PauloReencaminho um texto que enviei a uma jornalista, com a esperança de que ela não se esqueça do que aconteceu ao nosso colega Luís. Se o quiser publicar (…).
Um abraço,
Bom dia, (…)!
É com alguma mágoa que lhe recordo que o meu colega Luís faz hoje três meses que não aguentou o desespero e se atirou ao Tejo. Deixou de ter notícias nos jornais, nas televisões e nos blogues de professores… só as suas cinzas pairam, algures, no nosso mundo.
Lamento que um idealista, um inconformado, um artista, não tenha encontrado uma mão amiga que o tenha ajudado a perceber a escola onde foi parar e tivesse ganho resiliência para enfrentar um ambiente adverso.
Pela minha parte só percebi que algo de estranho estava a acontecer, quando ele deixou de aparecer na sala de professores. Foi-me dito, em surdina, que se pensava que se tinha suicidado, pois parecia que a directora “lhe queria fazer a folha” e ele não aguentara a pressão, o mau comportamento dos alunos, a não aplicação das medidas disciplinares sancionatórias previstas na lei. Afinal, era preciso demonstrar à comunidade que tudo corria sobre rodas e que a senhora que dirigia a escola tudo resolvia!
Após contacto com a família, veio a confirmação das suspeitas: ele não aguentara a humilhação a que diariamente era sujeito…
A família pediu que não se divulgasse pois iria colocar o problema ao Conselho Pedagógico e ao Conselho Geral, para que aquela morte obrigasse a uma profunda reflexão na escola.
Nada aconteceu. A carta foi guardada como se se tratasse de correspondência pessoal.
Então, o caminho a seguir seria a queixa perante as instituições que supervisionam a escola pública: DRELVT e a IGE. Mais uma vez nada aconteceu. Restou o contacto com o seu jornal, através da sua pessoa. Rapidamente os sinos tocaram a rebate: os órgãos de comunicação social mobilizaram-se (afinal o Luís também já fora jornalista) e a DRELVT saíu da Praça de Alvalade, mandou instaurar um inquérito e atribuir apoio psicológico aos alunos que pudessem estar envolvidos.
Sobre a nomeação do inquiridor, muito se tem escrito, mas também muito se tem ocultado, pois as pessoas ouvidas no âmbito do inquérito têm que manter silêncio sobre o que tem acontecido, apesar de muitas não estarem a aguentar a pressão, e os métodos pouco ortodoxos utilizados. Quem viveu antes do 25 de Abril, sabe, como de repente, lhe aparecia alguém em casa ou no emprego, para obter informações… Mas não deve ser difícil chegar à verdadeira razão que terá levado a IGE a nomear um inspector/advogado para este caso. Afinal, a senhora directora precisa de alguém que a defenda!
Passaram dois meses sobre a nomeação do referido inquiridor. O tempo de instrução de um processo é de 45 dias.
Diz-se que o problema é complicado, que existe luta pelo poder dentro da escola. Mas quem é que, estando de bem com a vida, pretende ocupar aquele lugar? Basta de atirar areia para os olhos das pessoas e juntar as pontas: o colega Luís era humilhado, maltratado, fazia participações disciplinares, colocava alunos fora da sala de aula, a directora repreendia-o e obrigava o professor a receber os alunos de volta. A figura daquela senhora intimidava-o, como ele próprio deixou escrito. A legislação não foi cumprida, o Regumamento Interno também não, o próprio Projecto Educativo contém medidas a tomar para prevenir a indisciplina que não foram seguidas… Onde está a dificuldade em fazer o diagnóstico da situação?
É mais conveniente ir por outros caminhos, para camuflar o que aconteceu. Mas afinal,a quem interessa saber o que aconteceu em 2008/2009, em termos disciplinares? A morte não ocorreu este ano? Ainda vão, certamente apurar, que foi a anterior direcção a responsável!
E já agora, a quem é atribuída a perseguição à cozinheira de uma das escolas, e o não funcionamento das diferentes Associações de Pais? Repare-se que o Conselho Geral deixou de reunir e o próprio Conselho Pedagógico não está constituído nos termos da lei.
