Cada vez começo a achar menos sentido em considerar a assiduidade como elemento importante na avaliação. A sério que sim.
Blasfémia?
Nem por isso, apenas pragmatismo.
Com uma escolaridade de 12 anos, os alunos que alegadamente (de acordo com o seu estatuto) “chumbam” por faltas em Outubro, desde que continuem a ir ocasionalmente às aulas e a fazer uns testes razoáveis (ou mesmo menos do que isso), têm imensas possibilidade de passar de ano.
Porquê?
Porque a “retenção” só se concretiza mesmo no final do ano e eles já sabem disso aos 11, 12 ou 13 anos de idade.
Porque sabem que para serem “inclusivas”, as escolas públicas os aceitam a matricular-se e a passear por lá e os professores, para não serem os maus da fita e obedecerem às leis, devem aceitá-los nas aulas a que eles acham por bem comparecer. E não me digam que nos cursos profissionais ou vocacionais não é a mesma coisa, porque é ou ainda pior. A justificação de faltas é feita quase com pedidos por favor-favor-favor e aceita-se quase tudo.
E nem venham com as conversas das denúncias para as CPCJ que não têm mãos as medir com os casos muito graves, pelo que os casos graves vão para a pilha do arquivamento ao fim de uns pedidos de informações e correspondência variada ao longo de uns quantos meses até chegar o fim do ano lectivo.
No final do ano, com as metas do sucesso a pressionar e a paciência a minguar, muitos destes alunos acabam por passar de ano, como forma de todos ficarem a “ganhar”. As escolas com o dito “sucesso”, a maioria dos professores (e em especial @s DT) com menos chatices e os alunos com a devida recompensa por saberem usar o “sistema”.
Eu sei que não é assim em todos os lados, porque há sítios com muito menos problemas, mas onde eles existem, ou se resolvem desta maneira ou então quem o não faz é acusado de adoptar uma “cultura de retenção” e de não saber “dar aos alunos o que eles precisam”.
Ah…. e ainda existem as metas de combate ao abandono escolar que incentivam imenso a “sub-orçamentação” do abandono real, para as fotografias na avaliação externa das escolas ficarem muito bonitas.
Que há “boas práticas”… ? Sim, há, mas menos do que as que constam e se anunciam como tal.
E quem me disser que isto não é assim, vive no País das Maravilhas.
Mais vale “esquecermos” a questão da assiduidade, a menos que deixemos de ter medo de usar a escala de avaliação em toda a sua “extensão” (e sim, estou a pensar usar uma boa dose de pouco inclusivos níveis um no final deste período…).
Dezembro 6, 2014 at 1:44 pm
eu nunca considerei a assiduidade como um elemento de avaliação, já a pontualidade… sim.
lembro-me, em tempos mais idos, de dizer aos alunos ‘as faltas foram feitas para ser dadas’, desde que as controlem… e essa era a minha prática profissional, portanto eu dava o exemplo.
Dezembro 6, 2014 at 1:52 pm
Num ensino cada vez mais dominado pelos resultados, pelas “metas”, pela “avaliação”, pelos testes e exames, pela miragem do “sucesso” e da “estatística” – do “sucesso estatístico” -, a assiduidade torna-se progressivamente mais irrelevante, no limite, figurará como um aspecto marginal.
Dezembro 6, 2014 at 2:04 pm
Por alguma razão há quem diga que as ciências da educação são como a Penélope de Ulisses: desfazem à noite o que fazem durante o dia, pelo que estão sempre a discutir as mesmas questões…
Dezembro 6, 2014 at 2:42 pm
Nunca a considerei quer explicita quer formalmente. Mas sei que num regime de avaliocracia ela é valorizada…
Dezembro 6, 2014 at 3:19 pm
Clarinho como água pura! Subscrevo.
Dezembro 6, 2014 at 3:27 pm
A assiduidade não faz parte dos meus critérios de avaliação, nem dos que me são impostos pelos órgãos pedagógicos competentes.
De facto, os alunos devem ser avaliados pelo que fazem – ou não – nas aulas em que estão presentes, e penalizá-los pelas ausências implicaria, no mínimo, averiguar se cada falta foi ou não justificada, o que se afigura pouco funcional para professores do ensino básico que têm, em média, mais de cem alunos.
E também é claro que um aluno que falte algumas vezes e não procure passar os registos das aulas em que esteve ausente, estudar pelo manual as páginas correspondentes e apresentar eventuais dúvidas ao professor, acaba por ver a falta de assiduidade repercutir-se na avaliação do aproveitamento.
