Há quem tenha um especial prazer em, através de detalhes linguísticos e mutações de acrónimos, dizer que coelho não é láparo, não.
É o que se passa com os negócios em torno do que de mais essencial motivava muita gente, em muitos locais, para o projecto do TGV.
Não era propriamente o emprego de uns milhares de trabalhadores durante uns anos, a incorporação de tecnologia nacional no projecto e muito menos a sua utilidade para a população em geral e para o trucidado interesse nacional.
Um dos grandes negócios do TGV – talvez o maior ou mesmo o que mais rápidos lucros geraria – é o do imobiliário, o da posse dos terrenos por onde viria a passar que assim subiam exponencialmente de valor para quem os possuísse. Daí tanta disputa em torno do trajecto, daí tanta mudança de mãos de propriedades em várias zonas do país, de velhos proprietários de terras que pareciam sem utilidade e valor, muitas vezes em RAN ou mesmo REN, sem hipótese de rentabilização a curto prazo, nem mesmo com base numa raquítica agricultura.
Cruzando-se de uma forma curiosa com tudo isto temos a questão do BPN e da SLN, dos seus negócios, dos seus principais devedores e da razão de algumas imparidades ou, em bom português, dos buracos no banco e nos meios de certas personagens da história pequena.
O que quase toda a gente parece desinteressada em seguir é o rasto efectivo do dinheiro, porque aqueles devedores devem tanto, onde aplicaram os empréstimos certos empreendedores que se identificam, assim como às empresas. Mas que, apesar de meses de investigação para a SIC e outro tanto, quiçá anos, para os jornais, nunca chegam exactamente aos negócios em concreto onde muito desse dinheiro foi usado e ficou meio perdido, porque o retorno esperado se esfumou quando a necessidade de certas propriedades – e a sua valorização em 300, 400, 500% – pareceu volatilizar-se.
Fala-se agora no comboio de alta velocidade para mercadorias, que responde pelo acrónimo LTM (linha de transportes de mercadorias) e que, em relação ao TGV, é mais barato em termos de estrutura, recebe mais comparticipação da Europa em termos relativos mas que… no essencial… precisa dos mesmos terrenos.
O que significa que, no meio disto tudo, se continua a sacar dinheiro à Europa para fazer algo em que se desinvestiu em todo o país, de utilidade económica duvidosa, de manutenção com elevados encargos, para fazer uma linha que irá precisar de pagar generosamente, talvez apenas um pouco menos generosamente, a quem investiu sofregamente em terrenos em várias zonas do país, com autarquias das mais diversas cores, pelo menos três delas, nas quais os tais empreendedores (muitos com empréstimos e negócios validados pel@ BPN/SLN) se movem com facilidade e têm um peso mais relevante na condução das campanhas eleitorais locais do que muitos grupos de cidadãos.
Só para os distraídos tudo isto surge em momento crucial do processo eleitoral para as autárquicas.
Da escala macro (canalização de dinheiros europeus) à escala micro (interesses imobiliários locais com reflexos nas finanças municipais), passando pelos truques de linguagem dos secretários de Estado de ocasião na função de intermediários, o negócio-base do TGV, em tudo o que ele tinha de ligações aos buracos de certa banca de sucesso, está perfeitamente vivo.
Fevereiro 9, 2013 at 10:44 am
http://bulimunda.wordpress.com/2013/02/09/o-homem-e-a-maquina/
Fevereiro 9, 2013 at 11:12 am
muito bem!
Fevereiro 9, 2013 at 11:40 am
é uma grande, disfarçada verdade…..
tem sido a ganancia de uns a deserdar a vida de muitos.
Fevereiro 9, 2013 at 12:44 pm
Que os proprietários rurais prefiram viver de rendas ou lucros fáceis, em vez de rentabilizarem as suas terras, não admira quem a conheça minimamente a história deste desgraçado país e a qualidade das suas elites.
