Porque precisará um professor de ser incentivado para trabalhar, pergunta um comentador.
Já lhe respondi que acho que todo o trabalhador deve ser incentivado – nem que seja por palavras de algum apreço – para desempenhar melhor a sua função por parte de quem é o seu superior hierárquico, em especial se for o responsável mais alto pela sua actividade, seja patrão ou tutela (a diferença não é muita, nos tempos que passam).
Mas posso dar uma achega daquelas pouco profundas de teorização e simplesmente decorrentes do quotidiano de todos nós. Enquanto os médicos não levam os doentes para casa, ou arquitectos e advogados por regra se fazem pagar pelas horas que gastam a tratar dos assuntos dos seus clientes, ou um qualquer funcionário da máquina fisacal ou judicial do Estado não leva os processos para casa (acho mesmo que é ilegal), os professores vêm quase sempre carregadinhos de oferendas para se ocuparem nos tempos livres em casa, tipo palavras cruzadas.
Grande parte deste Domingo foi passada a ver fichas de trabalho dos alunos, a preparar materiais de avaliação novinhos em folha já com uns pózinhos da TLEBS (as “novas” frases de tipo “persuasivo” fizeram a sua entrada em cena), assim como – devido à greve de funcionários nos final da semana passada – a impressão da primeira turma de amanhã teve de ser feita à custa dos tinteiros domésticos.
São coisas comezinhas, corriqueiras, sem aparente relevância para quem olha de fora e diz bahhhh…, mas eu gostaria de os ver aqui, já lá se cantava numa cantiga dos meus tempos de juventude.
Novembro 13, 2006 at 12:22 am
A pergunta é uma armadilha. Embora o incentivo seja hoje reconhecido como um factor não menosprezável na produtividade das equipas, no caso ME ãté já não sería nada mau que: se abstivesse de aviltar o trabalho dos professores; se abstivesse de promover continuamente a subversão da difícil disciplina nas escolas; se abstivesse de fomentar a chicana pública do trabalho aí realizado; se abstivesse de tentar esgotar os professores com sobrecargas horárias; enfim que os deixasse trabalhar em paz.
Novembro 13, 2006 at 10:01 am
Perguntava ao António Ferrão em que medida o Ministério da Educação promove “continuamente a subversão da difícil disciplina nas escolas”.
Novembro 13, 2006 at 10:25 am
Caro PJ, eu espero mais logo continuar a explicar-lhe como isso foi acontecendo e, apesar das melhorias na legislação aplicável, ainda acontece.
Novembro 13, 2006 at 1:23 pm
PJ:
Convido-o a tentar reconhecer neste artigo do Público> uma parte da realidade em Portugal, e as possíveis consequências de colocar pais a avaliar professores.
Novembro 13, 2006 at 4:25 pm
Bem, bem, este post é no mínimo um bocado polémico. Então nas outras profissões não há trabalho para casa? Eu refuto: Em muitas outras profissões o trabalho é mesmo para fazer. Se tiver de ser em casa, azar, ou desorganização…
Neste Pais trabalham-se 40 horas por semana. Se os Profs não têm 40 horas lectivas é expectável que o diferencial seja utilizado nas obrigações extra-aula (preparação e avaliação)…
Se assim não for por favor indiquem-me onde falha a minha argumentação.
Novembro 13, 2006 at 4:51 pm
No facto de as 40 horas, por exemplo, não serem o horário do resto da Função Pública. São 35.
😉
E de gostar de saber se acha que corrigir 100 fichas de avaliação cabe na meia dúzia de horas semanais de diferencial em relação ao tempo que passo na Escola.
Fora o resto.
Novembro 13, 2006 at 5:22 pm
Eu já conhecia o artigo do Público. A questão que coloquei dizia respeito à forma como o Ministério da Educação estaria a subverter a disciplina nas escolas. Se estava a pensar na avaliação dos professores pelos encarregados de educação essa questão encontra-se resolvida, uma vez que essa apreciação só contará para a avaliação de desempenho se o professor expressamente o autorizar, segundo declarações de responsáveis políticos pela negociação do ECD. Pessoalmente discordo da avaliação dos professores realizada por pais e encarregados de educação pelas possíveis perversões que pode gerar. Mas já concordo em absoluto com a avaliação do funcionamento das escolas pelos pais.
