Não é segredo que entre os tanques de pensamento que orbitam este governo e estiveram na origem de algum do seu ideário Margaret Thatcher é uma espécie de mãe espiritual.
Ora… aquela singular e mítica sucessão de vitórias eleitorais esteve quase para não acontecer, em virtude do que estava a ser o descalabro económico do seu primeiro mandato. Tudo acabou por ser salvo pelos argentinos, quando decidiram tomar as Malvinas/Falkland e a Maggie se tornou uma warlady. Só que por cá não temos ninguém que nos invada as Berlengas, sendo que a Madeira nem oferecida com dote a querem com o jardinesco lá instalado com o seu séquito. Então há que ir buscar uma lição diferente na governação da Dama de Ferro.
E os liberaizinhos de tertúlia encontram esse exemplo de firmeza e “liderança” na guerra travada pela sua idolatrada Margaret com os mineiros e os seus sindicatos, em particular com o então muito influente Arthur Scargill. Entre nós não há nenhum sindicato assim tão forte, nem o Arménio Carlos tem um estilo capilar tão arrojado, nem existe uma classe profissional tão vasta e determinada como era a dos mineiros britânicos quando os conservadores decidiram dizimá-los para mostrar como não temiam o movimento sindical.
Mas há os professores, em especial do ensino público. Que parecem ser (ainda) muitos e cujo rasto de demonização, iniciado há meia dúzia de anos por Sócrates/Maria de Lurdes Rodrigues, parece ser fácil de retomar, até porque muitos dos meninos-guerreiros assessores do actual governo parecem nutrir por eles um ódio muito particular, como se sentissem especial prazer em apoucá-los, acusando-os, conforme os momentos, de serem privilegiados mas igualmente incompetentes, uma espécie de aristocracia proletária, qualificada como que por engano, mas no fundo uns inúteis, se bem que relativamente perigosos.
Sei que não faz muito sentido, mas naquelas cabecinhas engomadinhas é tudo assim, muito elaborado mas na base da pobreza intelectual franciscana, alimentada a preconceito, ignorância factual mas muita prosápia e peneirice de quem leu umas coisas e teve aulas em estrangeiro.
(ahhhhh… este parágrafo, embora curto, fez-me libertar uma boa quantidade de toxinas… e ainda não adjectivei tudo o que me apetece)
E então devem ter convencido o actual PM – pessoa que cada vez me aparece abundar mais em convicções que entram pelos ouvidos ou em pastinhas finas – que os professores poderiam ser os seus mineiros, a sua guerra particular, capaz de o mostrar um líder forte, capaz de enfrentar os poderosos sindicatos e interesses corporativos e assim iludir a catástrofe económica em que nos vai rapidamente afundando.
E vai daí o homem chega a Paris e decide dizer umas parvoíces, retomando a tese demográfica que uns imbecis (mmm… a adjectivação de quando em vez alivia a tensão…) insistem em metralhar como se fosse um mantra inescapável, só faltando que recuperem os dados do aldrabado estudo tipo-fmi.
Ora… todos nós sabemos que ele sabe que nós sabemos que… ele disto não percebe nada.
E que mais valia estar calado… até porque os mineiros entraram em guerra aberta, o que termina sempre com uma vitória ou derrota total de uma das partes, enquanto que os professores, se conseguirem ser inteligentes e os seus representantes e líderes (sindicais ou a nível de escola) souberem estar à altura das suas responsabilidades, ganharão muito mais em optar pela guerrilha.
Que, como sabemos, sendo cirúrgica, pode moer quase indefinidamente até à queda do adversário.
É o que espero. E o que desejo.
Maio 15, 2013 at 5:25 pm
http://www.publico.pt/sociedade/noticia/governo-com-versoes-contradiorias-sobre-progressao-dos-docentes-na-carreira-1594418
Maio 15, 2013 at 5:43 pm
Caro Paulo, a minha guerrilha já a decidi há muito, mas será solitária e dificilmente seguida por outros. Seguirei o exemplo de Gandhi, penso que o precursor, e farei, literalmente, greve de fome. Com manifestações de punho erguido isto não vai lá. Acho que me recuso a encarar a mobilidade forçada como uma nova oportunidade dada pelo Pedrito Coelho e também, obviamente, declino a possibilidade de ser confundido com uma fralda descartável…
Maio 15, 2013 at 5:48 pm
#2,
Muita coragem pessoal nessa decisão.