Muita matéria haveria para verificar, afinal a Educação interessa a todos e os caminhos tortuosos que se têm seguido só têm gasto dinheiro aos bolsos dos contribuintes.
Espero que este tema não seja encerrado, e continue a ser objecto de reflexão. O tempo para apurar os factos já terminou. No caso do Leandro bastaram dez dias.
A vida já não a podemos devolver ao colega, mas podemos preservar, com dignidade, a sua memória. É isso que procurarei fazer, hoje, que completam três meses após a sua morte e sempre que me recorde do que aconteceu no local de trabalho onde me sentava à sua frente e via os eus olhos tristes e angustiados.
M.L.
Maio 10, 2010 at 8:59 am
Quando refiro o estalinismo latente nos procedimentos do estado português, alguns troçam e chamam-lhe música.
Talvez porque nunca se sentiram perseguidos, nem no antes nem no pós-25A e agora se coloquem do lado dos opressores.
Talvez não tenham a humanidade suficiente para se solidarizarem com os mais fracos (mesmo psicologicamente)e humildes, embora encham muito a boca com o “colectivo” e rezem frequentemente o evangelho da seita.
Maio 10, 2010 at 9:08 am
Se as pessoas imaginassem tudo o que é enviado aos senhores jornalistas e que depois não passa pelo “filtro e funil”…
Maio 10, 2010 at 9:42 am
Desde que os Directores cumpram as indicações das DREs e do ME, ninguém quer saber nada sobre o que se passa nas escolas.
Não vale a pena fazer exposições ou queixas ao ME, IGE, DRE. Quem se quiser defender tem de utilizar outras vias.
Estamos por nossa conta.
Maio 10, 2010 at 10:03 am
Ontem até o grande Heman Jossé disse no progama do Nogueira que não estamos numa democracia plena.
Maio 10, 2010 at 10:39 am
#3 (e restantes comentadores)
O antigo CE, que era um daqueles CE que por aqui são “adorados” sabe muito bem disso. E está a agir em conformidade. Com todo o apoio dos “adoradores” cá do sitio. É a única parte cómica desta história.
Maio 10, 2010 at 11:24 am
Estes questionadores hermafroditas pairam por aqui que nem moscas em cima de bosta
Maio 10, 2010 at 11:30 am
#6
Isto dito por quem se auto-intitula de “enrabador” é hilariante!
Maio 10, 2010 at 11:54 am
6# O avatar parece saído do filme “Aventura na casa assombrada”
Maio 10, 2010 at 12:20 pm
O que para aqui vai.
Maio 10, 2010 at 12:26 pm
#9
Diria antes o que por aqui não abunda…
Maio 10, 2010 at 12:26 pm
Entretanto o teixeiraMAL aproveitou o Benfica para vir dizer que vai aumentar os impostos…
Maio 10, 2010 at 12:30 pm
Estou de saída.. fui spamado duplamente tanto como Buli ou silentduck a Olinda idem…até a comentar o meu próprio blog-o outro- me encontro sapmado!
Vou andar por aqui e por ali…à cautela vou andar com vaselina existem por aqui uns sujeitinhos que precisam de ser bem oleados ..por dentro e por fora…Inté,,
«A constância é contrária à natureza, contrária à vida. As únicas pessoas completamente constantes são os mortos» Aldous Huxley
Maio 10, 2010 at 12:32 pm
Isto explica muito sobre aqueles que por aqui pululam e regurgitam fel…
O Ódio liga mais os Indivíduos que a Amizade
O ódio, a inveja e o desejo de vingança ligam muitas vezes mais dois indivíduos um ao outro do que o podem fazer o amor e a amizade. Pois está em causa a comunidade de interesses interiores ou exteriores e a alegria que se sente nessa comunidade – onde é muitas vezes determinada a essência das relações positivas entre os indivíduos: o amor e a amizade – é sempre relativa e não é em nenhum caso um estado de alma permanente; mas as relações negativas, essas são, a maior parte das vezes, absolutas e constantes. O ódio, a inveja e o desejo de vingança têm, poder-se-ia dizer, o sono mais ligeiro do que o amor. O menor sopro os desperta, enquanto que o amor e a amizade continuam tranquilamente a dormir, mesmo sob o trovão e os relâmpagos.