Apesar de não apoiar a avaliação dos professores pelos pais reconheço que nalguns casos ela poderia ser muito positiva. Vários exemplos: os meus filhos frequentam uma escola pública com ensino pré-escolar e 1º ciclo. A educadora de infância do meu filho mais novo fez no ano passado um trabalho excepcional com a sua turma, trabalho este que foi elogiado por todos os pais. Este ano, no 1º ano de escolaridade, a sua professora meteu baixa por um mês ao fim de algumas semanas de aulas. Num recado que me enviou através da caderneta do aluno deu dois erros ortográficos…
Nesta mesma escola uma das professoras de uma turma do 4º ano de escolaridade tem por hábito bater nos alunos. Uma das mães de um aluno que sofreu um castigo físico dirigiu-se à professora para lhe pedir explicações para o sucedido e só recebeu explicações histriónicas. O aluno em causa passou da primeira fila para a última e os seus trabalhos escolares deixaram de ser corrigidos durante duas semanas. Esta mesma professora impediu que fossem colocados dois computadores na sua sala de aula, equipamento que foi disponibilizado pela associação de pais, argumentando que não precisava de computadores para nada apesar de possuir conhecimentos de informática na óptica do utlizador. No decurso da elaboração do plano de actividades para o presente ano lectivo avisou as colegas que não estava disponível para participar em nenhuma actividade, argumentando que este era o seu último ano lectivo antes da reforma.
Acham que é necessário uma sofisticação especial para avaliar estes exemplos reais de professores que descrevi?
Já adivinho a argumentação de alguns: em todas as áreas existem maus profissionais. Claro que existem. A grande questão é saber como é que nos livramos desta “gente” que contamina toda uma classe profissional e envergonha a função pública. Qualquer que seja a nossa posição sobre a carreira docente ou qualquer outra carreira da administração pública, seguramente concordaremos que uma avaliação de desempenho, por muito difícil que seja, tem que premiar os bons profissionais, punir os maus e expulsar os péssimos.
Novembro 13, 2006 at 5:26 pm
“No facto de as 40 horas, por exemplo, não serem o horário do resto da Função Pública. São 35.”
OK. Então proponho que a reforma comece por aí. Com 11 horas semanais de diferencial talvez já não fosse necessário trabalhar em casa.
PS: É curioso notar esta diferença entre as 40 horas e as 35, por que este facto nem sequer é tido em conta quando se comparam salários de privado versus público (como se sabe em Portugal o público não ganha nada mal comparado com o privado).
Sempre seriam 15% de salários que o Ministro pode cortar caso os sindicatos não queiram passar para as 40 horas. Bem, é melhor nem divulgar muito esta ideia “herética” ou ainda sou colocado no “index” 🙂
ManyFaces
Novembro 13, 2006 at 5:35 pm
Avaliação pelo Pais. Com certeza, desde que seja devidamente ponderada (não pode ser a única nem a principal fonte de avaliação). Quem são os clientes do sistema de ensino? Os alunos. Quem paga o sistema. Os Pais (com ou sem filhos). Ou seja os Pais têm todo o direito de contribuirem para a avaliação do sistema porque o suportam e porque sendo Pais são naturalmente parte interessada.
PS: Conversa de cantina ontem com colega Dinamarquês: “há duas coisas que me espantam nas vossa escolas; 1) os professores não serem avaliados pelos Pais 2) os professores não serem contratados directamente pelas escolas.
E eu acrescento: o que me surpreende é estas coisas por aqui ainda serem “discutíveis”.
Desculpem lá mais um exemplo Nórdico, mas como trabalho com eles…
ManyFaces
Novembro 13, 2006 at 6:06 pm
Many Faces:
Não possuo dados sobre a diferença de salários entre o sector público e privado em Portugal. Mas sugiro-lhe que leia a entrada publicada no Abrupto (http://abrupto.blogspot.com/)pelo leitor Daniel de Sousa no dia 11.
Novembro 13, 2006 at 6:29 pm
Como eu gostaria de ter alunos dinamarqueses e ser avaliados por Enc. Educação dinamarqueses.
E já agora, eu também pago o sistema de ensino.
Novembro 13, 2006 at 6:43 pm
Aqui vão dados de 2002, que julgo não se terem alterado significativamente:
“Em toda a Europa reina uma cultura de “premiar” os salários dos funcionários públicos em relação aos privados, mas Portugal é, também, o país da UE onde esse fosso é mais acentuado: a média dos salários públicos é 45 por cento superior ao privado, contra um diferencial de 27 por cento em Espanha, ou um prémio de “apenas” dez por cento, em França.”