Maio 15, 2013 at 6:15 pm
E não deveríamos encetar uma forma de luta “criativa” de forma coletiva?
Se for uma acção feita com bastante vigor, terá a virtude de chamar a atenção das pessoas e dos media para a nossa situação e, também para a necessidade da defesa da escola pública de qualidade – único garante eficaz para combater as assimetrias sociais e podermos acrescentar mais valias à economia portuguesa.
Proponho que se abra um debate sobre formas de luta que deveríamos encetar.
Desde já deixo a sugestão para irmos acampar para junto do ministério da educação/ residência do PM ou PR. Durante tempo indeterminado!
Maio 15, 2013 at 6:27 pm
Para PC e seus acólitos liberalóides o ensino é “aquela coisa que serve para formar mão de obra barata para os nossos empreendedores serem competitivos”. Para esses espíritos simples, de resto, toda a realidade, mormente a social, é vista nessa perspectiva ideológica mercantilista e empresarial: é o mercado, com as suas necessidades imanentes, que deve reger a sociedade e, claro, a escola.
Acontece que os professores, ou pelo menos muitos deles (sobretudo os mais velhos, e que (se) vão ainda aguentando (n)o sistema), ainda se viam como depositários e transmissores de saber e cultura, mas estes domínios, precisamente, constituem apenas “custos mortos”, do ponto de vista da economia empresarial e, pior ainda, entram na categoria suspeita de “redutos da esquerda” (complexo de inferioridade da intelectualidade da nossa direita, com raízes no PREC), capazes de promoverem apenas a insubordinação social e o dissenso.
Os professores são, assim, vistos como uma adversário ideológico potencial, que tem de ser reduzido a uma condição em que não possa fazer muitos estragos. Os professores têm de ser rebaixados a mão de obra barata e com vínculo ou contrato incerto (precariedade, mobilidade e o que mais virá…), a que se devem subtrair os direitos estatutários (vistos, desde MLR, como “intoleráveis privilégios corporativos”), ser sumetidos à ADD e ao seu correlato examocrático (rendibilizar e objectivar o trabalho pedagógico, a tempo inteiro, tornando-o uma técnica que o direcciona e cinge a metas e objectivos mensuráveis e quantificáveis, ao bom jeito taylorista), assim como à hierarquização e formalização das relações, para facilitar o controlo burocrático-administrativo, supervisionado por uma máquina viciosamente rotinada (não implodiu, foi “oleada” e está cada vez mais refinada, e para durar…).
Maio 15, 2013 at 6:46 pm
Mas teremos de lhes mostrar, não que somos fortes em palavras de ordem ou manifestações arquitectadas pelos sindicatos, isto é, que estamos a ser politicamente instrumentalizados ou somos mais um gang corporativo, mas que somos essenciais. O grande combate é demonstrar que sem professores qualificados e motivados nos transformamos no país idiota, pronto a acolher e venerar as demagogias mais abjectas (de esquerda e de direita, todas as que preconizam um “Estado Forte”, que para o ser têm necessariamente de sorver parte, grande parte da liberdade individual).
Os professores são necessários, a qualidade da escola pública não pode descer (porque se o fizer estrutura ainda mais a desigualdades sociais).
Maio 15, 2013 at 6:50 pm
Dava jeito um manual para esta guerrilha.
Maio 15, 2013 at 6:54 pm
o nosso primeiro pensara ser uma encarnação da dama de ferro, é que do ferro nem a ferrugem tem, é um triste!
Maio 15, 2013 at 7:19 pm
Balelas… o que eles desejam mesmo é o voltar a isto…mas desejam mesmo sem falsas ironias ou segundos sentidos..quem disser o contrário ou é tótó ou quer ser cego..OU EXISTEM ALGUMAS DÚVIDAS SOBRE OS CEM QUESTÃO…
http://bulimunda.wordpress.com/2013/05/15/estas-imagens-serao-talvez-as-futuras-aqui-e-nao-la-fora-como-esta-eram-1969-portugal-2-alain-corbineau-musica-luis-cilia/
Maio 15, 2013 at 7:25 pm
digo sobre esta questão???
