Da mais recente entrevista da Ministra da Educação, acerca da gestão das escolas e da sua “abertura à comunidade”, chavão já com buço e barba penugenta:
De que forma é que o papel dessa comunidade pode ser mais activo nas escolas?
Isso pode passar por alterações ao nível das assembleias de representantes, no sentido de que a participação seja efectiva e consequente. Vamos levar a escola a abrir à comunidade, para não ficar exclusivamente entregue ao grupo de professores que estão lá.
Maria de Lurdes Rodrigues até pode discordar do modelo de gestão das Escolas, até pode nem gostar dos docentes do ensino não-superior como modo de vida, o que convinha era que não se esquecesse de dois ou três detalhes:
- Actualmente, no órgão fiscalizador e teoricamente supremo para a condução dos assuntos – a Assembleia de Escola – já devem estar representados elementos para além dos «professores que lá estão». Se não estão, não aparecem ou não exercem as suas funções – como é caso habitual dos representantes das autarquias, mais interessados em apoiar as escolas com gestão amiga – a culpa não é dos «professores que lá estão».
- Os Conselhos Municipais de Educação que existem no papel não funcionam ou funcionam de forma correcta excepcionalmente em alguns concelhos. A legislação sobre o seu funcionamento, assim como quanto às Cartas Educativas é letra morta em grande parte das autarquias. Se não se interessam sequer por proceder a uma Carta Educativa em condições, que interesse real terão em colaborar de forma responsável na gestão dos estabelecimentos educativos?
Na Lei de Bases do Sistema Educativo (versão consolidada de 30 de agosto de 2005, já da vigência deste Governo), afirma-se no seu artigo 48º o seguinte:
1 – O funcionamento dos estabelecimentos de educação e ensino, nos diferentes níveis, orienta-se por uma perspectiva de integração comunitária, sendo, nesse sentido, favorecida a fixação local dos respectivos docentes.
2 – Em cada estabelecimento ou grupo de estabelecimentos de educação e ensino a administração e gestão orientam-se por princípios de democraticidade e de participação de todos os implicados no processo educativo, tendo em atenção as características específicas de cada nível de educação e ensino.
3 – Na administração e gestão dos estabelecimentos de educação e ensino devem prevalecer critérios de natureza pedagógica e científica sobre critérios de natureza administrativa.
4 – A direcção de cada estabelecimento ou grupo de estabelecimentos dos ensinos básico e secundário é assegurada por órgãos próprios, para os quais são democraticamente eleitos os representantes de professores, alunos e pessoal não docente, e apoiada por órgãos consultivos e por serviços especializados, num e noutro caso segundo modalidades a regulamentar para cada nível de ensino.
Conviria, portanto, que MLR procurasse que as medidas que parece ter na manga respeitassem, mesmo que de forma vaga, a letra e o espírito da LBSE. Não é uma questão de inércia ou resistência dos docentes, é apenas uma questão de ordem jurídica. E já que o seu secretário de Estado mais de serviço no momento está sempre a invocá-la, seria bom que a respeitassem. Se não for muito o incómodo…
Por fim, seria agradável, mas aparentemente uma esperança utópica, que MLR sempre que se refere aos docentes enquanto grupo profissional, não transpirasse uma atitude de evidente animosidade quando não mesmo de ostensiva repulsa. Os docentes são para ela sempre os “outros”, os “que lá estão”, não se percebendo se preferia que fossem todos pessoas diferentes, acríticas e submissas, mero barro moldável para as geniais ideias de quem manda nas medidas do ME, seja quem essa pessoa ou grupo de pessoas for exactamente.
Fevereiro 26, 2007 at 12:42 pm
Não somos classe forte, que ela tema, logo (parece que é assim) nos respeite. Os sindicatos, não nos defendem, defendem-se. Precisamos algo mais, mais forte.
Fevereiro 26, 2007 at 1:50 pm
E que tal uma ordem?
Contudo, qualquer conjunto de pessoas que não lutem no mesmo sentido não faz qualquer efeito…
Tem que ser “algo mais, mais forte”… Mas o quê?
Fevereiro 26, 2007 at 2:59 pm
Mas a Lei de Bases não está para ser alterada, na sequência do Debate Nacional que houve coordenado pelo Joaquim Azevedo? De resto pelo que ouvi deste autor, Portugal é o unico pais com conselhos executivos eleitos, essencialmente, pelos que trabalham na escola.
Não acredito nas alterações que esta equipa ministerial possa vir a fazer ao modelo de gestão das escolas, não têm competência técnica para tal, o que têm alterado é para pior.