Retirado de:
http://dossiers.publico.pt/shownews.asp?id=70244&idCanal=317
Novembro 13, 2006 at 6:47 pm
PJ
Permita-me partilhar os votos de sucesso escolar da sua filha. Permita-me também um ponto de vista alternativo, como hoje se diz: cabe ao ME inspeccionar o modo como os professores cumprem as suas obrigações. Esta função do ME andou adormecida durante muito tempo. É urgente revitalizá-la, precisamente para que as anormalidades não se arrastem, e que os professores com mérito sejam tratados como tal. A confusão com os pais surge como que um retrocesso neste processo, ou mesmo uma pura desistência, alijando para outros as obrigações próprias. Mas, quanto mais não seja, por não familiaridade com aspectos técnicos específicos da função de inspector, acho uma desgraça que esta função seja atribuída aos pais da forma como foi. Quanto ao recuo do Ministério nesta matéria, além de o (ME) felicitar, naturalmente, não posso esquecer-me que já custou duas jornas no orçamento da minha casa.
Manyfaces
OK, reconheço que cometi o mesmo pecado. Quando se comparam ambientes sociais tão díspares, a colagem parcial não será, talvez o melhor método. Com maior grau de envolvimento dos pais – pelo menos mais aparições nas reuniões de turmas – muitas coisas seríam possíveis. Com o nível deplorável de participação em que nos encontramos…
Novembro 13, 2006 at 6:50 pm
“E já agora, eu também pago o sistema de ensino.”
Certo. E por isso mesmo gostaria por certo de ter uma palavra no que toca à avaliação da escola dos seus filhos.
ManyFaces
Novembro 13, 2006 at 10:03 pm
Aqueles que falam aqui na questão das 40 horas ou das 35, por acaso sabem o que é leccionar uma aula? Querem comparações?
E a indisciplina nas escolas? Ninguém fala nela? Sabem o que é um professor estar sujeito a ela anos e anos a fio?
Teorias de “gabinete” não por favor!
Novembro 13, 2006 at 10:09 pm
Uma coisa que foi dita é verdadeira em relação à avaliação pelos pais: «estes são parte interessada». E como eu não acredito em “anjinhos”, também não acredito na honestidade “dos juizes em causa própria”!
Tudo balelas e teorias “burguesas” desta “pseudo-democracia”.
A REALIDADE OBJECTIVA É BEM DIFERENTE!
Estamos a subverter a razão!
Ainda hei-de ver os “filhos” a avaliarem os pais!
E muitos bem precisam.
Novembro 13, 2006 at 10:32 pm
Os filhos avaliam os Pais. Essa é que é …
Novembro 14, 2006 at 12:09 pm
O Ensino é uma parte da super-estrutura ideológica do Estado. Por muito estigmatizado que tenha sido o autor destas palavras, elas ficaram para durar. Quer queiramos, quer não, os professores são os principais veiculadores das virtudes do Estado enquanto construção social. Este papel tem o seu preço, pois ninguém é social por nascimento: o homem faz-se social, se a sociedade demonstrar energia suficiente. Claro que a Educação gera tensões de todo o género. Se os mais altos responsáveis do Estado desautorizam os profesores em frente à população, chamando-os faltosos, corporativistas, arreigados a privilégios, etc, enquanto acto do Estado, isto significa dar um tiro no pé. Quero aqui ressalvar a atitude do actual Presidente da República, que se tem resguardado dessa perigosa fronteira. Mais do que o triste episódio da avaliação dos professores pelos pais, algumas generalizações precipitadas manifestadas em público pelos responsáveis do Governo revelam uma leviandade inqualificável, que irá demorar até se desfazerem. E constituem sim um obstáculo ao exercício da autoridade dos profesores, infelizmente, até mesmo um obstáculo adicional para uma tarefa que já não estava carecida de mais.
Maio 12, 2014 at 11:06 pm
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Maio 12, 2014 at 11:11 pm
“ninguém é social por nascimento”
Bem, há aquela história de não terem sido os homens a domesticar os cães mas sim os cães a domesticarem os homens. Parece que a biologia tem um papelito qualquer a desempenhar nisso.