Naquela eleição para o maior português de todos os tempos que a RTP andou a promover, passei bastante ao lado das polémicas irrelevantes sobre se o António devia ser ou não ser votado, pois desde sempre a Democracia se definiu como o regime onde todos devem ter direito ao seu lugarinho nas sondagens, eleições e concursos televisivos. Se a definição não é exactamente esta deveria ser.
Depois, por curiosidade lá fui ao site e resisti ao meu amigo que insistentemente me incentivou a votar no Buiça que para além de regicida era professor. Quando me decidi a votar a hesitação foi bem curta pois o meu critério para este tipo de questão e efeito é muito simples: quem é que foi essencial para que estivessemos aqui num país chamado Portugal, com todas as suas grandezas e misérias? quem é que, se não tivesse existido ou agido como agiu, certamente teria impossibilitado que os portugueses, enquanto tal, andassem por aí? Não digo como andam, mais ricos ou mais pobres, mais cultos ou mais rudes, mais fatalistas ou mais aventureiros; digo existirem, ponto final.
As opções, na minha opinião são bem escassas, resumindo-se a apenas dois indivíduos que foram essenciais para que Portugal existisse e, depois disso, que continuasse a existir: Afonso Henriques e D. João I, já que o D. João IV foi apenas o cabecilha de uma revolta fidalga e se não tivesse sido ele tinha sido outro como ele. Já os outros dois, provavelmente não poderiam ter sido outros a fazer o seu papel. E no caso de Afonso Henriques certamente que não.
Por isso, e pela falta imensa de documentação sobre a sua longa vida (mesmo pelos nosso padrões, pois viveu até bem entrados os 70 anos), tenho uma enorme curiosidade em saber mais sobre ele, porque pouco fui aprendendo ao longo dos anos, mesmo sendo de formação académica em História. Sou 110% a favor de o exumarem e examinarem o mais pequeno ossinho para sabermos tudo o que seja possível sobre ele.
O cruzamento entre o mito e o homem é extremamente fascinante no seu caso, em especial porque considero que ele foi um herói na verdadeira e clássica acepção do termo, mas ao mesmo tempo extremamente humano quando foi necessário ser pragmático para sobreviver e manter vivo o seu projecto que acabou por ser Portugal.
Há alguns anos li a biografia elaborada por Freitas do Amaral como compêndio e síntese dos conhecimentos existentes. Agora chegou-me a nova publicada pelo Círculo de Leitores, assumidamente mais ensaística e erudita, de José Mattoso. O tema é tão interessante para mim que consegui ultrapassar, sem me desencorajar, a introdução demasiado embrenhada em interrogações, dúvidas, mas ao mesmo tempo em indisfarçável sentimento de superioridade metodológica e conceptual.
Afonso Henriques é uma figura mítica, já sabemos. Foi construída e reconstruída ideologicamente em diferentes épocas. Mas, por muito poucos documentos coevos que restem, por muito difícil que seja a reconstituição de todos os seus exactos passos (onde nasceu exactamente e como, que participação teve verdadeiramente neste ou naquele acontecimento histórico), a verdade é que ele foi responsável pela criação do país-nação que hoje é nosso(a) e esse foi um projecto em que gastou mais de meio século entre a revolta ganha em São Mamede e o reconhecimento internacional definitivo da sua “obra” pelo Papa Alexandre III.
Novembro 25, 2006 at 1:36 am
Ainda não li o JM, mas quando na altura li a biografia feita por Freitas do Amaral, apreciei muito e fiquei com um enorme respeito pelo autor.
Não só pela consciência assumida de não ser obra de especialista [se calhar por isso não é citado AGORA 😉 ] mas pela honestidade intelectual de citar todas as fontes, esmiuçando as divergências de interpretação e as razões de ter uma opinião diferente deste ou daquele. Foi uma leitura instrutiva e muito agradável, embora não sendo a minha área de formação.
Novembro 25, 2006 at 1:57 pm
Que será feito dos seus genes?!
Escreve-se, demagogicamente, que a educação deve prosseguir os mesmos valores pelos quais de debateu o Fundador – autonomia e independência -, mas, no fundo, o que se pretende é perpetuar a “carneirada”… Pudera, é muito mais fácil manipular o “rebanho”!