Maio 15, 2013 at 7:30 pm
De facto, a máquina de controlo dos funcionários está cada vez mais refinada. A hierarquização é e sempre fez parte dos mecanismos de domesticação, mas por natureza também somos uma espécie de ‘domesticadores’. Cabe-nos ser um pouco mais engenhosos que os mineiros, há formas com que podemos ser bem mais convincentes.
Estes cavalheiros parecem querer vender a ideia de que ‘quem sabe faz e quem não sabe ensina’, mas diria antes deles que ‘quem sabe faz, quem não sabe manda fazer’, é assim que têm esbanjado muito do dinheirinho dos contribuintes, falando a linguagem deles.
O eixo do poder confluiu para nos triturar, mas estou farto que me mandem emigrar (com ou sem Schengen) e que me tratem como um incompetente ou uma espécie de inimputável, porque, de facto, não tenho como travar esta maioria de lunáticos preocupados com a auto-gestão das suas pensões e reformas. Mas tenho dignidade e não me conformo ter que recuar aos tempos da Maggie ‘to live on the dole’, para que um sector financeiro (de que alguém lhe anda a cheirar o rasto para dele tirar proventos) me imponha o Diktat que este país não é para os seus cidadãos, mas para bancos, banqueiros, bolsas, agiotas, juros iguais a lucros pornográficos, especulação e demais, e que supostamente não andamos a trabalhar para tudo isto.
Basta, está na hora de mandar bugiar esta pandilha (de preferência para o Gobi) e lhes mostrar um manguito-de-zé-povinho (e – não obrigado – não tenho filiação política, nem vou ter)!!!
Maio 15, 2013 at 7:36 pm
antes de começar a “guerra” que tal os sindicatos gastarem algum €€€€ numa publicidade televisiva sobre o professorado e sua actividade? tipo o que fizeram os enfermeiros
Maio 15, 2013 at 8:11 pm
Triste, triste…a nossa forma de luta! Triste, triste, estar aqui este post, a falar da nossa luta e da guerrilha que devemos travar para levar à queda do inimigo, com tão poucos comentários e sugestões e estar um post em cima sobre o jogo do benfica cheio de comentários sem interesse, vazios e relevantes dos interesses que os professores têm pelos problemas graves que se avizinham nas suas vidas.
É o que o povo quer: Fado, Futebol e Fátima. Este mês já só falta o Fado!
Maio 15, 2013 at 8:20 pm
12. pretor -APOIADO, com arquivo no youtube para se partilhar!
Maio 15, 2013 at 8:57 pm
«E não deveríamos encetar uma forma de luta “criativa” de forma coletiva?»
Até acho que devíamos. O primeiro problema é que o “coletivo” não existe. O que existe é o individual. O máximo a que poderemos aspirar é conseguir uma forma de luta (ou mais) em que participe um número desejavelmente elevado de individuais.
Maio 15, 2013 at 9:02 pm
A guerrilha parece-me bem. mas quando voltarem a cortar o teu salario vais fazer o que?
Maio 15, 2013 at 10:07 pm
Maio 15, 2013 at 10:10 pm
#15,
Os meus sinceros parabéns por tal pensamento, que partilho, vindo de alguém que teoricamente defende o colectivo.
Maio 15, 2013 at 10:25 pm
Este post merecia uma reedição em dia menos futebolístico. A analogia entre Tatcher/mineiros e governo português/professores é muito fecunda e dá que pensar.
E pensar a dicotomia guerra total/guerrilha seria muito importante. Já fui defensora da guerrilha, mas, neste momento, interrogo-me se uma tal forma de luta não terá passado o seu prazo de validade, com todos os perigos que a guerra aberta implica.
valia mesmo a pena discutir o assunto.
Maio 15, 2013 at 10:29 pm
Gostei de ler.
Os “boys” são para ser chamados pelo nome.
Alivia a tensão, liberta o espírito e é verdade.
Demasiada gente se deixa ainda seduzir pela “gireza”, a displicência e o que generosamente chamam sentido de humor destes putos arrogantes e convencidos das “boas famílias”, dos conhecimentos certos, em suma, da direita.
Maio 15, 2013 at 10:35 pm
#19,
Como enviei o texto para o blogue do “Parlamento Global”, ainda voltarei a ele.
Maio 15, 2013 at 10:36 pm
a tacher sonha ser o mao tung ao contrário…
Maio 15, 2013 at 10:44 pm
#21
Óptimo!
Maio 15, 2013 at 10:52 pm