O grande argumento da Demografia Negativa contra a necessidade de professores – que esquece, há sempre que o repetir, que o número de alunos não é apenas condicionado pelos nascimentos – é quase sempre o da evolução discordante entre o número de alunos e o de professores.

É um argumento que faz por esquecer que a aritmética simples não explica outras coisas. Por exemplo… se existirem 1000 alunos com 20 horas semanais de aulas para 6 disciplinas precisa-se de um número de professores menor do que 800 alunos com 30 horas semanais para 8 disciplinas. Ou que a dimensão das turmas, os desdobramentos para práticas experimentais ou outras actividades (funcionamento das Bibliotecas, Desporto Escolar, Educação Especial integrada nas escolas normais e não em instituições específicas) implicam um maior número de professores para um número equivalente de alunos.

Mas para isso é preciso saber como funcionam as escolas, em particular as públicas e não apenas olhando para elas com velhos traumas ou com os preconceitos de quem espreita para o subúrbio pela janela do colégio de elite. Este argumento é de tipo provocatório, porque alguns comentadores enveredaram por argumentos relacionados com o carácter ou a coragem de quem aqui escreve e optaram por falar em claque, esquecendo-se da sua. A esse tipo de provocação desnecessária responde-se na mesma moeda porque não sou cristão, muito menos mártir.

Mas vamos lá à evolução do número de alunos. Escuso de estar sempre a remeter para as fontes que identifiquei aqui.

Vou centrar-me no ensino público porque foi aquele que o actual PM considerou ter excesso de professores, pois até referiu que esse excesso não estava em condições de ser absorvido pelo sector privado.

Alunos do pré-escolar:

Mais 127.400 crianças entre 2000 e 2010, que resultam do alargamento da rede, mas esse não é um mal, mas sim um benefício. A rede privada também aumentou a sua cobertura no mesmo período.

Agora os números do Ensino Básico:

Perda próxima dos 50.000 alunos. Não vale a pena começarem a falar aqui das NO, porque essa modalidade é residual no 2º CEB. O que passou a existir foram cursos PCA e CEF em maior quantidade, mas os alunos estão quase sempre dentro da idade da escolaridade obrigatória ou, actualmente, ainda não entram em processos de RVCC, como é óbvio.

Passemos agora ao Secundário:

Mais cerca de 15.000 alunos. Podemos discutir a qualidade dos cursos EFA mas a verdade é que os alunos lá estão e, actualmente, estão dentro da escolaridade obrigatória alargada para 12 anos por uma coligação unanimista. Outra coisa interessante é que quando se fala no aumento de alunos em vias alternativas se esquece que isso se fez muitas vezes à custa do emagrecimento do trajecto dito regular. Muitos alunos transitaram de uma via para outra na última década e muitos só continuaram estudos com a existência de cursos profissionais. Repito: podemos criticar a qualidade dos cursos, mas a verdade é que esse é um argumento que não está a ser usado. Com o que o actual PM, o ministro Relvas, o eurodeputado Rangel e certos nichos da blogosfera acenam é com o argumento da quantidade. Logo, aguentem-se com ele.

E aqui não estão as NO pós-23 anos.

Resumindo: em 2000 existiam 1.588.177 alunos e em 2010 existiam 1.581. 049. São menos 7.128 alunos. Se a 200 atribuirmos o índice 100, o ano de 2010 representa uma descida para o índice 99,6.

Passemos então aos professores no ensino público.

Assinalemos a curiosidade de na Pordata se contabilizar o total de professores e, separadamente, os do sector privado, mas não se desagregarem os do ensino público.

Não há problema trata-se aqui disso.

Vamos lá então:

Em 2000 existiam 175.209 docentes, 19.859 deles no sector privado e, fazendo a continha que a Pordata não faculta, 155.350 na rede pública.

Em 2010 existiam 179.956, 23.428 no privado, 156.528 no público.

A evolução foi de mais 4747 docentes, 3569 deles no sector privado e 1178 no público. Surpresa? Nem tanto, para quem anda por dentro do assunto.

Em termos de índices, o total tem uma evolução de uma base 100 para 102,7, sendo que no sector privado para 118 e no público para 100,8.

Foi neste período que o currículo do 2º e 3º CEB engordou com as ACND e se dispersou. Houve perda de horas em algumas disciplinas, mas globalmente, as horas lectivas aumentaram. Com mais 1178 docentes em exercício.

Apesar disso os professores em exercício aumentaram menos de 1%, enquanto os alunos diminuíram 0,4%.

Percebe-se por estes números que foi um verdadeiro forrobodó, um pletórico bodo aos zecos que estiveram durante a maior parte do tempo com a progressão e os salários congelados tendo permitido baixar em mais de 10 pontos os encargos do Orçamento do ME com o pessoal docente (foram mais, mas agora não me apetece ir à procura dos números exactos).

Mas pronto… sou obrigado a dar razão aos insurgenteshá uma evolução diferencial entre alunos e professores de 1,2 pontos desde 2000.

Mas nesse caso, para as linhas serem concordantes, teríamos um excesso actual de apenas 1500 docentes, mais coisa, menos coisa. E teríamos de esquecer a tal coisa da obesidade do currículo.

Claro que podemos remontar aos anos 90, mas nesse caso vamos cair nos governos de Guterres, mas também nos de Cavaco. E, provavelmente, podemos ter surpresas curiosas.

Ou podemos remontar aos anos 60, ao período em que a 4ª classe era o limite da escolaridade obrigatória.

Mas não me parece que isso seja corajoso ou, mais importante, intelectualmente honesto. Porque os professores formados que estão agora alegadamente em excesso já o foram depois de 2000 e não antes. E nenhum governo estancou o afluxo de novos professores ao mercado de trabalho. Muitos deles com curso específico de professores, não com um curso em área disciplinar específica com posterior especialização na docência, como é o meu caso.

E porque o alargamento da escolaridade para 12 anos faz prever um aumento de, pelos menos, uns 25% de alunos a ingressar no Secundário, pois era um valor dessa esscala o dos alunos que não faziam a transição do 9º para o 10º ano antes de 2009/10.

Mas espero que isto não seja demasiado complexo… que não exceda a coragem de somar e subtrair, multiplicar e dividir com a ajuda da Pordata.