Ficam aqui as perguntas e respostas que me foram feitas, já há umas semanas, para a peça que saiu ontem na revista Tabu do Sol:
O tipo de indisciplina que se verifica hoje nas escolas é muito diferente do que existia há 20 anos?
Tem algumas características diferentes. Neste momento os comportamentos que podemos categorizar como “indisciplina” (um pouco como a violência) são mais aleatórios, nem sempre se percebendo a origem, o que os provoca.
O que é que mudou?
Mudou principalmente a atitude dos alunos, que ao sentirem-se quase inimputáveis e desresponsabilizados pela sua conduta, afrontam com enorme facilidade quem tenta que eles cumpram regras básicas de civilidade, essenciais para o funcionamento de uma aula.
Quais são as formas mais comuns desta indisciplina?
A interrupção, completamente a despropósito, das actividades lectivas com palavras ou actos sem qualquer nexo com a aula. Há alunos que chegam à aula em amena (ou agitada) conversa e assim continuam mesmo depois do início formal da aula, desafiando abertamente qualquer indicação ou pedido para pararem. O mesmo se diga para incidentes ou disputas verbais (e por vezes físicas) entre alunos ou alunos e professores, em qualquer momento da aula.
A autoridade dos professores dentro das escolas diminuiu? De que forma?
Diminuiu de forma simbólica, na sequência de todo o discurso que deslocou para o professor a responsabilidade por tudo o que corra mal no desempenho ou comportamento dos alunos, e de forma efectiva com a burocratização dos procedimentos sancionatórios.
Que mecanismos tem um professor à sua disposição quando um aluno se recusa a cumprir as suas indicações?
Em termos ideais deve tentar convencê-lo, quase seduzi-lo para esse cumprimento. Em termos concretos pode mandá-lo sair da sala, marcando-lhe uma falta de natureza disciplinar, acompanhada por uma participação de ocorrência a entregar ao Director de Turma. Actualmente é cada vez mais usual ser necessário enviá-lo para um espaço da escola (sala de estudo ou gabinete com designação variável) com uma tarefa para fazer ou mesmo para produzir uma reflexão escrita sobre o incidente.
Que mecanismos deveriam ser introduzidos no Estatuto do Aluno para diminuir a indisciplina?
Desde logo um esboço de tipologia – não exaustiva – da gravidade dos actos praticados com uma proposta-base de sanção.
Por exemplo nos casos de agressão física, não deve ficar no vazio o tipo de sanções a aplicar, ou ao arbítrio subjectivo dos decisores a nível local. Pode existir alguma autonomia mas é inconcebível que certos actos de evidente gravidade possam merecer sanções quase simbólicas.
Para além disso, seria muito importante reforçar a componente ética do trabalho dos alunos na escola, reforçando os seus deveres de respeito para com colegas, funcionários e professores em termos claros e concisos. Devolver a dignidade ao trabalho responsável e empenhado e deixar de lado o jargão desculpabilizante que permanece em alguns artigos.
Já viveu na pele uma situação complicada de gerir em termos disciplinares? Como é que a resolveu?
Em termos pessoais de sala de aula nunca tive um problema extremamente grave por resolver, talvez por leccionar o 2º ciclo há mais de 15 anos. Mas já tive alguns casos de alunos, mais velhos em virtude de sucessivas repetências, que tentaram recusar-se a seguir as minhas indicações. Nesses casos, interrompo a aula e exponho com alguma clareza as regras de funcionamento da aula enquanto espaço de respeito mútuo, descrevo o comportamento tido e confronto os alunos com a sua responsabilidade. Se não mudam de atitude, mando-os sair da sala durante um período de tempo variável, podendo mandar que regressem antes do final da aula.
Chegam ao seu blogue muitos testemunhos de professores preocupados com a indisciplina?
Sim, quer situações concretas, quer lamentos mais gerais sobre o “ambiente” que se vai vivendo nas escolas.
Quais são os relatos e os desabafos mais frequentes?
Os relativos a atitudes de aberta confrontação na sala de aula, quer em relação às indicações dos professores como em relação ao respeito devido aos colegas.
Também o desabafo mais generalista sobre o clima de desresponsabilização que se sente na atitude de muitos alunos e turmas, em especial quando validada pelo apoio implícito de encarregados de educação que consideram que os seus educandos são incapazes de cometer os actos que efectivamente cometem.
Até hoje, qual o impressionou mais?
