia) mais equívoco, menos rigoroso, mais ambíguo se torna. Esse afastamento, também na sintaxe, é responsável por absurdos como crimes “económicos” (em vez de “na economia”), jornais “desportivos” “em vez de “de desporto”), empresas [EDP, por ex.] “eléctricas” (em vez de “de electricidade”), etc, etc. Os mais líricos e menos atentos acham que isso revela a “riqueza”, a “vida”, o “dinamismo” da língua, quanto se trata apenas de indisciplina (é a língua dos portugueses, pois…) e de falta de rigor – que o AO90 apenas potencia.
Julho 1, 2013 at 6:17 pm
#77
É um facto, como sabe o AO não «normaliza» a pronúncia.
Não consigo fazer futurologia, até porque isso contraria o que disse sobre a dinâmica das línguas, mas questiono a validade do seu argumento .
É verdade que já há muitos anos o prof. Hernani Cidade sustentava que o português europeu tinha tendência para se tornar «vocalófago». Mas eu pergunto-lhe: quando passámos a escrever «fmenino», em vez de «feminino»; «mnistru», em vez de «ministro»; «mninu», em vez de «menino»; «joalho», em vez de «joelho»; «vermalho», vez de «vermelho» e «coalho», em vez de coelho, (note-se que existe a palavra coalho»), «lete», em vez de «leite»; «figuêra», «laranjêra», «dezôito» (no Porto), em vez de «dezoito» e muitos, muitos mais exemplos que decorrem do mosaico linguístico português, no que diz respeito à sua pronúncia? ~
A Escola (a par de outras instituições) também veicula a chamada norma padrão a nível da pronúncia; cabe-nos a nós, professores, zelar para que a mesma seja devidamente divulgada (repetida) entre os nossos alunos. Já agora, como explica aos seus alunos a diferença de pronúncia entre «pregar» (a propósito do Sermão de Sto. Ant. aos Peixes, do Pe. Ant. Vieira) e «pregar» um prego? E poderia desmultiplicar esses exemplos das homógrafas….
O que diz em 2), suscita-me a seguinte questão: e a inversa não é também verdadeira, isto é, e o que se ganharia em manter farmácia escrita com «ph» se o sistema consonântico português apresenta um grafema para o fonema /f/; etc, etc.?
Quanto ao latim, que latim? Temos de rever as nossa aulas de História da Língua…
Lírica? Só de vez em quando; fundamentalista? Não sou seguramente. 🙂
Julho 1, 2013 at 7:05 pm
#78
Claro que o AO normalizará, de facto (!), a pronúncia – ainda que, admito, à revelia de quem o impôs. Sem “c”, “diretor”, no Brasil será sempre “dirétor” (melhor, “dirétô” – não se percebe por que se mantém o “r” final, posto que é mudo…); em Portugal não tardará a ser “dr’tor” (veja a facilidade com que os alunos assumiram – espero que com a oposição da “senhora doutora” – a normalidade de “s’tora”).
Longe de mim a ousadia de lhe pedir que relesse bem o que escrevi; mas creio que a sua objecção perde o que escrevi. Os exemplos que dá corroboram precisamente o meu argumento: é a ortografia que evita que a pronúncia, na sua adulteração, se torne norma. Ou seja, ainda bem que em todos os casos que sugere a grafia não seguiu a fonia (magno critério das luminárias do AO90 – ainda assim, desrespeitado pelos próprios…).
O que se ganharia com a “pharmacia”? Seguramente, não melhores medicamentos. Mas também não foi o seu desaparecimento que enriqueceu a língua ou (supremo equívoco) promoveu a alfabetização (pobres ingleses e franceses!; a que sacrifícios não se terão submetido para erradicar o analfabetismo mantendo as consoantes dobradas?!). Em todo o caso, justificar os AO alegando que sem os mesmos ainda escreveríamos farmácia com “ph” faz imaginar que, na linhagem homineana, ingleses e franceses talvez se situam algures entre o erectus e o neanthertalensis… Sim, temos o grafema “f” que pode substituir o “ph”. Mas então, leve o seu argumento até ao fim e proponha, por exemplo, o desaparecimento dos “s” e “x” de todas as palavras onde usurpa o fonema “z”.