Arthur Schnitzler
Maio 10, 2010 at 12:34 pm
Shue:não vi que já tinhas feito referência ao nojo que falo…
Maio 10, 2010 at 12:34 pm
As nossas vidinhas…
Maio 10, 2010 at 12:52 pm
Desejo muito que a carta deste/a colega do Luís seja divulgada nos media. Infelizmente o que se passa naquela escola, tem demasiadas réplicas noutras… estou triste. Nunca pensei que a Escola e o ambiente escolar viesse a ser este… o desanimo é total! Um abraço solidário a quem não esquece a solidariedade e a amizade! Obrigada ML por escreveres!
Maio 10, 2010 at 1:20 pm
Há dois tipos de violência nas escolas, uma visível, psicológica e/ou física e outra oculta que se traduz num mau estar inexpressivo, um desgaste, uma apatia, aquilo a que se convencionou chamar de “burnout”. Não sentimos apoio, a burocracia inunda-nos e asfixia, os directores têm poderes para porem e disporem sobre qualquer assunto que envolva professores.
As escolas são, hoje, locais de desgaste, onde não gostamos de estar, onde não há tranquilidade para fazermos o nosso trabalho.
Oxalá me engane mas creio que mais colegas colapsarão.
Maio 10, 2010 at 1:24 pm
# 17
Para além de perseguição primária aos professores que não se conformam com a mediocridade de quem está na direcção sem mérito algum ou pelo menos saber estar num órgão de gestão.
Maio 10, 2010 at 1:50 pm
Desastroso
INQUIRIDORES (INQUISITORES) que são inspectores/advogados com consultório de jurista aberto! Onde paira a ética? a moral? e os bogalhos? já que os alhos no Governo é que não estão, não!
Maio 10, 2010 at 1:52 pm
# 17
é verdade sinto o mesmo. é só porcaria em cima de porcaria. Quanto se mexe mais na porcaria mais ela vem ao de cima
Maio 10, 2010 at 2:10 pm
Olhem-me estes…Pois privado privado mas só com esmolinhas do estado…Com as botas do meu pais sou um homem…Chulos…
João Alvarenga reeleito por mais três anos
Colégios querem que o Estado ajude mais as famílias
08.05.2010 – 19:15 Por Bárbara Wong
O Estado deve apoiar as famílias que têm filhos no ensino particular e cooperativo, defende João Alvarenga reeleito presidente da Associação de Estabelecimentos de Ensino Particular e Cooperativo (Aeep) e que hoje tomou posse para mais três anos à frente do organismo.
Maio 10, 2010 at 2:20 pm
Na semana passada ouvi uma palestra de uma pedaboba que ensina numa universidade. O horror do eduquês em toda a sua fulgurância. Esta gente não compreende as consequências das teorias que leram em livros e papagueiam alegremente. Continuam a asneirar de cátedra. Não fazem ideia do que é uma escola…
Maio 10, 2010 at 2:28 pm
Mais um murro no estômago ao ler esta carta. Esta indiferença e relativização do mal que se tem instalado insidiosamente na nossa sociedade é CRIMINOSA!
O silêncio MATA.
A mim resta-me não me calar, nunca.
Maio 10, 2010 at 2:28 pm
Um inquerito não é uma sindicancia à escola.
para quê andar a ver a indisciciplina do ano anterior? o que interessa sao os factos objectivos em torno da morte do vosso colega .
fazem bem em falar do assunto.
num dia o inspector ouver uma pessoa e julga segundo as suas convicções o seu depoimento. depois, via ouvir duas ou tres que digam o contrario e assim por diante so parando ate as conclusoes coincidirem com as premissas.
ja agora: porque é que as participaçoes verbais de infraccões disciplinares nao deram em processos? porque nao houve papel escrito? em tribunal verao se essa treta de argumento serve para afastar a responsabilidade.
já ouviream falar em auto de noticia? pois pois
cuidem-se em fitares.