Há tantos casos particulares que é muito difícil escolher. Relembro casos emblemáticos ao longo de 20 anos de carreira, como o do professor que, perante a agressividade de uma turma, tentou sair para pedir ajuda ao então Conselho Directivo, sendo barrado por alguns alunos e, na sequência de os tentar afastar, ainda foi acusado de agressão.
Ou o de colegas que, ao deslocarem-se nos corredores, foram esbofeteado(a)s ou empurrado(a)s “casualmente” por alunos que depois alegam sempre essa mesma “casualidade” para não serem castigados.
Mas o que mais impressiona mesmo são as descrições de desespero e impotência quando o “clima de escola” é de complacência para com estes actos, desencorajando-se de forma mais ou menos insistente a apresentação de participações disciplinares.
Maio 16, 2010 at 10:17 pm
O que dizer?
Está aqui tudo: a verdade nua e crua, contada por alguém que está dentro.
Logo, isto é incontestável.
Tem a assinatura do Paulo, mas podia ter de qq professor.
Maio 16, 2010 at 10:38 pm
# 1
Liderança.
Maio 16, 2010 at 10:56 pm
http://bulimunda.wordpress.com/2010/05/16/exclusivo-bulimunda-servidao-humana-episodio-1-de-5/
Maio 16, 2010 at 11:02 pm
Até amanhã pessoal…sonhos libertários…
Maio 16, 2010 at 11:06 pm
Eu sou mais claro: determinados comportamento têm de ser sacionados com a expulsão da escola; não a transferência para outra; pura e simplesmente a expulsão.
E não me venham dizer que nada resolve e que o aluno fica na rua e blá… blá… blá…
Manter esse tipo de alunos na escola não impede que trilhem o caminho do crime; pelo contrário, mantê-los lá só serve para potenciar a violência e o crime no espaço escolar e não impede os seus comportamentos na rua.
Maio 16, 2010 at 11:23 pm
1) “Mudou principalmente a atitude dos alunos, que ao sentirem-se quase inimputáveis e desresponsabilizados pela sua conduta, afrontam com enorme facilidade quem tenta que eles cumpram regras básicas de civilidade, essenciais para o funcionamento de uma aula.”
2) “… o discurso que deslocou para o professor a responsabilidade por tudo o que corra mal no desempenho ou comportamento dos alunos, e de forma efectiva com a burocratização dos procedimentos sancionatórios.”
3) “Devolver a dignidade ao trabalho responsável e empenhado e deixar de lado o jargão desculpabilizante que permanece em alguns artigos.”
E com estas frases está tudo dito.
Maio 16, 2010 at 11:23 pm
Está tudo dito e tudo explicado.
Maio 16, 2010 at 11:49 pm
Que ganham os miúdos que não são sujeitos a contrariedades? A ilusão de um mundo que depressa descobrirão que não existe?
Dito isto: há muito de negação – para não fugir às palavras – no acto de educar. A principal parcela cabe à família, que deve encontrar a coragem e o desejo de comprometimento que essa negação arrasta consigo. Secundariamente, os professores não podem furtar-se a esse dever.
O papel do Estado, ainda que o ensino seja privado, é o de caucionar o papel do professor, que é afinal um seu agente, dando-lhe os meios de acção de que necessita – excedendo estes, claramente, o salário no fim do mês – mas, acima de tudo, dando-lhe razões para ter confiança no exercício da sua profissão.
É a segunda vez em pouco tempo que uso a palavra confiança… Mas sinto que a raiz do problema está aí: na retirada da confiança nos professores, que foram deixados à sua sorte, pelas palavras públicas e actos legislativos de políticos ignorantes e irresponsáveis.
Maio 17, 2010 at 12:19 am
O eduquês está irremediavelmente impregnado no discurso sindical. Exemplo:
Maio 17, 2010 at 3:23 am
#5
Penso o mesmo.
Até o actual Estatuto ser aprovado, os alunos maiores de 15 anos podiam ser expulsos. Mas na última revisão todos os partidos da Assembleia da República concordaram com o fim das expulsões.
Maio 17, 2010 at 9:04 am
Estou numa escola onde mandar o aluno “para a rua” (sala de estudo, biblioteca,…)com participação disciplinar e respectiva falta, inviabiliza a “excelência” porque, supostamente, deveríamos resolver o problema sem chegar a tanto, conversando com o aluno, cativando-o, persuadindo-o a portar-se bem.