Que latim? Quantos conhece? (Não confunda com os crioulos; mais antigos, mas crioulos 🙂
Julho 1, 2013 at 9:14 pm
#79
Insisto: não é o AO que «normaliza» a pronúncia; mas os chamados «agentes de instrução e de cultura» (a instituição escolar, as universidades, os escritores, os media…). Quando lhe dei o exemplo de «prégar» (grafei erradamente e de forma intencional, para marcar o e aberto) o Sermão aos peixes e «prêgar» (idem para a marcação do e fechado. Que falta faz o alfabeto fonético internacional! :)) um prego, foi justamente para ilustrar que, quando os alunos se confrontam com a palavra, leem-na sempre erradamente (como se se tratasse de pregar um prego 🙂 ), cabendo-nos a nós corrigir a pronúncia errada.
Quanto ao exemplo que me deu de «diretor», pronunciado por um brasileiro, o que lhe quero dizer é que não duvido que haja pessoas menos instruídas ou alfabetizadas que a escrevam de forma errada. Mas erros ortográficos são cometidos por portugueses, franceses, ingleses…. O que não acredito é que um brasileiro culto e instruído grafe a palavra [djirétô] ou mesmo o nome do seu país, reproduzindo, por exemplo, a pronúncia paulista: [Braziu].
Quanto à «Stôra», acredite não me choca nada, quando comparado com a forma de tratamento «Ó prof.» tão vulgarizada nos dias que correm 😦
Disse-lhe que o caso da língua francesa não é idêntico ao nosso. E repare, também aí se debatem com o mesmo fenómeno: a pronúncia [skidize] nem sempre corresponde à escrita e não é por isso que a língua, na sua vertente escrita, fica ameaçada pela pronúncia! Erros de ortografia e de sintaxe (por exemplo, a questão do acordo do particípio passado) : lá como cá 🙂
Quanto ao desfasamento entre o oral e o escrito (léxico -KS- luxo – CH-; ; exame -Z- etc…) é verdade existe, mas não vá por aí, pois são casos muito mas muito residuais e não vejo o conflito com as alterações introduzidas pela nova norma ortográfica.
Quanto ao latim, visava naturalmente, o chamado latim vulgar (sermo vulgaris, rusticus, plebeius); não o latim literário. Tenho a certeza que percebeu o que queria dizer 🙂
Julho 1, 2013 at 9:32 pm
#80
Cara Maria
1) Em nenhuma das suas dissertações (so to speak), para além duma amálgama de exemplos que, afinal, lhe são desfavoráveis, consegui encontrar uma (“umazinha” que fosse!) justificação do AO – mormente no sacrifício (com consequências catastróficas para a nossa língua falada) das consoantes “mudas” (estou-me nas tintas para a supressão das maiúsculas e demais minudências – perfeitamente arbitrário).
2) Em nenhuma das minhas dissertações (ok, seja generosa 🙂 você se deteve o tempo suficiente para me entender. Paciência!
Julho 1, 2013 at 9:55 pm
#81
Devolvo-lhe o cumprimento: «Em nenhuma das minhas dissertações (ok, seja generoso 🙂 você se deteve o tempo suficiente para me entender. Paciência!»
Não deveria ter lido tão apressadamente o que escrevi em #75 e, por conseguinte, ter feito outro tipo de inferências.
Lástima para os exemplos que eu facultei….
Parafraseando o seu nick: há quem teime em ver o copo sempre meio cheio, enquanto outros o veem sempre meio vazio.
Boa noite para si também.
Julho 1, 2013 at 11:03 pm
Perpheito! Apeles: não vá o sapateiro além do sapato… Ou: tanto elogio só pode significar uma coisa: em terra de cegos…
Julho 1, 2013 at 11:06 pm
#83,
Sou míope.
No seu caso, o monóculo é causado por alguma afecção da vista?
Julho 1, 2013 at 11:18 pm
#83
Authêntico comité central. Banana e coiso.