Já tenho algumas dúvidas em relação aos valores a pagar pela expropriação de solos agrícolas e florestais, muitos dos quais provavelmente nem estão a ser devidamente aproveitados. Serão assim tão elevados, como se sugere? Ou atingir-se-ão esses valores apenas porque atravessam latifúndios?
Quanto ao projecto ferroviário, como leigo mas ao mesmo tempo curioso nestas matérias, parece-me uma vez mais uma coisa sem nexo, disparatada como costumam ser estes projectos decididos por políticos que não gostam de comboios nem percebem como funcionam e para o que servem realmente.
As linhas de alta velocidade são para transporte de passageiros, não faz sentido o conceito quando o que se pretende transportar são mercadorias. Também não faz sentido construir novas linhas por causa da bitola europeia, pois em primeiro lugar só interessa termos comboios a operar neste tipo de linha se ela tiver seguimento do outro lado da fronteira. Em segundo lugar, qualquer linha de bitola ibérica pode funcionar em bitola europeia, bastando para isso adicionar um terceiro carril. E há ainda a hipótese de usar eixos intercambiáveis, que se adaptam aos dois tipos de bitola. Enquanto por cá se vai dando emprego a especialistas de gabinete, em Espanha desenvolveram já a tecnologia que permite fazer isto até com os comboios em andamento.
Por outro lado, também se deve questionar um outro ponto, que liga com a questão fundiária que o Paulo aqui levantou: se a ligação ferroviária de mercadorias para Espanha é prioritária, faz algum sentido ter-se desactivado nos últimos anos a ligação entre Évora e Estremoz, que existia há mais de 100 anos e poderia servir precisamente para esse fim, desde que fosse prolongada até à fronteira do Caia?
Bom, neste ponto as coisas parecem fazer sentido: não interessa aproveitar e melhorar o que temos, como se faz em Espanha, faz-se de novo porque é daí que nascem as “sinergias” interessantes com os interesses e os negócios dos amigalhaços. Ainda que tudo isto signifique desbaratar de recursos públicos, endividamento a longo prazo, mau ordenamento do território.
Fevereiro 9, 2013 at 12:45 pm
O Factor E é muito importante.
A Espanha, além de vários outros interesses, é produtora de tgv’s
Esta é apenas uma das empresas
http://www.talgo.com/index.php/es/home.php
espanholas ligadas ao negócio.
Através deste artigo vê-se bem o poderio espanhol:
http://www.publico.pt/economia/noticia/espanhola-renfe-lidera-consorcio-para-construir-tgv-entre-medina-e-meca-1505386
E por cá quantos amigos da Espanha não enriqueceram: um dos que dançava sevilhanas e tocava castanholas está agora em paris…
Fevereiro 9, 2013 at 12:59 pm
Há muita gente que já se esqueceu, mas convém lembrar que PPC – enquanto candidato à liderança do PSD – foi contra a posição de Manuela Ferreira Leite, que denunciava sem rodeios a megalomania do projecto TGV, e alinhou no discurso do “optimismo” associado a esse “projecto de futuro”, que embalava o socretinismo.
PPC, no fundo, não consegue também aqui esconder a sua íntima ligação (os socretinos eram apenas “cúmplices estratégicos de ocasião”) com os grandes interesses empresariais, partilhando a mesma perspectiva de “desenvolvimento económico” que convém àqueles.
E a juntar a isto, temos outro dado fundamental: a consaguinidade do PSD, do seu aparelho que está representado em força no governo através de Relvas (também por isso este não é “remodelado”…), com grande parte do poder autárquico.
Tivesse PPC uma conjuntura financeira mais favorável e vocês haviam de ver o que acontecia com o TGV…
Fevereiro 9, 2013 at 1:01 pm
#5
A Espanha, que é neste momento o país europeu com mais km de linhas de alta velocidade, está a fazer a aposta certa. Não temos que os invejar, ou temer o “perigo espanhol”, temos é de questionar os nossos decisores pelas apostas erradas que andaram a fazer nesta matéria.
