Texto publicado ontem no Sol:
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Metas Curriculares, Ensino Básico, Ciências Naturais
Este documento está eivado de erros conceptuais.
Confunde Geologia e Biologia com Ciência, ignorando que a explicação/compreensão de TODOS os processos geológicos e biológicos vem da Física, a única Ciência de facto, por ser autónoma na procura das explicações dos fenómenos naturais que estuda.
Utiliza o termo compreender em praticamente todos os objectivos, mas os termos utilizados nos descritores não levam à compreensão pretendida. Obviamente por que não está lá a Física.
Não diz como se operacionaliza a Lei, ou seja como se vai trazer a compreensão (Física) para a sala de aula de CN. Sabendo que o comum professor de CN não tem conhecimentos sólidos de Física, conclui-se que poucas metas serão atingidas. Pergunta óbvia: Para que serve então este documento?
Veicula opinião e preconceito, em vez de informação rigorosa, para os alunos poderem, eles próprios, formar a sua opinião e decidir racional e fundamentadamente. Frases como “Relacionar os impactes da destruição de habitats com as ameaças à continuidade dos seres vivos” ou “Compreender a influência das catástrofes no equilíbrio dos ecossistemas” transmitem apenas preconceito, impedindo o aluno de um dia compreender como a vida evoluiu na Terra, que foi fundamentalmente através de grandes desequilíbrios. Distinguir catástrofes de origem natural das de origem antrópica forma na mente do jovem a ideia errada de que o ser humano não faz parte da Natureza. E frases como “Construir documentos sobre medidas de proteção dos seres vivos” só servem para criar no jovem a ideia de que o ser humano é uma espécie de Deus que pode controlar a evolução das espécies. Isto vai contra a tal Natureza que se pretende o aluno compreenda.
Parte do princípio que o actual programa de CN é relevante, definitivo e indiscutível. Mas era por aí que se devia ter começado, por uma reflexão profunda e alargada sobre o que uma pessoa com a escolaridade obrigatória deve conhecer sobre o seu planeta para ter uma atitude social educada e civilizada. Depois se discutiriam as metas, e finalmente as medidas a implementar para a correcta e generalizada transposição da Lei para dentro da sala de aula.
Infelizmente, não me foi dado espaço suficiente para comentar as escolhas do MEC relativamente aos “especialistas” que elaboraram o documento agora homologado. O cidadão comum certamente apreciaria conhecer que competências dos autores fundamentaram a escolha de Nuno Crato. Eu, como especialista em Geociências, gostaria muito de os ter à minha frente para lhes fazer as perguntas que um jovem curioso deveria fazer ao seu professor de CN, não fora a Escola actual destruir por completo toda a curiosidade e criatividade inatas ao ser humano, e tão críticas para o desenvolvimento da Ciência e das sociedades educadas e civilizadas.
Fernando Ornelas Marques, http://idl.ul.pt/marques.htm
Maio 11, 2013 at 10:25 am
“[…] não fora a Escola actual destruir por completo toda a curiosidade e criatividade inatas ao ser humano, e tão críticas para o desenvolvimento da Ciência e das sociedades educadas e civilizadas”. Solidarizo-me. É o que se passa também com o conhecimento e interesse pela Língua Portuguesa, veículo e estruturador do conhecimento e da criatividade.
Esta pedagogia, que não é mais que uma pedagogia do negócio, ignora a competência de quem produz o saber, a pertinência desse saber num dado momento do processo de aprendizagem, ou mesmo a correcção científica desse saber – apenas interessa se os produtores são primos e amigos.
Relembro aqui o que argumentaram os primos, aquando da introdução da malfadada TLEBS, hoje Dicionário Terminológico: “destina-se aos professores”.
Hoje vemos, no terceiro ano de escolaridade, as crianças obrigadas a produzir pérolas como esta (em exercício de completamento, TPC, para a subsequente memorização do disparate): “Uma frase é uma sequência de palavras que se inicia com uma maiúscula e termina num ponto final”.
No secundário, um aluno pronunciar-se-á, olímpicamente e em situação de avaliação, sobre a modalidade deôntica de dever ou obrigação – é obra!
A luta de classe também deveria passar – e, sobretudo, ter passado – pela resistência à formatação acrítica e incoerente dos saberes.
Maio 11, 2013 at 10:29 am
Triste por continuar a ver professores acharem que a sua disciplina é sempre a mais importante e que as outras sem ela são nada.