Fevereiro 26, 2007 at 3:01 pm
Já viram o caos que seria se as escolas, de repente, fossem entregues esclusivamente aos professores que lá estão?
Imagem só uma instituição enhtregue exclusivamente a quem sabe eestá preparado para a gerir. Era, de facto, um desastre.
Felizmente que temos a nossa Milú para precaver desastres dessa envergadura.
Trata-se, no fundo, de repetir a mesma estratégia em implementação no ME: arranjam-se umas pessoas desqualificadas para os lugares, de forma a não entregar a gestão da coisa só a pessoas competentes.
Muito tenho aprendido com o neo-leberalismo…. só tenho uma questão: não é suposto o neo-liberalismo dar dinheiro?
Fevereiro 26, 2007 at 3:23 pm
É , Sizandro,por isso querem implementar todas estas medidas nas escolas, com os menores custos possíveis.O objectivo final é darem dinheiro, tal como hospitais e outros serviços públicos afins.
Hoje dei umas aulas miseráveis à custa de todas estas medidas que me têm dado cabo do juízo, pela hipocrisia da coisa. Sei que sou 1 pouco ansiosa, mas custa-me ver, ao olhar para a maioria dos meus colegas, um total desconhecimento do que se passa à sua volta. E custa-me ouvir dizer: não protestes. Estamos muito bem. Olha só a quantidade de fábricas a fechar e a fome que há no mundo. Não há pachorra para argumentos destes.Uma vez tive de perguntar se lá em casa a pessoa em causa não dava comida aos filhos a pensar na fome que há no mundo, ou se estava disposta a fazer outras funções diferentes na escola pelo simples facto de o desemprego ser cada vez maior.
Devo ser muito egoísta mesmo.
Contrariamente ao que é costume, os elementos do CE andam com um sorriso de orelha a orelha….
Fevereiro 26, 2007 at 6:39 pm
Hoje, uma colega dizia para a outra: ” … é que já nem tenho tempo para nada! Nem para a família … e os impostos? É até Março, não é? Nem para isso tive tempo”.
Ouvi e zarpei … não sabia se havia de rir ou … [não me lembro da alternativa].
Se as Escolas forem entregues aos Professores que actualmente detém o “poder” a coisa não vai correr nada bem, inicialmente. Depois, tenho a certeza que tudo iria melhorar. Desde que, obviamente, a coisa fosse democrática.
Fevereiro 26, 2007 at 6:54 pm
E quando as Cartas Educativas (conheço duas) estão feitas em condições e aprovadas, o ME (que as aprovou e “protocolou” publicamente) desrespeita-as na primeira oportunidade que lhe surge, desistindo da construção de novas escolas previstas e impondo a criação de agrupamentos verticais a partir do secundário. Apenas na parte do fecho, fecho e fecho de escolas é que as Câmaras conseguiram acertar.
Fevereiro 26, 2007 at 10:54 pm
Ó Sizandro. O neoliberalismo dá dinheiro mas é só para alguns. Mas há nuances. Olhe o caso da comunicação social que é um sector, em geral, deficitário: porque é que os neoliberais invstem e perdem dinheiro neles? Olhe o “Publico” do Belmiro: dá prejuíjo há muitos anos. Porque é que se mantém?
Fevereiro 26, 2007 at 10:59 pm
Por falar em dinheiro. Fui hoje saber porque, apesar de ser aumentado, ganhei menos este mês. Então não é que fiquei a saber que subi no IRS e desconto mais. Devo ser um otário de primeira. Nunca pensei na minha vida, ser aumentado e ficar a ganhar menos.´Já so falta levarem-me as cuecas.
Fevereiro 26, 2007 at 11:03 pm
Aumentado?
Como, quando, onde?
Não dei por nada…
😉
Fevereiro 27, 2007 at 12:07 am
Não deixa de ser significativo que a ministra, passado tanto tempo, prossiga numa linguagem assumidamente afrontosa para com os principais funcionários do seu ministério. Dir-se-ía que não se sente bem na pele do personagem que interpreta, isto é, representante nacional do sector da educação. Em situação normal, já um colega do governo a teria aconselhado a corrigir a linguagem. Imagine-se um ministro da defesa a desconsiderar os militares, meses a fio. Ou um ministro da justiça a incentivar permanentemente a intromissão de outros níveis de poder nos assuntos dos tribunais. Dir-se-á que não são coisas comparáveis, mas os princípios da boa administração são os mesmos.