Alguns comentadores insistem em estabelecer paralelos e comparações entre a situação da Educação em Portugal e em países do Norte da Europa, com destaque para a Escandinávia.
Eu acho isso tudo muito giro mas, desculpem-me lá, não acham que isso é tão interessante e esclarecedor como comparar o Lesotho com a Suiça?
Não misturemos realidades com contextos e antecedentes completamente diferentes. Os países escandinavos não têm taxas de analfabetismo e iliteracia como as nossas desde a primeira metade do século XIX. O que lá hoje existe baseia-se em 120-150 anos de alfabetização consolidada graças a uma sociedade civil forte e a uma adesão das populações à leitura e escrita que não tem comparação com o que se foi passando em Portugal na época contemporânea. Eles (Dinamarca, Finlândia, Noruega, Suécia) estão com taxas de literacia em cima dos 100% no 1º lugar dos rankings internacionais há muito tempo. Nós labutamos um bocado acima de meio da tabela, atrás do Brunei, da Bósnia e da Colômbia.
Numas folhas publicadas durante a Primeira República sobre a situação do analfabetismo em Portugal, comparando-o com o resto da Europa e do Mundo, já era possível verificar que entre 1880 e 1890 a Finlândia atingira uma alfabetização de 80% de toda a população, enquanto nós a custo passávamos os 20%.
Tudo isto tem raízes históricas e tudo tem o seu percurso, feito com o seu ritmo próprio, sendo que em Portugal nenhuma fórmula alguma vez conseguiu provocar o “salto” desejado. Não é razão para desistirmos, mas neste caso, as acelerações da História (à moda trotsquista na sua História da Revolução Soviética) e o “truque” de queimar etapas na evolução da sociedade não se tem revelado viável entre nós e a última que aconteceu, íamos em meados dos anos 70, não me parece ter sido do agrado geral, e adivinho mesmo que não do agrado particular de quem estabelece este tipo de comparações e apela à necessidade de fazermos como os escandinavos. Para isso é preciso tempo, uma ética de responsabilização individual completamente diversa da nossa e uma vivência cívica que duvido que alguma vez venhamos a atingir.
Não vamos tentar que o nosso carro de gama média vá competir com o último modelo da Volvo. Simplesmente não é possível. Podemos fazer-lhe uns acertos, um tunnig manhoso, mas faltará sempre o resto.
Leituras agradáveis sobre este tema (entre outras, claro):
Gugliemo Cavallo e Roger Chartier (1997, 2001), Histoire de la lecture dans le monde occidental. Paris: Ed. de Seuil.
David Landes (2001), A Riqueza e a Pobreza das Nações. Lisboa: Gradiva.
David Vincent (2000). The Rise of Mass Literacy: Reading and Writing in Europe. Cambridge: Polity
Novembro 14, 2006 at 11:35 am
As comparações são sempre importantes. Há em Portugal uma tendência para nos analisarmos em circuito fechado. É a velha história de todos acharmos que ganhamos mal, sem que se comparem os salários quando pesados com o PIB.
Analisar as melhores práticas noutros Países é saudável e recomendável. Já diziam os Monty: “adopt, adapt and improve”. Eu não aceito as teorias fatalistas de que não vale a pena olhar lá para fora, vendo o que os outros fazem bem, porque nós aqui estamos e estaremos demasiado viciados nos nossos círculos viciosos… Essa mentalidade é ela própria um círculo vicioso. O nosso problema não é por certo genético, porque lá fora trabalhamos bem. Mesmo cá dentro somos bestiais a trabalhar em Multinacionais, como a minha que só este ano exportou 50 milhões de EUR em “massa cinzenta”..
O problema de fundo é que passámos do estado novo, com a sua lógica dos “pobrezinhos e ignorantes, mas honrados e controlados”, para uma lógica pós 25 de Abril de “previlégios para todos em igual medida e depois logo se vê quem paga a factura”. Ouve uma “espécie de direito ao enriquecimento por decreto”, como se se tivesse descoberto uma nova árvore das patacas aqui à beira Mar. Repare-se que o modelo social que montámos em 70 e 80 já estava nessa altura a ser reformulado nos Países que nos serviram de modelo. E só agora o estamos a tentar mudar, porque entretanto está a falir. Nós acreditámos alegremente que com democracia e CEE já seriamos automaticamente ricos (achamos que somos ricos quase por direito histórico). E agora ficamos muito ofendidos por nos imporem limites de déficit, como se os outros Paises tivessem a obrigação de o sustentar. E enfatizo este ponto que é puramente económico: é preciso que toda a gente perceba que a agradável moeda única que até me faz sentir muito do primeiro Mundo quando aterro em Helsinquia, só é possível se cumprirmos estas regras. Ou alguém preferia estar fora da moeda única e ver a inflação a galopar a cada ano em que o déficit subisse? Acabavam-se as viagesn baratas a Cuba, o crédito barato, as compras na Amazon… Talvez fosse remédio Santo e nos obrigasse a pensar a sério na nossa vidinha. Com os Argentinos essa terapia de choque está a resultar…
ManyFaces
Novembro 14, 2006 at 12:10 pm
Ora bem, lá temos um mosaico de opiniões suas, com que por vezes sim, por vezes não.