Maio 10, 2010 at 2:35 pm
oq ue aconteceu aqueles infracçoes que vinham no correio da manha sobre a turma do 9.º B de fitares? nada!!!!!!
a directora fala em medidinhas correctivas. mas isso nao existe. o regulamentom daquel escola ainda nao ta homologado pela drel.
leiam leiam.
ilegalidades aos montes em fitares
fzeram a eleição da directora sem a comissao sem orgao de fiscalizaçao que sai da assembleia de escola. porque tambem nao tinham assmebleia de escola, porque nao tinham regulamento. a drel obrigou a comissao que la tava a faxer isto e eles – dizem-nos – fizeram declaracao de reserva. cumpriram mas com reserva total. va vi esse docummento entregue na drel.
é uma vergonha que o Luis tenha morrido assim.
tenhamos todoso vergonha deste país
os alunos tinham de ter sido suspensos.
sem o 1.º regulamento homologado como é que existe o carg de directora??????????????????????????????????????????????????????????????
Maio 10, 2010 at 2:37 pm
vou acabar
as testemuhas que mentirem no inquerito serao alvo da medida respectiva
aguardem.
a brincadeira sai-vos caro
Maio 10, 2010 at 2:41 pm
#23, tens razão, Ana: o silência mata.
E o medo tb!
Maio 10, 2010 at 3:08 pm
[…] os rios, Tejo e Tua 10 05 2010 A propósito de carta publicada no blogue de Paulo Guinote sobre as causas do suicídio do professor […]
Maio 10, 2010 at 3:23 pm
#23
Ana, tens feito um óptimo trabalho neste campo. Continua que os professores merecem e agradecem!!!!!
Maio 10, 2010 at 3:25 pm
#23
Ana, tens feito um óptimo trabalho neste campo. Continua pois os professores merecem e agradecem!!!!!
Maio 10, 2010 at 3:57 pm
Sinto uma angústia generalizada na escola. Até aqueles que ou se bateram por “passar a perna” aos colegas ou quiseram reverenciar as tutelas, neste momento se mostram abatidos. O ambiente das escolas jamais será o mesmo. Passarão gerações até que as tensões diminuam. Só quem trabalha na escola sabe o que por lá se passa.
Eu tenho a sorte de ter (até agora) alunos com quem dá gozo trabalhar. Não é que tenham excelente aproveitamento (alguns até têm) mas são de uma maneira geral educados e têm famílias que se interessam por eles. Só eles me aguentam em pé. TUDO o resto é demasiado sofrido para se suportar.
O caso do colega Luís não pode deixar-se esquecer.Temo mais casos semelhantes comecem a aparecer.
Maio 10, 2010 at 4:15 pm
eu confesso que ando um pouco “esquifrénico” já há alguns anos.
saio da escola e (tento) faço por esquecer que sou professor…se não já tinha “dado o tilt”
assim. lá me vou aguentando e enchendo as baterias noutras actividades que me dão mais gozo. a escola é cada vez mais um sacrifício apesar desses alunos (poucos) de que a maria falou em #31
Maio 10, 2010 at 4:16 pm
obviamente “esquizofrénico”
Maio 10, 2010 at 4:47 pm
Queridos colegas!
Problemas pessoais e problemas profissionais seriam amenizados, quiçá ultrapassados, se trabalhássemos em grupo.Se planificássemos e, dentro do possível, executássemos as nossas aulas, em trabalho cooperativo.
Até o problema da avaliação se resolveria, com maior justiça e transparência.
Não me venham dizer que não é possível. Só depende de nós.
Conforme as coisas estâo, as escolas são, para muitos de nós, um autêntico inferno. Libertemo-nos, tomando o destino nas próprias mâos!
Nunca nenhum directivo, nenhum inspector me impediram de tomar medidas irregulares, desde que devidamente fundamentadas e convictamente defendidas. Se quiserem, exemplifico.