Quando confrontei alguns colegas dessa escola com este facto, perguntando-lhes como é que tinham definido este critério de avaliação de desempenho, não sabiam. Desconheciam os critérios de avaliação da sua escola. E foram avaliados pelos mesmos. E perguntei a muitos… Estranho não é???
Ainda disse a alguns que, quando a polícia me mandou parar porque ía em excesso de velocidade (não muito – ía atrasada para as aulas…), os srs agentes também me procuraram dissuadir e conversar comigo para que não o voltasse a fazer. Disseram-me: “Sabe porque é que a mandámos parar? Documentos. Vai ser autuada.”. Fiquei convencida.
Maio 17, 2010 at 9:08 am
Havia-se de fazer um apanhado de relatórios de ocorrências e participações disciplinares e respectivas consequências. Era capaz de dar um compêndio interessante…
Maio 17, 2010 at 9:10 am
Vou… trabalhar.
Maio 17, 2010 at 9:23 am
#9
A escola enquanto espaço e socialização corresponde a uma política de transformação do espaço educativo numa extensão da segurança social.
Esta política começou a ser levada à prática, de forma sustentada, com Ana Benavente, colega espiritual dos que viam e vêem na escola um simples aparelho ideológico do Estado.
Nesta perspectiva, a missão da escola é a de fabricar moldes humanos para as necessidades do Estado, onde se despejam todas as idiotices úteis à reprodução da Nomenklatura e à acumulação do capital.
Daí a necessidade de destruir os potenciais focos de resistência ao domínio do capitalismo de estado, que passa a ser designada de “resistência à mudança”.
A dialéctica da inclusão é
Maio 17, 2010 at 9:29 am
cont.
A dialéctica da inclusão (à portuguesa) é por isso uma versão soft da sociedade sem classes para tótós alienados por muitos anos de depressão intelectual e experiências traumatizantes na infância.
Maio 17, 2010 at 10:57 am
O que mais me chateia é que a questão da indisciplina nas escolas já se tornou um dado adquirido para toda uma quantidade de intelectuais e analistas bem pensantes. Vulgarizou-se ideologicamente aquilo que é inadmissivel em qualquer espaço escolar ou em qualquer instituição. A crise de valores é profunda porque está no cerne da nossa alma após 35 anos de regime dito democrático. Moldou-nos o cérebro e fez-nos seres cheios de esterco intelectual.
Não é de admirar quando há deputados que furtam gravadores e nada lhes acontece e nem sequer têm a dignidade de se demitirem.
PORTUGAL está podre! MUITO PODRE!
Maio 17, 2010 at 11:46 am
Todos Temos Culpa Quando Fingimos Para (Sobre)Viver…
… e só nos sobressaltamos quando o dramatismo chega ao cenário mediático.
(…)
Culpados? Somos praticamente todos.
Vamos lá, por uma ordem que talvez vá do geral para o particular.
Uma sociedade imbuída de uma ideologia que proclama e não pratica valores éticos ou quaisquer que sejam, dominada por varas & ruispedros depois dos outros se terem servido na década anterior. Uma ideologia servida à mesa por aqueles pseudo-libertários herdeiros de 68 que, na maior parte, só queriam ser eles a mandar e que mandam relativizar porque sabem que o seu trajecto não suportaria análise apurada. Proclamam-se inclusivos para que eles se possam incluir. De forma vitalícia.
Um modelo de escola dita inclusiva que passou a misturar tudo e nada, servindo a todos e a ninguém, numa indiferenciação cheia de matizes burocráticos que nada distinguem, apenas servindo de corredores para um sucesso certificado. Uma escola onde se faz desaguar tudo, não percebendo que para isso são necessários espaços e pessoal técnico que não se pode resumir a funcionários e professores, mais um psicólogo para 1500 ou 2000 crianças e tomem lá um ou dois docentes do chamado Ensino Especial para se desenrascarem. Uma escola onde os professores são obrigados a fazer tudo e onde os directores são avaliados como excelentes se fizerem funcionar um par de CEF medíocres. Um modelo de escola que não tem fronteiras com nada, onde tudo cabe.