Julho 2, 2013 at 12:43 am
#82
Acontece, cara Maria, que a entendi perfeitamente. Só assim, aliás, seria possível perceber que as suas dissertações embrulhadas em academismo de trazer por casa não apresentam uma única justificação razoável para o sacrifício das consoantes “mudas” (o que realmente interessa, o resto – minúsculas ou maiúsculas, hífen ou justaposição – sim, é do domínio da pura convencionalidade) na escrita portuguesa, com a mutilação que isso representa e com as malfeitorias que daí advirão. Mas como poderia a Maria fazê-lo se essa justificação não existe (descontem-se as que PG muito bem elencou mas que nada têm a ver com a língua…)
Boa noite para si também. Sobretudo se for noctívaga. (Ou, como virá a preferir, e como leriam os brasileiros que nos levaram à certa com a sua incapacidade de ler duas consoantes seguidas, “noquitívaga”).
Julho 2, 2013 at 11:03 am
# 86
Quer dizer que “o sacrifício das consoantes mudas” afeta a pronúncia, fazendo com que a vogal anterior deixe de ser aberta?
Contrato deixou de se grafar contracto há décadas. O “a” não fechou.
Completo/ dialecto coexistiram sem alterações alterações na pronúncia.
Atual e atividade só agora perderam o “c”. A consoante muda estava lá, mas o “a” não é aberto.
O hífen, por exemplo, continua inconsistente: veja-se casos como cor-de-rosa e cor de laranja.
Julho 2, 2013 at 11:58 am
#87
Cara Ester (Que belo nome antes de 1911!…)
Afectará, sim. Aposto o que quiser que daqui a menos de uma geração não encontrará um único director, tão somente “dir’tôres”. “Victor” e “Nazareth” são exemplos de como a supressão da consoante e da da dupla consoante impuseram a colocação de acento – ou de como a simplificação é, afinal, ocasião de complicação.
Quando ao hífen, obrigado por reforçar o meu argumento.
Julho 2, 2013 at 2:52 pm
#88
Caro Meio Vazio,
O meu nome verdadeiro é Ester.
Os nomes próprios que refere têm um acento gráfico que marca a sílaba tónica, respeitando a norma ortográfica convencionada. Mais nada. Se a norma fosse outra, a pronúncia manter-se-ia inalterada. Porquê? Porque são casos que não se enquadram nas tendências gerais de redução vocálica do português de Portugal, estudadas em Fonética, Fonologia e História da Língua. O mesmo sucede com a palavra diretor.
Dito de outro modo, há redução vocálica (da abertura de vogais) em palavras como ministro (m’nistro) ou vi’zinho (vzinho) devido a um processo fonológico comum em português: a dissimilação. Ocorre o mesmo em casos de derivação (mata> matinha, medo>medroso). Não é o caso de diretor, ação, etc, etc. Aposte o que quiser. As convenções ortográficas não alteram a língua falada. Esta última evolui naturalmente e, no que à pronúncia diz respeito, o português atual é bem diferente do que era no tempo de Camões. Até em relação ao século XIX já há diferenças. Nenhuma delas se pode imputar à ortografia.
Para além do hífen, várias outros aspetos há a melhorar no AO de 90.
Não se pode criticar este AO, nem outro qualquer, com base em palpites, ou em estados de alma, mas antes em conhecimentos sólidos de várias áreas da linguística (que ninguém isoladamente tem, e eu muito menos).
O “achismo” origina disparates. O patriotismo e a emotividade não contribuem para debates baseados em factos.
Já que me associou a 1911, deixo-lhe um excerto de uma carta de Fernando Pessoa:
Meu querido Gaspar Simões:
Começo a enviar-lhe a colaboração prometida para o n.º 30 da Presença. Vai junto o Oitavo Poema de O Guardador de Rebanhos do Alberto Caeiro. (…) Fiz o possível por transcrever o poema que vai junto em ortografia moderna, visto que é a que vocês usam na Presença, e fica sempre mal o desacordo ortográfico adentro de uma publicação qualquer. Se é certo que, por diversas razões, uso da ortografia antiga, isso não quer dizer que me importe que vocês ponham o que eu enviar para a Presença em ortografia moderna, ainda que eu me não tenha lembrado de o fazer. V. fica desde já autorizado em absoluto a reortografar como melhor lhe parecer ou convier o que eu enviar para aí. Se na transcrição do poema do Caeiro errei qualquer ponto ortográfico, apesar de desejar conformar-me com a ortografia moderna, v. emende.