Queixamo-nos muito do sistema, mas, muitas vezes, o sistema somos nós…
Temos medo de quê?! Estamos à espera de quê?! De que morram mais colegas?!
Maio 10, 2010 at 5:33 pm
Isto não tem nada a ver com estalinismo, nem com o 25 ou 26 de Abril. Resume-se tudo a indiferença e incompetência.
Maio 10, 2010 at 5:55 pm
as escolas são o faroeste onde a lei é feita pelo xerife
#34 😆
Maio 10, 2010 at 6:32 pm
Curioso como nestes exemplos de procedimentos encomendados pelo estado e executados por comissários políticos, alguns só vêem “indiferença e incompetência”.
Então e a ocultação da verdade e a distorção propositada dos factos não interessa para a avaliação da acção do estado?
Assim se vê a superioridade moral de quem varre para debaixo do tapete do estado a imoralidade e a corrupção dos seus agentes, muitos deles treinados nas máquinas político-mafiosas.
Maio 10, 2010 at 6:41 pm
#23, tens razão, Ana: o silência mata.
Maio 10, 2010 at 7:10 pm
Caro Paulo:
O Blog Geopedrados publicou este post, indicando a origem. Esperemos que os jornalistas os tivessem/tenham no sítio e publicassem ou esmiuçassem a estória…
Maio 10, 2010 at 7:12 pm
O que melhor sabemos fazer..e ás carradas.
Maio 10, 2010 at 7:14 pm
Dedicado aos que fizeram isto ao colega…
Aos Vencedores
Visto que tudo passa e as épicas memorias
Dos fortes, dos heroes, se vão cada vez mais,
Que tudo é luto e pó! ó vós que triumphaes
Não turbeis a razão nos vinhos das vãas glorias!
Não ergais alto a taça, á hora dos gemidos,
Esquecidos talvez nos gosos, nos regallos;
E não façaes jámais pastar vossos cavallos
Na herva que cobrir os ossos dos vencidos!
Não celebreis jámais as festas dos noivados,
Não encontreis na volta os lugubres cortejos!
– E se amardes, olhae que ao som dos vossos beijos
Não respondam da praça os ais dos fusilados!
Sim! – se venceste emfim, folgae todas as horas,
Mas deixae lastimar-se os orphãos, as amantes,
Nem façaes, junto a nós, altivos, triumphantes,
Pelas ruas demais tinir vossas esporas!
Pois toda a gloria é pó! toda a fortuna vã! –
– E nós lassos emfim dos prantos dolorosos,
Regámos já demais a terra–ó gloriosos
Vencedores! talvez, – vencidos d’amanhã!
António Gomes Leal,
Maio 10, 2010 at 7:20 pm
Paulo: Tomei a liberdade de republicar esta carta no meu blog, linkando-a para aqui.
Maio 10, 2010 at 7:40 pm
Cópia de artigo que circula nos blogues de educação dirigido à directora de fitares que trabalhou com o luis no Estoril há váriios anos e era directora aquando do suicídio em 2010.
Já se se conheciam há muito!!!!!
“Memórias esparsas do Luís”.
“O Luís era uma daquelas pessoas já raras, porque digna, guiado por princípios e valores, exigente consigo próprio, tímido e muito metido com ele (era difícil arrancar-lhe um sorriso). Aos 51 anos, “solteirão”, ainda contratado – o professorado é a única profissão em Portugal onde isto ainda acontece! – veio até nós, no decurso da luta pela Profissionalização, contexto onde convivi com ele directamente durante cerca de três anos.
Portador de Habilitação Própria, foi eleito em Lisboa, em Plenário para a Comissão de Contratados, em 2004. Participou activamente em todos os protestos e acções reivindicativas da nossa Frente de Trabalho do SPGL, que levaram à conquista do Despacho nº 6365/2205 (profissionalização em serviço em ESE’s e Faculdades).
Era conhecido entre nós pelo ”freelancer” (alusão à sua segunda ocupação de jornalista eventual). Dotado de forte sensibilidade em relação ao mundo da informação e da comunicação social, propôs e pedia frequentemente, nas nossas reuniões, que os sindicatos encarassem esta frente (relações públicas) com outros olhos, mais eficazmente. A partir de 2006, não se recandidatou mais à nossa comissão de contratados.