Depois queixam-se por um ministro dar importância a duas disciplinas e ignorar as restantes
Maio 11, 2013 at 10:46 am
Triste porquê????
Maio 11, 2013 at 10:48 am
le importance c’est la rose…salvo seja..
Maio 11, 2013 at 10:49 am
Maio 11, 2013 at 11:49 am
No tempo da outra andei de candeias às avessas com as do meu sector… resolvi o problema mandando-as às ortigas…
Maio 11, 2013 at 1:44 pm
Por falar em Física…
Alguém ouviu, mesmo que num leve sussurro, algo sobre metas de Educação Física?
A mim vai-me parecendo que esse empecilho já não existe… para gáudio de muito boa gente, a começar pelo exterminador implacável Nunus Castrus. Não é oportuno falar disso?
Tá bem!
Maio 11, 2013 at 7:06 pm
Sem menosprezo pelo direito à liberdade de expressão, a alguém ignorante em Biologia e quase ignorante a Geologia, como eu, este texto parece procurar discutir o sexo dos anjos.
“Confunde Geologia e Biologia com Ciência”
É inabitual encontrar um PhD em Geologia a pensar assim. Então a Biologia e a Geologia não aplicam, quando podem, o método científico? Não são Ciências?
“Utiliza o termo compreender em praticamente todos os objectivos, mas os termos utilizados nos descritores não levam à compreensão pretendida. Obviamente por que não está lá a Física.
Não diz como se operacionaliza a Lei, ou seja como se vai trazer a compreensão (Física) para a sala de aula de CN.”
A Física é, tanto no Básico como no Secundário, a área de maior insucesso e os professores que leccionam CN, como sabe, têm poucos conhecimentos de Física. Admito que uma maior interligação entre os conteúdos das várias disciplinas pudesse facilitar uma melhor compreensão dos fenómenos naturais mas que sabe de Física um aluno do Básico? No 7.º ano, de Física, quase só se fala de Astronomia, no 8.º, de Luz e Som, só no 9.º aparecem conceitos como o de Força, Relatividade do Movimento, Pressão, Impulsão… (e tudo leccionado pela rama).
“Distinguir catástrofes de origem natural das de origem antrópica forma na mente do jovem a ideia errada de que o ser humano não faz parte da Natureza.”
É uma ideia muito grata à ecologia que, como penso que sabe, minou transversalmente muitos dos conteúdos de múltiplas disciplinas. Por exemplo, o dióxido de carbono resultante da respiração humana é considerado natural mas o libertado pelas actividades humanas (indústria, transportes, etc.) é considerado antropogénico. A ecologia ainda alimenta a utopia do “bom selvagem”, sem indústria, sem tecnologia, sem conhecimento, sem religião e sem cultura, excepto a incluída na respectiva cassete produzida nas Lojas.
“Parte do princípio que o actual programa de CN é relevante, definitivo e indiscutível.”
Esta foi uma opção transversal a todas as disciplinas. Entendeu o MEC, por via das Metas introduzir pequenas alterações aos conteúdos programáticos, em vez de os repensar (como eu também preferia). Talvez ache (o MEC) que esta é uma tarefa futura, para debater com mais tempo.
Finalmente, quanto aos “erros conceptuais”, eles não resultam apenas das Metas, no caso da minha disciplina, são intrínsecos ao próprio programa (de onde elas emanam) ou mesmo intrínsecos à própria Ciência (que por eles se deixou minar) e não é a presença da Física que os vai resolver (pelo menos a todos). Dou-lhe dois exemplos: o conceito de “camada de ozono” é errado porque não há camada nenhuma, apenas moléculas (mais abundantes a baixas latitudes e escassas a altas latitudes) criadas a determinada altitude e destruídas uns quilómetros mais abaixo; o conceito de “gases com efeito de estufa” é errado porque o efeito de estufa pressupões uma barreira física que impede a convecção e a atmosfera, tenha ela a composição que tiver, é uma camada gasosa onde a transferência de energia se dá maioritariamente por convecção. Mas como vamos explicar isto a alunos do Básico se até alguns universitários têm dificuldade em compreender.
Em resumo, estas metas são (com todas as imperfeições que lhes encontremos) para o Ensino Básico e visam, apenas, ajudar a clarificar um pouco o que se pretende que os alunos saibam no final de determinado ano de escolaridade, coisa que o Programa não permitia.
Maio 11, 2013 at 7:51 pm
Este Sr foi meu professor na faculdade, um dos mais complicados de lidar e compreender.