O nosso país tem tido uma péssima política ferroviária. Tivemos uma empresa, a Sorefame, que chegou a ser referência mundial na produção de material ferroviário em aço inox, exportando para vários países, e permitimos que desaparecesse. Agora os comboios, se os quisermos, teremos sempre que os comprar feitos, pois não temos infraestruturas nem o know-how para os produzir.
A Espanha precisou da tecnologia francesa e alemã para produzir os seus primeiros AVEs, que contudo foram fabricados em Espanha. Daí para a frente foram-se autonomizando, e muito bem. A China também faz o mesmo, inicialmente comprou à Alemanha mas agora produz os seus próprios comboios de alta velocidade.
Nós por cá, vamos vivendo à custa de retórica sobre a “sociedade do conhecimento”. Preferimos comprar feito, na ilusão de que somos ricos e fazemos dos que trabalham para nós nossos criados. E temos muitos engenheiros a administrar e a gerir, mas poucos a projectar e menos ainda a meter as mãos na massa e a ver se a coisa funciona…
Fevereiro 9, 2013 at 1:12 pm
#6
Há aqui um aspecto importante: os comboios de alta velocidade fazem todo o sentido, sobretudo num continente relativamente pequeno e densamente povoado como é a Europa.
Mesmo num país periférico como Portugal, o que não faz sentido, em termos económicos e ambientais, é a ligação aérea Lisboa-Porto. Para já não falar nas 3 auto-estradas paralelas entre os mesmos destinos.
Agora se os comboios devem andar a 250 ou a 300 km/h, se devem fazer ligações directas ou unir estações intermédias, o trajecto, a bitola, etc, isso são outras questões, que também devem ser discutidas.
Eu sou contrário à construção de uma linha de “TGV” para Espanha, não porque pense que ela não deva existir, mas porque percebo claramente que não existe mercado para ela e que viria inevitavelmente pesar nas nossas depauperadas contas públicas.
Agora, se gostaria de viver numa sociedade em que a maioria da população tivesse rendimentos para viajar e passar férias fora de casa, usando não só o carrito utilitário mas também o comboio e o avião quando se justifica? Claro que sim. E é aqui que a rede de comboios de alta velocidade entra…
Fevereiro 9, 2013 at 1:14 pm
CONCORDO PLENAMENTE COM O ANTÓNIO DUARTE…
Fevereiro 9, 2013 at 2:22 pm
# 7. e 8 #.
Eu limitei-me a indicar que um dos interesses por trás do TGV é a indústria e a política espanholas.
Quanto à construção das linhas em Portugal, seria um excelente negócio para muitos. No fim ficaríamos com um problema financeiro equivalente a 100 CP’s… ou 10.000 estádios de Leiria, Aveiro e Faro…
Claro que daqui a 20 anos teríamos o Godinho e o Sócrates a concorreu com um consórcio para desmantelar as linhas e reciclar os materiais. Era mais um bom negócio…
Fevereiro 9, 2013 at 2:58 pm
Comento com base em casos que conheço relativamente de perto, até porque um deles não dista muitas centenas de metros do meu trajecto habitual…
http://umportodostodosporum.blogspot.pt/2007/07/protocolo-cm-moita-imomoita-sa-s-as.html
http://umportodostodosporum.blogspot.pt/2008/11/cm-moita-argumentou-propsito-do-tgv-o.html
etc
Fevereiro 9, 2013 at 3:16 pm
Chegou a altura de dizer basta a estes politiqueiros.
O povo tem de começar a fazer a seleção!..
Vai ser simples.
Basta atear o rastilho!…
O descontentamento generalizado do povo tem limites!..
Parece que os politicos que nos governam não sabem disso.
Basta começar numa ponta e terminar na outra!..,
Depois, quando acordarem, já será tarde.
O mal já estará feito e não haverá volta a dar!…
Viva Portugal.