Verificar o nosso contexto e as nossas capacidades não é fatalismo, é realismo.
É óbvio que o modelo social “europeu” já estava a romper pelas costuras em alguns países quando cá deu os primeiros passos a sério.Isso é razão para não tentarmos dar uma nível mínimo de protecção social às pessoas? Não me parece.
Por outro lado, eu não tenho nada contra um défice europeu. Tenho é contra a desresponsabilização de quem durante 20 anos geriu a “casa” e esbanjou o que não devia.
Porque a verdade é que, como nas técnicas de downsizing empresarias, quem se lixa com os erros de gestão é a arraia-miúda.
Dou-lhe os parabéns pelo seu sucesso como empresário. O problema é que, apesar do título deste blog, não podemos imaginar o mundo à imagem do nosso umbigo e sentirmos que o nosso sucesso é exportável para todas as realidades e situações.
A moeda única e as visitas à Escandinávia são muito cosmoplitas e tal. Mas se calhar seria interessante ver até que ponto o nosso tecido social e empresarial se rompe ao primeiro encontrão e como aquilo a que chama “fatalismo” mais não passa do que um modo de estar português que só reage à autoridade quando ela é imposta “de fora” ou por quem consideramos deter algum crédito nessa matéria.
O que não é o caso da nossa classe política, em especial por muitos daqueles que há meia dúzia de anos aceitaram acriticamente o pântano.
Em Portugal, salvo certas “bolsas” de competitividade e inovação, a mentalidade que persiste – entre patrões e empregados – é o chico-espertismo e o pato-bravismo. Quem está por cima acha-se o maior e quem está por baixo acha que isso justifica o incumprimento dos seus deveres.
Eu nunca achei que devia fazer menos ou mais do que faço como docente, desde os tempos de contratado. Se escolhi uma certa função é para desempenhá-la como considero correcto. Não posso é aceitar que me venham dar lições de “moral” ou de “economia”, quando sabemos muito bem que não são os professores os culpados da crise, nacional em geral, ou educativa em particular.
Noa dia em que a responsabilidade for assumida por quem de direito e quando quem fez asneira com os dinheiros públicos deixar de ter retiros dourados nos grandes grupos empresariais que tutelou, então sim eu acredito que podemos competir com os escandinavos.
Antes disso, não me gozem (sem desprimor para o comentador acima).
Novembro 14, 2006 at 12:48 pm
“Verificar o nosso contexto e as nossas capacidades não é fatalismo, é realismo.”
É realismo se dissermos que não é possível mudar do dia para noite. É fatalismo se acreditarmos que nunca poderemos verdadeiramente mudar.
“Porque a verdade é que, como nas técnicas de downsizing empresarias, quem se lixa com os erros de gestão é a arraia-miúda.”
Nas más empresa sim. Nas boas não. Nestas há muita arraia-grauda que também é posta a andar quando as coisas são mal geridas.
“Dou-lhe os parabéns pelo seu sucesso como empresário. O problema é que, apesar do título deste blog, não podemos imaginar o mundo à imagem do nosso umbigo e sentirmos que o nosso sucesso é exportável para todas as realidades e situações”
Não sou empresário (por enquanto). Sou engenheiro e gestor de I&D. Quanto a “exportar” A BO práticas, tenho essa ilusão admito. Talvez por ter conseguido fazer isso nos últimos tempos. Se calhar sou mais utópico do que poderia supor-se pelo meu discurso. Talvez a diferença é que as minhas utopias não passam pelos “igualitarismos fundamentalistas” que nos fizeram chegar aqui mas pela “meritocracia responsável” que nos pode fazer sair daqui.
.”..e como aquilo a que chama “fatalismo” mais não passa do que um modo de estar português que só reage à autoridade quando ela é imposta “de fora” ou por quem consideramos deter algum crédito nessa matéria.”
Esta visão é em si fatalista porque não deixa grande espaço à mudança. Talvez seja ela que leva tanta gente a querer a Ibéria, de acordo com as últimas sondagens. Quando desistirmos de nos governar desistimos de existir como povo.
“Não posso é aceitar que me venham dar lições de “moral” ou de “economia”, quando sabemos muito bem que não são os professores os culpados da crise, nacional em geral, ou educativa em particular.”
