Há uma semanas não tive tempo e pachorra para escrever sobre mais uma série de vacuidades escritas por um notável articulista da nossa praça mediática, que da Educação não percebe a ponta de um corno bem curto, que criticava o fim dos Planos de Recuperação porque, em tempos de Sócrates-MR eles tinham tido um assinalável sucesso. E já nem me lembro de acrescentava alguma percentagem quanto aos alunos que tinham transitado, após lhes ter sido aplicado um tal plano ou o seu sobrinho, Plano de Acompanhamento.

Como hoje estou a engonhar outras escritas e tudo faço para fugir aos deveres, vou tentar ser claro nesta matéria: a maioria dos Planos de Recuperação eram uma treta, em que o aluno não estava em risco de reprovar o ano, sendo feitos como mera precaução justificativa perante os encarregados de educação por causa de uma negativa ou como táctica defensiva de alguns (bastantes) professores em relação a uma eventual crítica hierárquica. O que significa que uma quantidade muito razoável de planos (o MEC sabe, está na sua base de dados) resultava da necessidade de se registar a proposta de APA (Apoio Pedagógico Acrescido) para alunos com uma ou duas negativas, que não estavam em risco real de chumbo. E que por isso mesmo acabavam por transitar de ano e ter sucesso.

Um estudo a sério dos PR/PA deveria ter isto em consideração: quantos deles tinham na base situações de real risco de insucesso e quantos foram feitos na base do é melhor prevenir… ou ah, é melhor defender-me/nos ou outro pretexto legítimo, atendendo à pressão sobre os professores como causadores directos do insucesso, mas efectivamente vazio de grande substância?

O mesmo corre o risco de se passar com os actuais PAP(I), outra ficção burrocrática que o MEC legislou em nome do combate ao insucesso. Papelada (real ou virtual) usada para ocupar tempo e encenar combates ao insucesso e abandono. Tretas, no fundo.

O combate ao insucesso não se faz assim.

Faz-se a partir da base, de forma precoce (neste caso esquecem-se sempre os bons exemplos externos, pois são caros), despistando a razão das eventuais necessidades dos alunos, detectando as suas causas.

  • São de tipo cognitivo severo, que impedem a aquisição ou aplicação de determinados conhecimentos?
  • São meramente de ritmo ou estilo de aprendizagem?
  • São de carácter emocional, provocando comportamentos disruptivos e de indisciplina, prejudicando o desempenho?
  • São de carácter emocional, mas mais do ponto de vista da atitude de desinteresse perante as tarefas lectivas?

Cada uma destas situações implica uma forma de intervenção diferenciada, não existindo sequer uma solução absoluta para cada uma delas. Aponto só o que resulta da minha opinião pessoal.

  • A primeira exige pessoal especializado para o seu acompanhamento, que não pode estar dependente dos humores dos rácios de incidência de certas patologias.
  • A segunda e a quarta implicam um trabalho diferenciado na sala de aula, com eventual apoio fora dela em pequeno grupo não muito heterogéneo, mas que deve ser feito com o(s) professor(es) originais e não com alguém que tem horas para preencher no horário. E uma comunicação aberta e frequente com a família, sem preconceitos ou desconfianças.
  • A terceira aconselha uma tutoria e acompanhamento de tipo psicológico mais ou menos permanente, que não se resume a uma sessão semanal de conversa e observação do que se vai passando.

Claro que todas têm implícita uma colaboração parental activa e atenta.

Claro que todas implicam a existência de técnicos especializados nas escolas e agrupamentos com competência para fazer despistes, caracterizações e acompanhamentos.

Claro que isto implica que os professores tenham sempre no seu horário tempos previstos para estas actividades, numa escala flexível (por exemplo com as tutorias), em que o mais importante é intervir quando é preciso e não assinar o livro de ponto certo a horas.

Claro que para tudo isto bastaria existir um plano global das situações detectadas em cada turma e das medidas tomadas, só se justificando planos individuais nos casos em que o diagnóstico e as medidas a tomar são mais profundas, por estar efectivamente em risco o sucesso do aluno.

Interessa fazer e não parecer que faz ou registar que fez. Interessa resolver problemas e não encenar a resolução. Interessa, em especial, não criar artificialmente sugestões de insucesso para depois apresentar estatísticas excepcionais de objectivos alcançados.

Os Planos de Recuperação eram, em muitos casos, meras encenações para produzir sucesso, numa aliança pouco saudável entre demagogia ministerial e práticas profissionais defensivas.

Os PAP(I) irão pelo mesmo caminho?