Fevereiro 9, 2013 at 8:02 pm
E outra coisa que não vejo debater é o seguinte:
Dizem agora quie essa linha LTM seria para aumentar as nossas exportações.
Ora, que eu saiba, as exportações fazem-se por mar, por estrada, por comboio, por ar. Já temos estradas melhores e têm servido sobretudo para outros paísee virem cá para colocar os sue produtos (tinham certamente pavor ás nossas antigas estradas sinuosas). Temos os portos a exportar mais e a funcionar com mais dinamismo. (mas também importam). Os comboios que temos poderiam também para exportamos mais e serem tentablilizados, mas há aquela coias das remalditas linhas de bitola ibérica que sempre atrapalhou muito. (e deixando-nos reféns da Espanha).
De avião, não sei, mas não deve ser grande o uso dessa via (mais cara, claro).
Se fizerem o tal comboio de mercadorias até Madrid, claro que exportariamos por lá, em princípio.
NO entanto, vejamos melhor:
1- Então porque não expostamos na mesma usando as linhas que já temos, pois para esta a questão da bitola ibérica mantém-se;
2- Se a linha partirá de Lisboa e de (reparem) SINES, é porqure não é para levarmos para a a Europa os nossos produtos, mas aqueles que v~em da china e por mar de outros produtores (nomeadamente de empresas alamãe e outras que laboram na china e outros paísee emergentes).
Estaremos portanto a favorecer, sobfetudo as IMPORTAçÕES e a exportações de outros e não as nossas exportações.
“penso eu de que”…
Fevereiro 9, 2013 at 8:04 pm
corrijo:”poderiam também servir para exportarmos mais e serem rentabilizados”….
Fevereiro 9, 2013 at 8:05 pm
por favor não reparem nas restantes gralhas (vou rifar este teclado!)
Fevereiro 9, 2013 at 11:30 pm
Sigla vs acrónimo… in dicionário terminológico – http://dt.dgidc.min-edu.pt/
Sigla
Palavra formada através da redução de um grupo de palavras às suas iniciais, as quais são pronunciadas de acordo com a designação de cada letra.
Partido Comunista Português -> PCP;
Partido Social Democrata -> PSD;
Sporting Clube de Portugal -> SCP.
Acrónimo
Palavra formada através da junção de letras ou sílabas iniciais de um grupo de palavras, que se pronuncia como uma palavra só, respeitando, na generalidade, a estrutura silábica da língua.
Fundo de Apoio às Organizações Juvenis -> FAOJ
Liga dos Amigos da Terceira Idade -> LATI
FEderação Nacional de PROFessores -> FENPROF
Fevereiro 9, 2013 at 11:36 pm
São hilariantes, se não fossem perigosas para os distraídos, as opiniões sobre agricultura – baseadas na heróica e exemplar experiência da reforma agrária soviética causadora da morte de milhões de pessoas à fome – , bem como sobre os meandros ferroviários nacionais – baseados nas greves que os sindicatos comunistas da CP fazem todas as semanas desde há mais de um ano e que, aliás, causaram a baixa de 11,5 % de passageiros e de 222 milhões de euros de prejuízo em 2012. Prejuízo que os contribuintes, incluindo os professores, pagam pontualmente através dos descontos nos seus vencimentos.
E aproveita todo e qualquer pretexto – mesmo que o poste nada tenha a ver com o assunto – para debitar na caixa de comentários a cassete vermelho-fascista sobre as vantagens do modelo de regime que a História documenta só ter provocado fome e miséria à Humanidade.
Para discutir o tema lançado pelo poste, convinha falar nas Câmaras da CDU que são tão entusiastas com a passagem do TGV nos terrenos do respectivo Concelho. Para percebermos que o entusiasmo das câmaras PS e PSD é movido pela mesquinhez da negociata, enquanto que o entusiasmo das câmaras da CDU já é movido pelo interesse colectivo e pelo progresso dos povos. Essa é que era a questão em discussão.