Somos todos, somos todos… Acontece que este é um blog sobre educação e sobre Professores.
Sem gozos… No dia em que eu gozar gratuitamente com os Professores também estarei a gozar comigo, porque já fui Prof e quem foi Prof é sempre Prof. Sinto as dores e os dilemas como se ainda o fosse.
Novembro 14, 2006 at 2:05 pm
ManyFaces
É muito curioso como simpatizo com este pseudónimo. Não fosse a minha aversão a responsabilidades – apenas – parcialmente assumidas, e creio que o escolhería.
Agora a sério:
Um Gestor de Investigação e Desenvolvimento reconhece como suficientemente qualificadas – para caracterização de situações – expressóes como igualitarismos fundamentalistas e meritocracia responsável? Estava mais habituado a vê-las noutros lados, onde a estigmatização é considerada uma forma válida de argumentação.
Novembro 14, 2006 at 3:06 pm
Pode definir-se, pode definir-se…. A economia das aspas pode ser sempre usada contra mim. Só uma breve achega:
O igualitarismo fundamentalista promove como valor primário a igualdade absoluta entre todos. Parece conceito interessante mas esconde um fundamentalismo inaceitável: as pessoas não são iguais, não têm a mesma competência, a mesma vontade, o mesmo mérito. Assim sendo a “igualdade” que importa promover é a das oportunidades (e aqui a escola tem papel decisivo), não a das condições oferecidas a todos, sejam salariais ou de promoção. As carreiras horizontais são um exemplo deste tal igualitarismo fundamentalista. Desprezam a diferença, nivelam por baixo, rejeitam o conceito de mérito relativo, não promovem a competição.
A meritocracia responsável responde a isto de uma forma responsável: o mérito relativo promove uma diferenciação a todos os níveis com base no mérito, mas é possível assegurar uma protecção social (responsável) para aqueles que dela precisem: no desemprego, na doença, na velhice. Quem defende este conceito não se incomoda com impostos elevados mas exige que estes sejam bem geridos. Acredita que as empresa criam emprego e riqueza e que o estado trata das funções de soberania e do bem comum (protecção social). É a minha definição de liberalismo (moderno), que defendo.
Novembro 14, 2006 at 3:41 pm
Assim, sem aspas, está muito melhor. Para que o mérito seja reconhecido, haverá mecanismos de apuramento que devem ser instalados. Objectivos de grupo e estritamente pessoais a atingir em períodos de avaliação pré-estabelecidos. No caso dos professores, por exemplo, em se tratando de uma escola difícil, ou de um grupo de alunos com problemas especiais, os objectivos para os respectivos dos professores teríam que reflectir essa situação. Os professores avaliados contribuiríam para a definição desses objectivos, como se faz noutros lados. Muito trabalho a fazer, para o qual o Ministério da Educação tem perdido tempo ano após ano, embora os seus funcionários recebam o vencimento atempadamente. A isso eu chamo incompetência como mínimo, podendo também configurar desleixo, irresponsabilidade ou simples defraudamento das espectativas dos cidadãos enquanto eleitores e contribuintes.
Agora veja caro amigo liberal no sentido moderno: muito do confronto levantado com os professores nasce, na minha opinião, como uma tentativa de desreponsabilização do ME face a atribuições que lhe estão estritamente acometidas, e que já começam a ser identificadas fora do sistema educativo. E não precisei de usar abstracções nem etiquetas.
Novembro 14, 2006 at 3:59 pm
O ME foi historicamente irresponsável em inumeras ocasiões passadas. Actualmente e no contexto da revisão do estatuto não me parece uma crítica razoável: pretendem impôr uma carreira vertical, com concurso para progressão na carreira. Não chega para implementar sistema meritocrático, mas é a condição necessária para se começar a fazer alguma coisa.
PS: As etiquetas são úteis desde que sejam definidas (quando não o faço já percebi que o tenho aqui à minha perna :-). Já defini “liberal moderno” por aqui um dia destes.
Novembro 14, 2006 at 4:45 pm
Esclarecimento rápido, graças a intervalo no horário lectivo: Não acho que é impossível mudar, apenas acho que não é possível evoluir a um ritmo acelerado com os meios que temos.
Só há duas formas de mudar: evoluir de forma realista ou por “choques”. Se considerasmos que os “choques” socráticos são meramente retóricos – e nisso estaremos em grande parte de acordo – o que resta são soluções autoritárias.
Por feitio, não gosto delas.
😉
Janeiro 7, 2007 at 3:19 pm
nao teño muy ideas para perguntar algo..
ayo este site muy interssante i inportañte
teño un trabajo para fazer sobre este assunto, e esta pajina na net ajudou-me muy… 😀
espejo que teño gustado di mi comentário… 😛
muy bejos para todos 😉
(K)***