Um número assinalável de responsáveis pela gestão da escola que mascaram activamente os números de ocorrências graves nas escolas para não terem problemas para cima. Que para isso são capazes de convencer docentes a não apresentarem queixas, a não as passarem a escrito, ou que as fazem desaparecer depois de apresentadas. Que preferem o diálogo, ou que têm a distinta lata de negar as evidências ou então de afirmar que não há provas. As provas que eles fazem o favor de filtrar para um ME que daí lava as suas mãos. Tudo com cobertura açucarada de especialistas em depurar estatísticas em nome da dificuldade em categorizar comportamentos ou aplicar conceitos.
Um grupo alargado de docentes que, para sua própria defesa, muitas vezes optam por sobreviver no trajecto entre a sala dos professores e a sala de aulas ignorando o que se passa em seu redor, falando quantas vezes entre si, olhando-se nos rostos, para evitarem o mundo ao redor, para poderem dizer que não se aperceberam. Que muitas vezes já procuram sobreviver ele(a)s mesmo(a)s até à aula seguinte, ao dia seguinte, ao fim de semana. É a verdade num número muito vasto de escolas, não vale a pena mascararmos os factos reais com representações oficiais, feitas de números filtrados em vários patamares da cadeia de comando.
Mas não esqueçamos as sacrossantas famílias ou o que resta delas, enredadas numa vida dura, igualmente sem grandes referenciais, mas que não justifica o absentismo moral ou ético na educação dos seus filhos. Que não pode revelar-se apenas quando um professor ou director de turma toma uma atitude mais firme. E não falemos apenas das chamadas classes perigosas de outros tempos. Há muito bom e aperaltado burguesinho que é tão ou mais besta quadrada quanto aqueloutro que ele despreza quando se cruza na rua. O que dizer daqueles que só aparecem na escola quando se levanta um processo disciplinar, em defesa do seu rebento que nada fez, de certeza que não foi ele, que a culpa é de tudo menos da educação e valores que não soube transmitir. O que dizer das famílias que têm como representante máximo alguém que nem tem filhos no ensino público, mas depois tem paradigmas para distribuir sempre que lhe colocam uma câmara ou microfone à frente?
http://www.educar.wordpress.com/2010/03/04/todos-temos-culpa-quando-fingimos-para-sobreviver/
Maio 17, 2010 at 6:28 pm
Indisciplina – Participar: a) se der origem a processo, implica complicações, geralmente.
b)se não der fica-se com cara de parvo e mais desautorizado.
Daqui a ir-se consentido cada vez mais anormaidades como coisas vulgares é só uma questão de tempo.
Modalidade de escape – Já nem é mandar o aluno para a sala de estudo com um funcionário (pois o funcionário demora, o aluno reage, é necessário preparar corrigeir a tarefa, e o colega que está lá nas suas horas gratuítas(trab escola), reclama …. já só mando mesmo os alunos apanharem ar…. e voltar para a sala.
AS AULAS DE SUBSTITUIÇÂO – são tb culpadas, por degradarem a imagem do prof. quer na aula quer depois nas suas próprias aulas ….
Fevereiro 25, 2011 at 3:52 pm
acho que estam muito bem apresentados adorei a serio acreditem foi mesmo bom para o que eu estava á procura muito obrrigada fico muito grata
Novembro 30, 2017 at 1:49 pm
A violência nas escolas tem se mostrado cada vez mais presente no ambiente escolar, e devemos reconhecê-la até mesmo como conseqüência do momento histórico vivido pela sociedade. Partimos, porém, do pressuposto de que uma educação voltada para os princípios de diálogo e conscientização para a cidadania é de extrema importância para que haja mudança de comportamento por parte dos que praticam violência contra ou dentro da escola. Nesse sentido, após ampla pesquisa bibliográfica, buscamos identificar na realidade escolar o envolvimento dos alunos com a escola e relacioná-lo com a prática de atitudes violentas em seus limites.
ALFREDO A. COSTA
Novembro 30, 2017 at 1:54 pm
A violência protagonizada pelos jovens nas escolas é uma realidade inegável. A sociedade terá que se organizar e insurgir-se activamente contra este fenómeno. De igual modo, a escola terá que ajustar os seus conteúdos programáticos e acercar-se mais às crianças. Devido às exigências, as famílias muitas vezes destituem-se da sua função educativa, delegando-a à escola. No meio de toda esta confusão, estão as crianças, que, actuam conforme aquilo que observam e agem consoante os estímulos do meio. Meio esse
que por vezes oferece modelos de conduta e referências positivas questionáveis.
JOÃO V. ARAÚJO