Julho 2, 2013 at 3:30 pm
#89
Cara Ester
Muito agradeço o registo do “estado de alma” de Fernando Pessoa. A Ester também os terá…
Quanto ao mais, lamento que refute a minha alegação (exemplificada com “dir’tôres”) sem o fazer: todos os exemplos de contrariedade que invoca (mormente em #87) referem-se a palavras de acentuação grave – a progressiva alteração da acentuação por supressão da consoante “muda” acontecerá em palavras agudas, o que V. finge não perceber.
Sobre “patriotismos” e “emotividades”, ficamos quase conversados se conseguir entender que a motivação dos adeptos da “muitilação90”, perdão, do AO90 mora uns pisos abaixo: na saloia convicção de que só à boleia do “brasileiro”, esfregando na cara, por exemplo, dos franceses, um número superior de falantes, salvaremos o português – uma muito pobre e vexante via, reconheça.
Quanto ao seu “nome verdadeiro” (o meu já foi grafado Joseph), lamento que o tenham mutilado: quero crer que Esther (eu a as minhas apostas, não é? 🙂 bem melhor iria com V graça. Sabe, o critério estético não é menor na escolha do que quer que seja. Nem na opção pelas teorias científicas.
Um seu criado, muito obrigado,
J.
Julho 3, 2013 at 12:31 am
#91
Ou não fui clara, ou o Joseph não entendeu (e isto já soa a kafkiano).
Que eu saiba, Vítor e diretores não são palavras agudas. Mas também se podem arranjar algumas, para exemplificar e encerrar o assunto:
1- inflação/ acção – a primeira não deixou de ter “a” aberto, apesar de não haver lá nenhum “c” mudo
2- actual – o “a” é fechado, embora lá esteja o milagroso “c”
Finalmente, as justificações políticas e económicas contra ou a favor do AO de 90 alargado a vários países (nº de falantes, etc, etc) são outra questão. E absolutamente irrelevante, dado que o que interessa saber é se vale a pena implementá-lo em Portugal, ou não. Isto independentemente de qualquer outro país, o que, aliás, foi o que sucedeu com acordos anteriores. Pesando prós e contras, acho que sim. Outros pensam que não. Ainda não consegui encontrar nenhum argumento linguístico válido contra.
Cumprimentos
Julho 3, 2013 at 1:21 pm
#91
Cara Ester
Em lado nenhum afirmei que “Vítor” e “director” eram palavras de acentuação aguda. Disse, e reafirmo: a) que a supressão do “c” em “Victor” (como a substitição do “z” pelo “s” em “Luiz”, “paiz”, etc.) implicou a introdução do acento (…sob pena de a mesma – “Vitor” – evoluir para aguda -, o que é totalmente diferente); b) que a supressão da consoante dupla em “Nazareth” impôs o acento (…sob pena de a palavra se tornar grave); c) que “director” (não é aguda?), sem o “c”, em Portugal, não no Brasil, evoluirá para “d’rtor”, o que mantenho. Ou seja, os factos mostram que a supressão das consoantes “mudas” nem sempre é irrelevante em termos de acentuação fónica (para além do prejuízo semântico, pelo afastamento etimológico): qualquer simplificação (?) tem trazido a reboque uma complicação (necessidade de acentuação gráfica, por exemplo).
Partilhamos a convicção de que razões políticas, económicas, diplomáticas são irrelevantes (ainda que maiores para quem impôs este AO, porque sempre invocadas, admita). Mas, essa convicção leva-me a conclusão oposta à sua: não vejo qualquer vantagem na sua “implementação” no nosso país (não me refiro a mudanças irrelevantes dada a sua natureza apenas convencional – minúsculas ou maiúsculas, hífen ou justaposição, etc., mas apenas à mutilação provocada pelas supressão de consoantes “mudas” que lesam gravemente a língua pelo afastamento etimológico). Nem vi, de resto, que alguém a tivesse mostrado. Nem a Ester.
Sinceros cumprimentos
J.