Encontrei-o mais tarde nas mega-manifestações de professores: estava na Escola EB 2,3 Ruy Belo, e achei-o disposto a não entregar os Objectivos Individuais, um verdadeiro problema de consciência moral, para ele.
Depois disso, mais uma ou duas vezes, espaçadamente. Soube que tinha sido colocado na EB2,3 de Fitares, mas pouco mais.
No passado dia 11 de Fevereiro, revi-o pela última vez, em Oeiras, já deitado no caixão na capela mortuária. Conversei longamente com a mãe, a irmã, a empregada doméstica. Vêm-me à memória as palavras do pai, militar aposentado: “o Luís era bom moço, quis ser bom até ao fim, só que não aguentou o inferno das escolas de hoje… Vocês têm que fazer qualquer coisa!”
O Luís nos, últimos tempos, já tinha tomado friamente a decisão, inabalável. Por isso, não creio que nesse período, tenha pedido ajuda a ninguém. Segundo me disseram familiares, no velório, pela consulta do histórico do seu PC, ele, um mês antes e se lançar da ponte, consultava sites sobre suicídio, na internet. Escolheu o dia da sua morte coincidindo com a data de aniversário do pai, com o qual, aliás, se dava bem.
O ambiente no velório foi impressionante, pela dignidade, revolta interior e tristeza da cerimónia, com alguns professores presentes, num silêncio de cortar à faca, só rasgado por frases em surdina, de justo ódio, visando os políticos responsáveis pela situação a que nos últimos anos chegou o Ensino Público. Foi, sem dúvida, dos velórios mais tocantes em que estive até hoje, mesmo estando já habituado a duras perdas, e tendo estado na semana anterior, noutro, de um familiar directo. Quando escrevi no livro de condolências o que me ia no espírito, tive dificuldade em o fazer, a cortina de lágrimas teimava em desfocar-me as letras.
Pessoalmente, decidi manter silêncio durante um mês, por respeito ao pesado luto da família, só o quebrando depois da irmã dele (nossa colega, também) o ter feito, decorridos cerca de trinta dias, com a divulgação da notícia à comunicação social, para assim tentar evitar que outros casos se repitam, colocar toda a verdadeira dimensão das depressões e suicídios profissionais à luz do dia, rasgar o manto hipócrita dos silêncios assassinos e abalar as consciências de toda a sociedade.
Paulo Ambrósio
– membro da Comissão de Professores Contratados e da Frente de Professores e Educadores Desempregados do SPGL desde 1999″
Maio 10, 2010 at 8:31 pm
#43
li e tudo isto é muito triste.
Maio 10, 2010 at 8:33 pm
Maio 10, 2010 at 10:06 pm
Poder/humanidade!
As pressões sofridas no meio laboral são as que produzem efeitos mais devastadores para a esmagadora maioria das pessoas, segundo o resultado de um estudo realizado, há alguns anos, nos EUA.
Os princípios e valores que deveriam nortear a regulação das relações sociais que se estabelecem nas escolas sofreram o maior dos atentados com a legislação que entrou em vigor desde que a pasta da Educação foi entregue a MLR. Esta foi, sem dúvida, muito bem escolhida, uma anarquista (desordeira, leia-se!) ansiosa por fomentar a anomia: instituiu o regabofe para os alunos e a tirania para os professores!
Os governos presididos por JS tiveram (e têm) o mérito de nos alertar para o facto de andarmos completamente à deriva, não há qualquer plano traçado para podermos delinear o nosso futuro com alguma segurança. Todas as decisões tomadas são fortuitas e demagógicas.
É bom que percebamos que estamos no mesmo barco, que já sofreu vários rombos, e só nos resta desenvolver a solidariedade e a cooperação para prevenirmos o naufrágio. O espírito de grupo deve emergir, pois temos um objectivo em comum: ajudar a construir um futuro mais justo e mais próspero!