Quanto a outros temas abordados no post, a justificação indevida de faltas, o abandono escolar e a indisciplina varridos para debaixo do tapete e outras práticas de silenciamento e encobrimento induzidas por uma “cultura da avaliação” acriticamente aceite por demasiada gente, o que há a dizer é que tudo isso se insere no espírito dos tempos: vale mais parecer do que ser e é mais fácil construir, no papel ou no computador, uma realidade virtual à medida do que nos é exigido do que arregaçar as mangas e tentar transformar o quotidiano em que vivemos. Ou exigir dos outros e de nós mesmos coerência entre os actos e as palavras…
Dezembro 6, 2014 at 3:58 pm
Mas então paremos com a ficção da “retenção por faltas”.
Dezembro 6, 2014 at 4:24 pm
Sim, também subscrevo que se pare com a ficção da “retenção por faltas”.
Dezembro 6, 2014 at 4:53 pm
Nunca considerei. Devo ser um privilegiado.
Dezembro 6, 2014 at 5:36 pm
Não acabarão com a retenção por faltas, porque isso significaria o reconhecimento da vacuidade e do fracasso das escassas e pobres ideias deste governo em matéria educativa.
A regra ao estilo do antigamente de que só-passa-quem-souber implica que quem não alcançou os mínimos de rigor&exigência em assiduidade e aproveitamento terá de ficar retido.
Pensar ou agir de outra forma implicaria discutir questões sérias, como a irrelevância, sentida por muitos alunos, do saber transmitido pela escola, ou um modelo de sociedade em que as qualificações académicas deixaram de garantir seja o que for.
Para já não falar da teoria da treta de basta introduzir mais exames ou tornar mais exigentes os que já existem para que os alunos automaticamente se esforcem mais a estudar e melhores resultados escolares apareçam de geração espontânea.
E reconhecer que dar uma resposta educativa de qualidade aos miúdos que não se integram bem no ensino regular implica um maior investimento em recursos humanos e materiais, obrigando a elevar a despesa educativa para um nível comparável aos da generalidade dos países desenvolvidos.
Tudo coisas complicadas para um governo que relegou a educação para o penúltimo lugar no ranking dos ministérios, apenas acima do da segurança social e da “solidariedade”. O que, só por si, é todo um programa de governo…
Dezembro 6, 2014 at 5:40 pm
Quanto à “cultura de retenção”, esse é um estribilho do palhaço-rico do CNE, a reserva moral do PSD-bom, disponível para quando se esgotarem as baterias do palhaço-pobre, o ministro masoquista que se congratula cada vez que o PSD-mau lhe corta no orçamento.
Dezembro 6, 2014 at 8:24 pm
Quando há uns tempos atrás (por aqui), perguntei se dentro da escolaridade obrigatório se “chumbava” por faltas, esperava uma resposta por parte dos foristas do género : ” as retenções por faltas no ensino obrigatório É TRETA”
Finalmente o Paulo Guinote faz um post onde isso é demonstrado.
Dezembro 6, 2014 at 8:28 pm
Os exames nao me parece que seja assim uma coisa tao ma.
Talvez o pior seja o quotidiano, com os alunos afogados em oral presentations, power points, apresentacoes de videos para TIC, trabalhos de grupo com pesquisa na Internet, tudo isto para alem do trabalho de casa.E nao chega o livro de estudo, ainda tem de ir pesquisar “recursos” a escola virtual. Tudo isto em nome da avaliacao continua das atitudes.
Quando chega o exame deve ser um alivio.
Dezembro 6, 2014 at 10:52 pm
Eu teria pudpr em colocar como parcelas da mesma adição “assiduidade”, “aproveitamento” e “disciplina”. Não consigo imaginar uma unidade de medida comum, ainda que possam ser estabelecidos limites em qualquer destas dimensões para um resultado final do ano.
Dezembro 7, 2014 at 1:45 am
No seu limite máximo (e sublinho máximo), extinguir completamente o princípio da “retenção por faltas” em determinadas faixas etárias teria consequências (já não falando das NEE…)… não desprezando possíveis virtualidades do “ensino doméstico” e do “autodidatismo”, não achamos que as competências dos nossos alunos geram-se e desenvolvem-se a partir da acção do professor?
É debatível…
Dezembro 7, 2014 at 1:52 am
Às vezes os comentários daqui são tão, tão, tão “Maria vai com as outras” 😦
Dezembro 7, 2014 at 10:55 am
O aluno e o encarregado têm o direito de perceber pelos seus próprios meios se precisam do professor. Ao primeiro teste negativo normalmente percebem. Ou estão-se nas tintas e a obrigatoriedade da escolarização nem se lhes aplica.
Dezembro 7, 2014 at 5:25 pm
Quando vejo os critérios de avaliação apercebo-me que as aulas não contam quase nada.Em Filosofia ,na escola do meu filho os testes contam 85% ,isso significa que a assiduidade não vale grande coisa….